Usuário(a):DocElisa/A circulação do sangue
O termo circulação refere-se ao movimento de um fluido ao longo de um circuito fechado. A circulação do sangue é o movimento do sangue originado pelo bombeamento do coração que o envia para as artérias. A função circulatória é, basicamente, uma função de transporte.
A circulação do sangue faz-se em dois circuitos separados anatomicamente e com funções diferentes:
- Circulação pulmonar ou Pequena circulação pela qual são realizadas as trocas gasosas oxigênio e anidrido carbónico
- Circulação sistémica ou Grande circulação que permite levar os nutrientes e oxigénio aos tecidos e receber os produtos finais do metabolismo para serem excretados, assim como levar as hormonas aos seus órgãos alvo.[1]
História
[editar | editar código-fonte]Os mais antigos relatos sobre a circulação remontam às descrições encontradas no Ebers Papyrus (séc. 16 AC). Posteriormente, Herophilus e seu discípulo Erasistratus, no séc. IV AC. distinguem as artérias das veias porque elas pulsam. Mas como no cadáver elas se apresentavam vazias eles deduziram que continham ar e quando cortadas sagravam porque o ar ao sair da artéria era substituído pelo sangue que chegava por pequenos vasos entre as artérias e as veias (é a primeira descrição dos capilares)[2]
Mais tarde, os textos de Caio Plínio Segundo, um escritor romano que viveu entre os anos 79-23 AC., mostram a grande confusão que ainda persistia ... Assim Plínio dizia "as artérias não têm sensibilidade, nem contêm sangue e nem mesmo o sopro da vida e quando são cortadas só a parte do corpo que lhes diz respeito fica paralisada... as veias espalham-se sob a pele terminando em finos canais, estreitando cada vez mais até um calibre diminuto por onde o sangue não pode passar mas somente uma mistura em inúmeras pequenas gotas chamada suor que vem do meio do seu rabo traseiro, síndrome da hemorroida"...[3][4]
O conhecimento da circulação começa a ser mais coerente na Grécia antiga com os escritos de Hipócrates.[5]
No séc. II DC, o físico grego Galeno descobre que os vasos sanguíneos contém sangue, identifica o venoso (vermelho escuro) e o arterial (mais claro e mais fluido), cada um deles com funções separadas e diferentes. O crescimento e a energia são para ele derivados do sangue venoso criado no fígado a partir do quilo, enquanto o sangue arterial dá vitalidade por conter pneuma (ar) e é originado no coração. O sangue corre dos dois órgãos onde se forma para todas as partes do corpo onde é consumido e não há retorno ao coração ou ao fígado. O coração não bombeia o sangue, o movimento cardíaco aspira o sangue na diástole e o sangue move-se pela pulsação das próprias artérias. Galeno acreditava que o sangue arterial era criado pelo sangue venoso ao passar do ventrículo esquerdo para o direito através de 'poros' situados no septo interventricular, o ar passava dos pulmões pela artéria pulmonar para o lado esquerdo do coração. À medida que o sangue era criado formavam-se vapores que passavam para os pulmões também pela artéria pulmonar para serem exalados. Os seus registos anatómicos, baseados na disseção de macacos e porcos, permaneceu incontestável até 1543 quando as descrições e ilustrações de disseções humanas foram publicadas no trabalho De humani corporis fabrica por Andreas Vesalius[6][7] onde a teoria fisiológica de Galeno foi adaptada às novas observações.[8]
A teoria de Galeno sobre a Fisiologia humana do Sistema circulatório manteve-se até 1551 quando o Doutor Amato Lusitano (João Rodrigues de Castelo Branco, 1511-1568), médico português, descreveu a circulação do sangue na sua obra em 7 volumes Curationum Medicinalium Centuriæ Septem em 1551 e pela primeira vez afirmou que as veias tinham válvulas.[9] Esta descoberta veio contrariar o que estava admitido desde Galeno de que o sangue saía do coração tanto pelas artérias como pelas veias. Isto baseava-se no facto de que as redes arterial e venosa se tornam cada vez mais finas à medida que se afastam do coração e acreditava-se que estas redes não conetavam entre si. O microscópio ainda não tinha sido inventado e os capilares não podiam ser vistos.
