Capítulo 2

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Capítulo 2 - Luara

Tento relaxar ao máximo o meu corpo e ele me arrasta pra dentro de um barraco enquanto os barulhos do lado de fora ficam mais altos.

Meu Deus do céu.

Não tenho como debater contra os braços dele, o cara parece um tanque. Estica a mão pra fechar a porta e gira a chave lentamente, tentando não fazer barulho ao nos trancar dentro da sala.

xx: Esse fudido conhece a favela melhor do que a mão dele, porra. Pra achar vamo ter que entrar de barraco em barraco, os caras dele vão chegar já já e bater de frente com nós — uma voz soa baixo na viela e eu me encolho, sentindo a respiração pesada próxima ao meu ouvido.

Posso sentir o meu coração batendo na garganta pelo tamanho do susto e o medo, o resto do meu corpo eu já nem sinto mais.

Um milhão de coisas passam na minha cabeça e eu não consigo distinguir os sentimentos com a adrenalina correndo no meu sangue.

Eu só queria o caralho de um emprego pra pagar as minhas contas.

Ele me guia, dando mais dois passos lentos pra trás, e nossos corpos caem juntos no sofá. O meu peso contra seu tronco o faz soltar um gemido de dor muito baixo e eu olho, pela primeira vez, pro rosto dele.

O choque toma meu corpo quando reconheço aqueles traços. A fisionomia em si  já é marcante, mas o fato de ser quem é triplica a sensação de desespero no meu coração.

Puta que pariu, em que buraco eu me meti?

Os braços do dono do Complexo do Chapadão me seguram, prendendo nossos corpos unidos e eu sinto o frio correndo ao longo da minha espinha.

Universo, quando eu pensei, mais ou menos uma hora atrás, que morrer poderia ser uma solução pra minha vida, eu tava brincando... Eu tô tão novinha ainda...

Ele morde o lábio inferior lentamente e seus olhos escuros se prendem nos meus. A expressão dele é muito séria.

Eu nunca o vi sendo exatamente simpático, mas a testa franzida e a mandíbula contraída me mostram que ele não tá bem... Não é só raiva, nem só concentração...

Xxx: Ele entrou nessa viela, po. Eu vi, ele tava sozinho, deve tá dentro de algum desses barracos — lá fora, o tom de voz, apesar de baixo, é duro — algum filho da puta tá escondendo ele, não tem como ele ter ido longe baleado.

Arregalo os olhos e procuro o ferimento nele, sentindo sua mão afrouxar na minha cintura e roçar a minha pele embaixo da blusa, enquanto a outra se mantém pressionando meus lábios.

Os pelos do meu braço eriçam pelo toque dele.

Passo meu olhar pelo seu pescoço e os braços tatuados, mas só acho o ferimento quando vejo que a bala queimou a blusa dele, atingindo a parte inferior do abdômen. Percorro meu olhar pelo chão e sofá que já estão manchados de vermelho, apesar da gente estar aqui a poucos segundos.

Ele ta perdendo muito sangue e a mão, que tava calando a minha boca, desce até o ferimento. Os dedos ficam sujos também e a respiração dele mais ofegante.

Não sei o que me dá... Uma mistura de coragem com dezenove temporadas de Grey's Anatomy, talvez, mas quando percebo, já estou ajoelhada de frente pra ele e subo sua camisa, deixando um pouco acima do umbigo.

O sangue é tanto que não consigo ver o buraco da bala. Meu Deus, preciso fazer ele parar de sangrar. Esse homem pode ter alguém que precise dele esperando em casa.

Largo minha bolsa no chão, mantendo o silêncio, e tiro minha camisa, já que me acostumei a ir trabalhar com um top por baixo pra ficar mais fácil na hora de colocar o uniforme da loja.

Afasto a mão dele e pressiono o tecido sobre o ferimento.

A dor deve ser do caralho porque o corpo dele dá um tranco e Digão joga a cabeça pra trás, prendendo os lábios pra não gritar.

Mesmo com a proteção da camisa, minha mão fica tão encharcada de sangue quanto as suas, caídas no sofá ao lado do quadril dele.

Não ouço mais nenhum barulho do lado de fora por alguns segundos e mexo no elástico da cueca dele, que de branca tá totalmente vermelha, pra afastar o tecido da área atingida e sensível.

A respiração dele acalma um pouco e eu ergo meus olhos até os dele, que me estuda de cima a baixo. Eu sei que ele quer saber quem sou eu, e eu não queria estar com ele aqui e agora.

Xxx: Vamo entrar nessa porra, tá cheio de sangue aqui — uma voz diferente do outro lado da porta me assusta e os nossos olhares se prendem novamente.

Prendo a respiração porque ele coloca a mão na cintura e pega a arma apontando pra porta.

Numa porrada só a madeira da porta vai pro chão e o Digão me joga pra lateral do sofá, dando dois tiros na direção da porta.

Fecho os olhos e espero a morte vir, porque não tem mais chance de eu sobreviver a esse dia.

xxx: Porra, patrão — alguém grita.

Digão: Caralho, seus filho da puta, como que vocês entram nessa porra assim — xinga e eu abro os olhos, vendo ele pressionar a minha camisa no ferimento, curvando o corpo pra frente — Vai atrás dos fodidos, acabaram de passar aqui. Vai atrás, Picolé.

Picolé: Tu tá ferido, patrão. — o soldado olha pra mim e pro chefe.

Digão: Picolé, faz a porra que eu tô mandando, caralho! — geme de dor e volta a sentar quando o soldado sai da casa.

Eu me levanto, ainda em choque, e sento no braço do sofá, voltando a tentar estancar o sangue que voltou a descer pela entrada em V dos músculos do abdômen dele.

Luara: Tu não devia ter feito isso — nego com a cabeça — Precisa ir pra um hospital agora, tá sangrando muito...

Digão: Eu sei o que eu to fazendo — diz seco e eu levanto uma sobrancelha.

Luara: Tô tentando te ajudar só — mordo a língua pra não entrar numa discussão maior.

Eu aqui preocupada que ele tá sangrando igual um filho da puta e ele de grosseria.

Digão: Tô ligado — abre os olhos pra me olhar — No caminho ele vai mandar alguém vir no meu resgate pelo rádio. 


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nota da autora:

Gente, socorro! Não tô conseguindo colocar as fotos dos personagens, vocês conseguem ver a foto da Luara na capa do capítulo?

Ligações de Alma [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora