ONU pede transição de governo ‘confiável e inclusiva’ na Síria
Em visita a Damasco, enviado especial Geir Pedersen se encontra com líder rebelde após coalizão de milícias derrubar ditadura de Bashar al-Assad
O enviado das Nações Unidas para a Síria, Geir Pedersen, visitou Damasco nesta segunda-feira, 16, para um encontro com o líder rebelde que comandou a destituição da ditadura de Bashar al-Assad, onde pediu uma transição de governo “confiável e inclusiva” para a Síria.
O diplomata norueguês reuniu-se com o líder rebelde Ahmed al-Sharaa – um muçulmano sunita que hoje desfila em uniforme militar na capital síria mas pouco antes, de turbante jihadista, atendia pelo nome de guerra de Abu Mohammad al-Jolani e está na lista de terroristas dos países do Ocidente – e com o primeiro-ministro interino, Mohammed al-Bashir, que deve entregar o poder a um governo coeso até 1º de março de 2025.
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Uma declaração divulgada pelo gabinete de Pedersen afirmou que o diplomata ofereceu o apoio das Nações Unidas para as negociações e enfatizou “a necessidade de uma transição política credível e inclusiva de propriedade e liderança síria”.
“O processo político de transição deve produzir um governo inclusivo, não sectário e representativo”, completou o texto.
Tabuleiro geopolítico
O mundo assiste com atenção as negociações para criar o governo a substituir o regime de Assad. A chefe de política externa da União Europeia, Kaja Kallas, disse que instruiu o representante diplomático do bloco para a Síria a ir a Damasco ainda nesta segunda-feira para fazer contato com os possíveis líderes da nova gestão.
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Pedersen, por sua vez, voou para Damasco diretamente após uma reunião internacional em Aqaba, na Jordânia, onde os principais diplomatas dos estados árabes, Estados Unidos, Turquia, França, Alemanha e Reino Unido se encontraram no sábado 14 para concordar com o que eles disseram que seria um “futuro mais esperançoso, seguro e pacífico” para os sírios.
O Irã e a Rússia, os dois principais sustentáculos da ditadura durante 13 anos de sangrenta guerra civil na Síria, perderam influência por lá, enquanto a Turquia e alguns estados do Golfo devem tentar colher os frutos de seu apoio ativo aos rebeldes anti-Assad. Enquanto isso, os países ocidentais que apoiaram a oposição no início do conflito, mas hesitaram quando grupos islâmicos, como o Hayat Tahrir al-Sham (HTS) de Sharaa, se tornaram proeminentes, a exemplo dos Estados Unidos, aguardam a situação se desenvolver para dar os próximos passos.
Fator Israel
No olho do furacão, Israel também tentou explorar o vácuo de poder para enfraquecer potenciais inimigos que venham a compor o futuro governo sírio, despejando toneladas de bombas contra depósitos de armas estratégicos do antigo regime, para que não caíssem nas mãos dos rebeldes. As forças israelenses também instalaram comandos nas Colinas de Golã (território que é supostamente neutro, mas onde circulam à vontade).
Na segunda-feira, o Observatório Sírio de Direitos Humanos, um monitor de guerra com sede no Reino Unido, afirmou os israelenses conduziram os “ataques mais violentos na região da costa síria” em mais de uma década, com ataques aéreos contra depósitos de mísseis.
Sharaa já disse que não está interessado em conflito com Israel. “Não há desculpas para qualquer intervenção estrangeira na Síria agora, depois que os iranianos partiram. Não estamos no processo de nos envolver em um conflito com Israel”, disse ele à mídia estatal síria.
Futuro incerto
O governo interino da Síria buscou tranquilizar os diferentes grupos étnicos e religiosos do país de que todos serão protegidos e incluídos após após mais de meio século de repressão sob o clã Assad. O premiê Bashir anistiou os soldados do antigo regime e prometeu respeitar as minorias religiosas.
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Ainda assim, há preocupações de que a administração interina comandada pela HTS, que é composta em grande parte por combatentes da maioria sunita da Síria, possa marginalizar grandes populações minoritárias, que incluem muçulmanos xiitas, drusos, alauítas e cristãos. Em seu primeiro discurso em Damasco, na venerada mesquita Umayyad, Sharaa carregou no tom religioso ao afirmar que “esta vitória, meus irmãos, é uma vitória de toda a nação islâmica”. Em paralelo, deu entrevistas à CNN e ao New York Times com acenos ao Ocidente. “Ele está falando as palavras certas”, disse, ressabiado, o presidente americano, Joe Biden.
Para ajudar a economia da Síria, Pedersen pediu que os Estados Unidos, o Reino Unido e a União Europeia levantem as sanções impostas ao país quando Assad estava no poder. Para fazer isso, eles precisariam remover o HTS, cria do fundamentalismo da Al-Qaeda, de Osama bin Laden, mas garante ter se desligado e seguir agora uma linha pragmática, de suas listas de organizações “terroristas”.