Sete

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Aos poucos, ao longo da semana seguinte, Gustavo começou a dar sinais de estar superando a morte de Doc, e a cada dia parecia um pouco menos triste. Isabel fez o que pode para mantê-lo ocupado e distraído. Ajudou-o com um trabalho da escola e concordou, inclusive, em ceder às implicâncias do filho com sua aversão à música digital e aceitou que ele lhe ensinasse a usar o Spotify. Apesar de prescindir da magia de transformar músicas em objetos materiais, palpáveis, o aplicativo de streaming de músicas a agradou. Era mais prático conectá-lo ao rádio do carro do que trocar os CDs e qualidade do som era realmente boa. Seria uma boa maneira de tirá-la do looping eterno do mesmo CD do Queen esquecido no aparelho de som.

Foi uma semana que a aproximou ainda mais do filho, e isso, independente de qualquer facilidade que a tecnologia pudesse levar a sua vida, era o que mais importava.

Na noite de domingo, uma semana depois da morte do cachorro, Gustavo terminava de se arrumar para ir ao aniversário de um colega da escola e contava à mãe que estava feliz por Carolina finalmente ter aprendido a lhe dar valor, ao invés de ficar grudada em Matheus. Ela tinha frequentado bastante a casa deles nessa última semana, também se esforçando para manter Gustavo animado. Isabel, sentada na cama dele, pensou em insinuar que, se ele não se apressasse e pedisse logo a amiga em namoro, Matheus poderia fazê-lo na sua frente. Mas não era o momento de abusar da paciência dele, embora ela secretamente torcesse para que ele e Carolina ficassem juntos.

Depois de Gustavo terminar de se arrumar, Isabel o levou até o shopping onde o aniversário seria comemorado e, de lá, seguiu para o centro. A animação do filho com o compromisso era, além de um forte sinal de que estava se recuperando bem, uma oportunidade perfeita para encontrar Beto sem culpa por deixar Gustavo sozinho em casa.

De toda a lista de programas que Beto fazia questão de fazer antes da viagem, Isabel escolhera acompanhá-lo no festival de sopas do Ceagesp. Como ainda era o começo da noite, a fila de espera para as mesas não estava muito demorada, em apenas vinte minutos conseguiram entrar para se servir e comer. Ele estava particularmente agitado essa noite. A proximidade da viagem o deixara ansioso e ele quase não conseguia disfarçar isso. Falava sobre como queria aproveitar bem cada minuto na última semana no Brasil, para não esquecer nenhuma das coisas boas que tinha por aqui durante o tempo que passaria lá fora.

– Estive pensando, Bel... O que você acha de passar uma semaninha comigo na Califórnia? – Beto a olhava entusiasmado. Estavam sentados lado a lado e, antes de fazer essa pergunta, ele tinha virado o tronco para ficar bem de frente para ela.

– Como é? – Ela riu, confusa, sem entender direito aquela pergunta. Também se virou na cadeira para olhá-lo nos olhos.

– Então, eu viajo pra lá no domingo que vem, mas minhas aulas só vão começar mesmo no dia vinte e dois... Quer dizer, eu terei duas semanas lá para me acertar, começar a me adaptar... Eu estava pensando em resolver tudo o que fosse preciso sobre a minha estadia e a universidade na primeira semana e, na segunda, aproveitar, alugar um carro e fazer uma viagem pela costa, sabe? Bem essa coisa clichê que a gente vê em todo filme? É meio besta, eu sei, mas é um lugar tão bonito... Tava pensando em passar um dia na Disneyland e depois ir, sem pressa, de Los Angeles até, pelo menos, São Francisco e voltar. Mas eu não queria fazer isso sozinho e, de todas as pessoas que eu gostaria que estivessem comigo e que de fato poderiam se dar ao luxo de tirar uma semana de férias assim, no meio de agosto, você é a primeira da lista.

– Beto, você é maluco! E o que te faz pensar que eu poderia fazer isso? – Isabel disse, levemente constrangida por aquele convite tão inesperado.

– Qual é o problema, Bel? Ia ser muito divertido fazer esse passeio com você. E, bom... Você é sócia do hospital veterinário em que trabalha, isso te dá alguns privilégios, não dá? – Ele a olhava com um sorriso muito sério no rosto, como se aceitar aquele convite fosse uma escolha óbvia.

Como devia estarOnde histórias criam vida. Descubra agora