Em 1628 William Harvey (1578-1657) publica o seu De motu cordis e fica na história como sendo o primeiro a descrever a circulação do sangue, estabelecendo que o sangue circula porque coração se comporta como uma bomba.[10]
A circulação pulmonar foi descrita pela primeira vez por Ibn al-Nafis no seu Commentary on Anatomy in Avicenna's Canon (1242) e também por Michael Servetus no "Manuscript of Paris",[11]
Circulação pulmonar
[editar | editar código-fonte]Circulação Pulmonar ou Pequena circulação é a designação dada à parte da circulação sanguínea na qual o sangue é bombeado para os pulmões e volta, livre do anidrido carbónico (CO2) e rico em oxigénio (O2) ao coração. Ao chegar à aurícula direita pelas veias cavas superior e inferior, o sangue passa da aurícula para o ventrículo direito. Quando este, por sua vez, se contrai, dá-se a ejeção ventricular direita para a artéria pulmonar que dividindo-se em direita e esquerda vai levar o sangue aos dois pulmões. As artérias pulmonares dividem-se e sub-dividem-se até se tornarem numa rede capilar nas paredes alveolares onde vão ter lugar as trocas gasosas com difusão do Dióxido de carbono ou Anidrido carbónico (CO2) dissolvido no plasma e captação do O2, que compõe 21% do ar, o qual se fixa nos glóbulos vermelhos, mais exatamente na hemoglobina contida nesses glóbulos. Para que essas trocas sejam possíveis as paredes alveolares estão revestida por surfactante, uma molécula tensoativa ( complexa segregada continuamente pelos pneumócitos alveolares de tipo 2. Uma vez oxigenado, o sangue flui da vertente venosa capilar das paredes alveolares, para pequenas vénulas que juntam e formam veias cada vez de maior calibre até se tornarem as veias pulmonares que drenam na aurícula esquerda. Esta, ao contrair-se envia o sangue para o ventrículo esquerdo e a Circulação sistémica ou Grande circulação, começa.[1]
Circulação sistémica
[editar | editar código-fonte]Chegado ao ventrículo esquerdo o sangue arterializado é bombeado para a artéria aorta seus ramos, atingindo todas as partes do corpo humano, ramificando-se em artérias de calibre cada vez menor até atingir a vertente arterial capilar e libertar o tão precioso oxigénio aos tecidos para que a respiração celular seja possível. Recolhe os produtos finais do metabolismo celular e volta, percorrendo o caminho inverso, ou seja: vertente venosa da rede capilar, vénulas, veias até atingir a veia cava inferior ou a veia cava superior, dependendo da região e drena de novo na aurícula direita. As veias contêm cerca de 70% do volume sanguíneo total, ao contrário das artérias que transportam só cerca de 15%.[1][12]
Circulação capilar
[editar | editar código-fonte]A circulação capilar faz parte da microcirculação. É a este nível circulatório que se dá a função major de toda a circulação: a troca de nutrientes entre o sangue e as células e a recolha das substâncias nocivas, produtos finais do metabolismo celular. Ao chegar às células as arteríolas transformam-se em metarteríolas adquirindo pequenos esfíncteres que se relaxam e contraem 5 a 10 vezes por minuto regulando o débito de sangue a este nível. Este débito depende das necessidades da célula em oxigénio. Por sua vez as metarteríolas transformam-se em capilares, perdendo a camada muscular e os esfíncteres. Os capilares têm assim uma parede muito fina, constituída só pela íntima (a camada interna vascular), com poros que deixam passar os iões e as moléculas hidrossolúveis para o tecido intersticial e posteriormente atravessam a membrana celular para o interior da célula. Isto facilita as trocas gasosas e de outros nutrientes, sem necessidade de mecanismos de transporte, permitindo uma difusão bi-direcional dependente de gradientes osmóticos como descrito na tão conhecida equação de Starling:
Onde
- força de drenagem,
- é a constante de proporcionalidade,
- o movimento do fluido entre o capilar e o tecido intersticial.
De acordo com esta equação, simplificada para o capilar sanguíneo, o movimento de um fluido, neste caso o sangue, depende assim de 5 variáveis:
- Pressão hidrostática capilar ( Pc )
- Pressão hidrostática intersticial ( Pi )
- Pressão oncótica capilar ( πz )
- Pressão oncótica intersticial ( πi )
- Coeficiente de filtração ( Kf )
O coeficiente de reflexão ( R ) que exprime a impermeabilidade da parede a proteinas é, em condiçóes normais, igual a 1. A parede capilar não deixa passar proteinas. Só será considerado em casos patológicos com aumento da permeabilidade às proteinas e R <1.[1]
Referências
- ↑ a b c d Guyton Textbook of Medical Physiology, 10e edition, Arthur Guyton and John Hall, 2000, ISBN-10: 072168677X
- ↑ Anatomy - History of anatomy
- ↑ Beagon, Mary (translator) (2005). The elder Pliny on the human animal: Natural History, Book 7. [S.l.]: Oxford University press. ISBN 0-19-815065-2
- ↑ Healy, John F. (1999). Pliny the Elder on science and technology. [S.l.]: Oxford University Press. ISBN 0-19-814687-6
- ↑ Young, R. A. (1940). «The Pulmonary Circulation--Before and After Harvey: Part I». BMJ. 1 (4122). 1 páginas. PMC 2176288. PMID 20782884. doi:10.1136/bmj.1.4122.1
- ↑ Andreas Vesalius (1543). De humani corporis fabrica, Libri VII 🔗 (em Latin). Basel, Switzerland: Johannes Oporinus. Consultado em 7 August 2010 Verifique data em:
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(ajuda) - ↑ O'Malley, C., Andreas Vesalius of Brussels, 1514–1564, Berkeley: University of California Press
- ↑ Siraisi, Nancy G., (1991) Girolamo Cardano and the Art of Medical Narrative, Journal of the History of Ideas. pp. 587–88.
- ↑ Amatus Lusitanus discovered valves in veins and arteries; by David Hashavit, citação: "Há bases verosímeis para afirmar que foi o Dr. Amatus quem primeiro descobriu o fenómeno da "Cirdulação do sangue"
- ↑ Harvey, W., Exercitatio anatomica de motu cordis et sanguinis in animalibus, Frankfurt, W. Fitzeri, 1628
- ↑ 2011 “The love for truth. Life and work of Michael Servetus”, (El amor a la verdad. Vida y obra de Miguel Servet.), printed by Navarro y Navarro, Zaragoza, collaboration with the Government of Navarra, Department of Institutional Relations and Education of the Government of Navarra, 607 pp, 64 of them illustrations, p 215-228 & 62nd illustration (XLVII)
- ↑ «Fisiologia Cardiovascular» (PDF). Consultado em 25 de novembro de 2012