Eren Yaeger
08:29h
Meus pés escorregaram sobre o barro lamacento que se misturava com o sangue e a chuva que caía de forma melancólica, demonstrando a decepção e tristeza de todos aqueles que se encontravam atirados no chão, esperando que seu Deus os salvasse do caos instaurado ali, o caos que eu mesmo instaurei.
Finalmente terminei de subir o pequeno morro de destroços e terra, percebendo a presença de uma mulher, que observava com trajes finos o fogo consumindo o campo de batalha abaixo.
Ao encarar a minha própria mão, notei um dispositivo similar a um walkie-talkie, que transmitia uma aura perigosa, como se o peso de inúmeras vidas tivesse naquele pedaço de metal e fios emaranhados.
Os tiros haviam se cessado, e os únicos vivos dali tentavam se manter conscientes estancando seu próprio sangue.
As armas, que antes tinham sido usadas para condenar as almas dos inimigos, iam embora junto da fumaça. A mesma que tinha sua vingança sendo levada pelo vento. O peso da nuvem de fumaça ultrapassava toneladas, levando os pecados, dores, amores e a culpa, a minha culpa.
—O que você...? — Resmunguei, sentindo todos meus músculos doerem a cada palavra dita.
—Me perdoe, Eren. Não tinha outra forma. — E então a tal figura se virou para mim, demonstrando ser um rosto o qual eu nunca havia visto na minha vida. Meu coração se disparou ao ver a mulher empunhar uma arma e apontar em minha direção.
O barulho interminante do alarme essoava pelo meu quarto, fazendo com que eu acordasse de meu péssimo pesadelo. Me sentei na cama imediatamente, retirando a coberta que cobria até meus ombros, a segurando com força. Que porra acabou de acontecer?
Tentei controlar a respiração, sentindo o suor descer pela minha testa. Meu corpo ainda estava tentando assimilar o que era real e o que não era.
— Esses casos criminais estão me afetando pra valer. — Sussurrei, levando as mãos à testa em seguida.
Esse seria apenas mais um pesadelo comum, se não fosse pelo fato de que era real demais, mais do que devia.
Mas era isso que os pesadelos eram, não é? Eles têm que ser extremamente reais para poder... é.
Puta merda, quem eu tô tentando enganar?
Enquanto me sentava na beirada da cama e a procurava meus chinelos, ouvi um barulho de passos desajeitados e preguiçosos, identificando imediatamente quem estava prestes a abrir a porta.
Dito e feito. A porta foi escancarada por um homem loiro alto com uma longa barba encaracolada e mal penteada. Zeke segurava uma caneca de ferro que estava BEM desgastada pelo tempo, diz ele que é pra dar sorte, quem sou eu para julgar?
— O pai mandou te chamar. Se eu fosse você iria bem rápido, ele tá explodindo de raiva. — O barbudo alertou enquanto levava a sua lata velha a boca, bebendo algo que eu deduzi ser café.
— A pergunta é: quando ele não tá explodindo de raiva? — Comentei rindo de nervoso, pegando meu roupão vermelho que estava pendurado no puxador do enorme guarda-roupa.
Era fato que meu quarto era realmente gigantesco, mas ao mesmo tempo em que ele era chique também era simples. Minimalista que fala, né? Apenas preto e branco, essas eram as únicas cores que eu precisava para a decoração e para a minha paz interior.
— Você tem um ponto. — Zeke disse enquanto fechava seu grande avental marrom - o que eu sinceramente acho extremamente brega e sem graça. - com uma de suas mãos, tampando seu tórax do vento frio que entrava pela janela aberta.
Fui até a abertura para a fechar arrastando os pés pesadamente, sentindo sono e ódio por acordar cedo em um SÁBADO.
— O que ele quer? — Me dirigi ao loiro enquanto terminava de ajeitar meu cabelo no espelho, o soltando e penteando suas pontas com os dedos.
