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Mirmecófita

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Formigas do gênero Azteca capturando um besouro herbívoro em folíolo de planta do gênero Cecropia, uma mirmecófita

As mirmecófitas são plantas, na sua maioria angiospermas, que possuem uma relação mutualística com formigas, sendo ambos grupos beneficiados[1]. Em muitos casos essa relação é obrigatória[2]. As mirmecófitas são capazes de se defender química e fisicamente por meio de mecanismos que dificultam o ataque de herbívoros e o desenvolvimento de plantas parasitas. Indiretamente, as mirmecófitas se defendem por meio do recrutamento de outras espécies, como formigas, para a proteção da planta[3]. Essas plantas são capazes de recrutar formigas inquilinas para protegê-las por garantirem benefícios a estas, como a presença de estruturas modificadas permitindo abrigo e formação de colônias, além de estruturas especializadas para alimentação das formigas[4]. Durante muitos anos, diversos pesquisadores acreditavam que a relação entre plantas e formigas era exclusivamente de parasitismo.

Mirmecofitismo

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Folíolos extensamente atacados de Cecropia que não apresentava formigueiro co-habitante.

O mirmecofitismo é uma relação mutuamente benéfica entre plantas e formigas. Dessa forma, o investimento da planta nas estruturas de abrigo e alimentação para as formigas é compensado pela proteção e patrulhamento da planta[5]. As formigas podem atuar em três direções diferentes:

  1. proteção da planta contra herbívoros e parasitas, diminuindo o impacto da herbivoria;
  2. controle da incidência de plantas competidoras com a hospedeira;
  3. acúmulo de matéria orgânica provinda dos remanescentes das colônias em estruturas das plantas, que a absorve posteriormente[4].

Ainda, as formigas podem prover proteção contra patógenos, como fungos[2]. As mirmecófitas apresentam modificações estruturais, para o abrigo e proteção, além de especializações para o fornecimento de alimento às colônias de formigas[5].

Origem e evolução

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Evidências sugerem que o mirmecofitismo surgiu várias vezes entre quinze e cinco milhões de anos, durante o Mioceno, e em três diferentes regiões: na África, no Sudeste Asiático e na região neotropical.[6]

Adicionalmente, o traço foi também perdido frequentemente nos grupos de mirmecófitas, implicando que o desenvolvimento de domácias é altamente plástico[6]. Tal plasticidade é vista de diferentes formas: em Dacoca, no qual um único indivíduo pode apresentar domácias ou não[6]; na tribo Miconieae, de forma geral, domácias semelhantes evoluíram independentemente em espécies próximas[6]; em Macaranga, o mirmecofitismo apareceu múltiplas vezes numa linhagem endêmica da Malésia.[7]

Os surgimentos e desaparecimentos frequentes, somados à elevada plasticidade no desenvolvimento, indica que o mirmecofitismo apesar de muitas vezes vantajoso depende das pressões ambientais nas quais a plantas estão inseridas.[6]

Modificações estruturais

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Uma domátia próxima da nervura de um folíolo de Guioa acutifolia.

Domátias são estruturas especializadas, presentes em todas as plantas mirmecófitas, em que as formigas habitantes podem se estabelecer. As domátias podem estar presentes em diferentes estruturas, como espinhos ocos, caules, pecíolos, folhas modificadas, rizomas e tubérculos. As plantas mirmecófitas formam essas estruturas independente da presença de formigas para ocupá-las, mas, uma vez habitadas, as formigas podem expandir as cavidades e remodelar o seu espaço de nidificação[8]. As domácias são extremamente raras em monocotiledôneas e comuns dentre as dicotiledôneas[3]. As domácias não abrigam apenas formigas, mas também podem abrigar outros insetos, sendo os ácaros um dos mais notórios, cuja associação com plantas foi responsável pelo nome “domácia” (domatium = casa pequena)[3]. No caso do abrigo de formigas, as domácias tendem a ser maiores do que as utilizadas pelos ácaros. A depender das espécies de plantas, a quantidade e forma da domácia são divergentes[3].