— Sei lá, deve ser alguma coisa envolvendo o teu casamento. — Rangi os dentes ao ser relembrado desse trágico futuro.
— Ah cara, que merda. — Resmunguei com desgosto enquanto me arrastava até a porta, saindo dali com um rubor no rosto.
— O que? Não vai me dizer que você não quer casar com aquela deusa? — Zeke me perguntou indignado, tendo um aceno de cabeça preguiçoso como resposta. — Eren?! Você tá vendo a merda que você tá falando? Só de olhar para a Historiya dá pra perceber!
— Não é como se estivessemos em mil novecentos e bolinha e meu pai pudesse escolher com quem eu vou me casar. Sei lá, eu queria que fosse algo especial, não um casamento qualquer por poder e que eu nem posso me opor.
O portador de fios loiros olhou para mim com uma das sombrancelhas levantada, levantando sua mão livre e tombando seu punho para frente, fazendo com que eu quase dê de cara em uma parede que estava pelo caminho.
— O que? Não!
— Certeza? Absoluta? — O Yaeger mais velho indagou, cerrando os olhos. — Você sabe que eu te apoiaria...
— Zeke!
— Se você diz... — Ele deu de ombros enquanto eu o olhava indignado. A gente já não tinha passado dessa fase? - Mas você sabe, é um hábito dele. Usar os próprios filhos para conseguir poder e dinheiro.
Ah, é verdade, eu tinha me esquecido. Zeke tem uma rinha com Grisha desde que eu me conheço por gente. O loiro foi um filho que meu pai teve antes de se casar com Carla - minha mãe - , mas que ela acabou morrendo no parto e Grisha teve que o criar sozinho, pelo menos até ele conhecer minha mãe e ela praticamente adotar o garoto como filho.
Mas no meio tempo em que Zeke era criado unicamente pelo Yaeger mais velho, o garoto havia sido usado como uma arma contra os Marleyanos, enchendo a cabeça da pobre criança - pobre só de saúde mental. ‐ com ideais terroristas e contra a Máfia inimiga, para que Zeke algum dia se tornasse um mártir.
Só que Grisha desistiu dessa ideia ao decorrer dos anos, notando a incapacidade do loiro de batalha, que nem ao menos era capaz de segurar uma pistola corretamente.
— Velhos hábitos nunca mudam. — Comentei, um pouco cabisbaixo pelo assunto ter vindo à tona novamente.
— Falando no diabo... — Zeke disse apoiando seus cotovelos no parapeito do segundo andar, levando sua "xícara" aos lábios. E lá embaixo estava Grisha, com o celular em seu ouvido e andando de um lado para o outro da sala, idêntico a uma barata tonta.
[ ... ]
— Assim do nada? — Perguntei enquanto me ajeitava no sofá, sentindo o olhar do loiro queimar em minhas costas.
— Não. Me disseram que ela foi demitida depois de terem achado "coisas ilícitas" no armário dela. — Meu pai parece um advogado quando está indignado, isso é uma ótima qualidade se você for quem está sendo defendido. — Isso não faz o menor sentido! Quem é o retardado que mexe com drogas e guarda elas no armário do trabalho?!
— É, se você pensar por esse lado de mafioso experiente, realmente não faz sentido. Vamos lá... Nós estamos falando sobre uma organizadora de eventos, não uma integrante dos Yaegueristas. — Assegurei. — Deixa de ser paranóico, pai. Às vezes as pessoas realmente são burras a esse ponto.
O homem ruborizou seu rosto, se sentando no sofá em sua frente, tentando admitir mentalmente o que acabara de ouvir.
— O estranho é que isso aconteceu uma semana após eu contratar ela para ser sua conselheira.
— Conselheira?
— É, ir nas suas compras e te ajudar a escolher o terno de acordo com a paleta de cores do casamento e mais algumas coisinhas.
— A família da Historiya não tinha ficado por conta da arrumação e emperiquitar o lugar todo?
— Os Reiss disseram que a maior parte das despesas seria por conta deles, mas ainda sim eu escolhi pagar um terço, para não acabar pagando a vergonha. — Dei de ombros, soltando um baixo gemido de cansaço. Essa parte definitivamente vai ser a mais chata, mais do que o próprio casamento.
— Mas de qualquer forma — Grisha continuou —, eles se solidarizaram com o meu apelo exagerado e contrataram outra conselheira de uma empresa vizinha, deixando o cachê dela por conta da casa.
— Era pra pular de alegria?
— Não, era para ao menos comemorar que você não vai de terno branco para o casamento com a paleta de cores vermelha.
— Ah. — Passaram-se alguns segundos em silêncio. — E esse ser humano ao menos tem um nome?
— Tem. Acho que era Mikaru... Não, espera. — Ele se auto repreendeu, tirando o celular de seu bolso para checar.
"Agora eu entendi os fios brancos."
— Isso. Mikasa Lenz.
— Igual a bola de vôlei?
— Eren, eu te conheço. Se você falar isso na frente dela, eu te deserdo, garoto.
[ ... ]
Magath apoiou suas mãos na extensa mesa em sua frente, encarando o planta do território Marleyano extendida ali, com uma expressão misteriosa no rosto, como o de alguém que está tramando algo.
— Já encomendou os materiais? — Um rapaz alto e loiro se desencostou da parede, se direcionando ao comandante.
— Já. Pedi para os Reiss.
— Eles não vão desconfiar de você ter encomendado materiais para explosivos um ano antes do casamento da vice-líder? — Reiner indagou.
— Eu dei uma desculpa qualquer e eles acreditaram. — O homem mais velho se desencostou da mesa, cruzando seus braços diante o corpo, soltando um baixo gemido de convencimento. — Para os Reiss não importa o que seja, se tiver dinheiro no meio, eles tão dentro. É impressionante como o dinheiro cega eles.
— Se você diz... — Reiner hesitou, um pouco receoso dessa verdade qual Theo dizia. - Mas então, quanto ao projeto, qual sua ideia?
— Uma máquina autodestrutiva, que é capaz de causar explosões de mais de 100 metros. Como ela terá resíduos nucleares, mesmo que poucos, vai conseguir intensificar a potência da explosão.
— Você pretende usar isso no casamento? Então não haverá aliados nossos lá?
— Se não houver guerreiros nossos lá, eles vão desconfiar da bomba. — Reiner arregalou seus olhos, entendendo o plano do comandante.
— Você... — O loiro estava prestes a continuar, mas Magath o interrompeu.
— É preciso pelo nosso futuro, eles terão de se sacrificar.
— Mas não havia outra forma? A gente tem que explodir tudo?
— Reiner, se nós não atacarmos com violência, seremos retribuidos com violência. Ou você quer se sentar e tomar um cházinho enquanto eles preparam as armas? — O de fios dourados desviou seus olhos do homem, exalando cansaço.
— Onde você pretende colocar essa monstruosidade?
— Embaixo do altar. A estimativa é que mate mais de 80% dos convidados.
— Isso vai acarretar praticamente uma guerra! — Reiner franziu o cenho.
— Não importa. Ao fazermos isso, estaremos na frente.
— Mas se a verdadeira intenção deles não for se virar contra nós? — O guerreiro tentou argumentar contra Magath, um plano que foi por água abaixo.
— Você não vai me fazer mudar de ideia, Braun. Já está decidido e não há o que fazer. — O loiro deu de ombros, respirando dolorosamente.
— Você queria tratar de mais alguma coisa comigo? — Houve alguns segundos de silêncio constrangedor na sala, até que o comandante o quebrou.
— E quanto ao nosso infiltrado?
— Ele tá conseguindo segurar a barra. É bem próximo do noivo, não vai ser muito difícil acabar com esse casamento se ele estiver lá.
— Perfeito. — Theo soltou um curto sorriso vitorioso, transmitindo sadismo. — Semana que vem daremos início à operação.