Nectários extra-florais

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Nectários são estruturas encontradas na superfície de plantas terrestres e que secretam soluções aquosas ricas em açúcar, também conhecidas como néctar, que atraem animais. Os nectários extra-florais são estruturas secretoras de néctar localizadas externamente às flores, nas nervuras e pecíolos das folhas, e nas bases das flores e frutos. Essas estruturas não possuem relação direta com a polinização, mas servem como atrativo para a colonização da planta por formigas, e uma vez estabelecidas elas continuam a utilizar o néctar produzido por essas estruturas como fonte de alimento[9]. Mais de 100 famílias de plantas possuem essas estruturas, incluindo angiospermas, monilófitas e gimnospermas, distribuídas em uma ampla gama de habitats. A secreção expelida pelos nectários extra-florais muitas vezes atraem formigas devido ao seu conteúdo rico de carboidratos[10].

Corpúsculos alimentares

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Corpúsculos alimentares consiste em tecido epidermal sólido rico em nutrientes[11]. Assim como os nectários extraflorais, esses corpúsculos atraem diversas espécies de formigas devido ao seu conteúdo nutricional, que inclui altos níveis de carboidratos, proteínas e lipídios, dependendo da espécie[12].

Corpúsculos de Müller na base de um pecíolo.

Existem diversos tipos de corpúsculos alimentares. Os corpos de Beltian (traduzido do inglês beltian bodies) são encontrados nas pontas de folhas do gênero Acacia e são ricos em proteínas. Os corpúsculos de Beccarian (traduzido do inglês beccarian bodies) são ricos em lipídios e estão presentes nas folhas jovens do gênero Macaranga[13]. Outra estrutura rica em lipídio é o corpo de pérola (traduzido do inglês pearl bodies), presente nas plantas do gênero Ochroma, mais especificamente nas folhas e no caule[14]. Por fim, os corpúsculos de Muller (traduzido do inglês Mullerian bodies) diferem dos anteriores por serem ricos em glicogênio e presentes nos pecíolos das folhas de plantas do gênero Cecropia[15]

Especificidade da interação

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A relação simbiótica entre formigas e mirmecófitas ocorre principalmente nos trópicos, onde mais de 150 espécies de mirmecófitas mantêm-se em associação com espécies de formigas especializadas[16]. Estudos demonstram que grupos de formigas tendem a interagir com poucos grupos de plantas, de modo que há uma relação de fidelidade mas não necessariamente espécie-específica[5]. Dessa forma, uma determinada área pode apresentar diversas interações de mirmecofitismo totalmente independentes umas das outras[17]. É estipulado que a capacidade das formigas-rainhas de identificar e colonizar plantas mirmecófitas é uma importante vantagem. No momento da colonização da planta, as formigas-rainhas reconhecem compostos voláteis emitidos pela planta, permitindo a estruturação da comunidade das formigas, além de garantir uma certa especificidade na interação entre as formigas e a planta[5]. Além disso, plantas mirmecófitas também possuem especializações estruturais para evitar que muitas espécies de formigas a colonizem ao mesmo tempo[17]. Dentre essas especializações pode ser citada a síntese de cera da espécie do gênero Macaranga, provocando um aspecto escorregadio no caule da planta e assim, limitando o acesso de formigas à planta[18].

Azteca alfari x Cecropia sp

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Lagarta em um folíolo prestes a ser atacada por formigas do gênero Azteca, participantes de uma relação mutialística com a planta mirmecófita que colonizam.

Grande parte das plantas do gênero Cecropia (Cecropiaceae) são associadas a formigas em relações mutualísticas. As formigas do gênero Azteca são as mais comumente associadas à Cecropia, realizando funções de proteção contra herbívoros em troca de alimento e espaço para abrigo. A interação de simbiose entre Azteca alfari e embaúbas do gênero Cecropia foi analisada em um estudo realizado por Vasconcelos e Casimiro (1997)[19], que demonstrou como as formigas inquilinas são capazes de afastar a formiga-cortadeira (Atta laevigata), predadora de Cecropia. Espécies de Cecropia menos defendidas por A. alfari (com plantas menos colonizadas e que abrigavam colônias menores) são as com maior incidência de herbívora por A. laevigata. Para garantir o interesse das formigas em se estabelecerem na planta, estas devem apresentar benefícios e alterações estruturais, tais quais as descritas acima, que permitam uma interação mutualística. Por isso, as mirmecófitas do gênero Cecropia possuem adaptações para atrair as parceiras, como o tronco oco de suas plantas, e com câmaras internas para garantir a nidificação de suas formigas inquilinas.

  1. Pereira, M; P. S.; et al. (2012). «Riqueza, composição e atividade diurna da mirmecofauna sobre Triplaris americana L. (Polygonaceae)». Revista Brasileira de Zoociências 
  2. a b Blatrix, T. B.; et al. (2009). «Ant-plant mutualisms should be viewed as symbiotic communities. Plant Signal Behav»: 554-556. doi:10.4161/psb.4.6.8733 
  3. a b c d Matos, C. H. C.; et al. (2006). «Domácias e seu papel na defesa das plantas». Ciência Rural: 1021-1026 
  4. a b Dáttilo, W.; et al. (2009). «Interações mutualísticas entre formigas e plantas». EntomoBrasilis: 32-36 
  5. a b c d Izzo, T. J.; et al. (2011). «Relação entre diferentes espécies de formigas e a mirmecófita Cordia nodosa Lamarck (Boraginaceae) em áreas de mata ripária na Amazônia mato-grossense». Acta Amazonica: 355-360 
  6. a b c d e Chomicki, Guillaume; Renner, Susanne S. (julho de 2015). «Phylogenetics and molecular clocks reveal the repeated evolution of ant‐plants after the late M iocene in A frica and the early M iocene in A ustralasia and the N eotropics». New Phytologist (em inglês) (2): 411–424. ISSN 0028-646X. doi:10.1111/nph.13271. Consultado em 10 de junho de 2024 
  7. academic.oup.com. doi:10.1111/j.0014-3820.2001.tb00674.x https://academic.oup.com/evolut/article/55/8/1542/6757975. Consultado em 10 de junho de 2024  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  8. Mayer, V.; et al. (2014). «Current issues in the evolutionary ecology of ant–plant symbioses». New Phytologist. 202 (3): 749-764 
  9. Matrangolo, W. J. R.; et al. (2022). «Nectário extrafloral de Cratylia argentea e seu significado na agricultura de base ecológica». Sete Lagoas: Embrapa Milho e Sorgo 
  10. Marazzi, B.; et al. (2013). «The diversity, ecology and evolution of extrafloral nectaries: current perspectives and future challenges». Annals of Botany. 111 (6): 1243-1250 
  11. Fiala, B.; et al. (1992). «Food bodies and their significance for obligate ant-association in the tree genus Macaranga (Euphorbiaceae)». Botanical Journal of the Linnean Society. 110: 61-67 
  12. Heil, M.; et al. (2004). «Main nutrient compounds in food bodies of Mexican Acacia ant-plants». Chemoecology: 45-52 
  13. Hatada, A.; et al. (2001). «Myrmecosymbiosis in the Bornean Macaranga species with special reference to food bodies (Beccarian bodies) and extrafloral nectaries». Plant Species Biology: 241-246. doi:10.1046/j.1442-1984.2001.00066.x 
  14. Singh, A.; et al. (2021). «The Efficiency of Plant Defense: Aphid Pest Pressure Does Not Alter Production of Food Rewards by Okra Plants in Ant Presence». Front. Plant Sci. doi:10.3389/fpls.2021.627570 
  15. Rickson, F. R. (1971). «Glycogen Plastids in Mullerian Body Cells of Cecropia peltata--A Higher Green Plant». Science: 344-347. doi:10.1126/science.173.3994.344 
  16. Fischer, R. C.; et al. (2002). «Plants feed ants: food bodies of myrmecophytic Piper and their significance for the interaction with Pheidole bicornis ants». Oecologia: 186-192. doi:10.1007/s00442-002-1000-y 
  17. a b Guimarães, P. R. (2007). «Interaction intimacy affects structure and coevolutionary dynamics in mutualistic networks». Curr Biol: 1797-803. doi:10.1016/j.cub.2007.09.059 
  18. Federle, W.; et al. (1997). «Slippery ant-plants and skilful climbers: selection and protection of specific ant partners by epicuticular wax blooms in Macaranga (Euphorbiaceae)». Oecologia: 217-224 
  19. Vasconcelos, H. L.; et al. (1997). «Influence of Azteca alfari Ants on the Exploitation of Cecropia Trees by a Leaf‐Cutting Ant». Biotropica: 84-92 
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