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Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação

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O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD[nota 1]) é um imposto brasileiro de competência dos estados e do Distrito Federal, que incide quando da transmissão não onerosa de bens ou direitos,[nota 2] tal como ocorre na herança (causa mortis)[nota 3] ou na doação (intervivos). O fato gerador do ITD ocorre quando da transmissão "causa mortis" ou doação a qualquer título ou pelo domínio útil de bens imóveis e de direitos a ele relativos, como os bens móveis, títulos e créditos, inclusive direitos a eles relativos.

Os contribuintes do imposto são, em caso de herança, os herdeiros ou legatários. No caso de doação, pode ser tanto o doador como o donatário. A função do ITD é extrafiscal e fiscal.

A alíquota utilizada varia de acordo com uma tabela progressiva, que determina a alíquota de acordo com a soma do valor venal dos bens doados ou transmitidos. A base de cálculo é o valor venal dos bens, dos títulos ou dos créditos transmitidos ou doados.

Previsão constitucional

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A competência dos Estados e do Distrito Federal para instituir o ITCMD[1][2] está prevista no artigo 155 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.[3]

A Constituição estabelece que o ITCMD terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal (artigo 155, inciso I, combinado com seu próprio parágrafo 1º, inciso IV).

A Resolução n. 9, de 1992, do Senado Federal,[4] dispôs que a alíquota máxima do ITCMD será de oito por cento (8%), corroborando que as alíquotas, fixadas pelos Estados, podem ser progressivas.[nota 4] As legislações estaduais, quando preveem a progressividade, adotam os critérios da base de cálculo e/ou do grau de parentesco com o de cujus ou doador.

Características

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Possui função fiscal e extrafiscal:[nota 5] tem a finalidade de arrecadar recursos financeiros para os Estados e Distrito Federal, mas também de ordenar a economia e as relações sociais.[nota 6]

O lançamento do crédito tributário é feito por homologação.

Ocorre o fato gerador:

  • na transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legítima ou sucessão testamentária, inclusive a sucessão provisória;
  • na transmissão por doação, a qualquer título, de quaisquer bens ou direitos;
  • na aquisição de bem ou direito em excesso pelo herdeiro ou cônjuge meeiro, na partilha, em sucessão causa mortis ou em dissolução de sociedade conjugal.

A base de cálculo é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. A Fazenda Pública deve avaliar o bem transmitido ou doado para se chegar ao quantum a ser tributado.

Há casos em que o bem já demonstra o seu valor; já outros, em que a cotação específica é realizada por órgãos especializados, como por exemplo nos casos onde a tributação recai sobre o valor das ações de sociedades por ações de capital aberto, sendo o referido valor venal detectável prontamente.

Quando tais aferições não forem possíveis, o contribuinte deve apresentar à Fazenda Pública laudo de avaliação que esclareça o método utilizado para avaliar o tipo de bem, respeitando-se assim, entre outros, os princípios da segurança jurídica e da isonomia.

Para a resolução dos conflitos territoriais entre as leis estaduais que criam o ITCMDs, são adotados os seguintes critérios:

  • na transmissão causa mortis: para os imóveis, será recolhido o imposto no local onde se encontra o bem; para outros bens (móveis, títulos e créditos), será recolhido onde for aberta a sucessão.
  • na doação, o tributo será recolhido no domicilio do doador.

Quando o doador tiver domicílio (ou residência) e se o de cujus tinha bens, domicílio ou residência no exterior, a competência dos Estados para cobrar o ITCMD será definida nos termos da Lei Complementar. Como, até hoje, a Lei Complementar prevista pela Constituição Federal (artigo 155, parágrafo 1º, inciso III) não foi editada, cada Estado tem regulado, por lei própria, a sua competência para o ITCMD em tal situação, com base na disposição do artigo 24, parágrafo 3º, da Constituição Federal.

O fato-gerador do ITCMD é pendente, significa que ele fica aguardando que o direito civil diga o momento da sucessão.

Alíquotas e progressividade do ITCMD conforme previsto nas legislações estaduais

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A adoção da progressividade e o valor das alíquotas variam bastante:[nota 7]

# Estado Região Progressivo Tipo Faixas Min. Máx Sigla
1 Distrito Federal CO sim n/a 3 4% 8% ITCD
2 Roraima N não n/a 1 4% 4% ITCD
3 Amapá N não n/a 1 2% (D) 4% (T) ITCD
4 Pará N não n/a 1 4% 4% ITCD
5 Amazonas N não n/a 1 2% 2% ITCMD
6 Tocantins N sim BC 3 2% 4% ITCD
7 Acre N não n/a 1 2% (D) 4% (T) ITCMD
8 Rondônia N sim BC 3 2% 4% ITCD
9 Maranhão NE não n/a 1 2% (D) 4% (T) ITCD
10 Piauí NE não n/a 1 4% 4% ITCD
11 Ceará NE sim BC 4 2% 8% ITCD
12 Rio Grande do Norte NE não n/a 1 4% 4% ITCD
13 Paraíba NE sim n/a 1 2% 8% ITCD
14 Pernambuco NE não n/a 1 2% (D) 5% (T) ICD
15 Alagoas NE sim GP 2 2% 4% ITCD
16 Sergipe NE não n/a 1 4% 4% ITCMD
17 Bahia NE sim BC e GP 3 3,5% 8% ITD
18 Mato Grosso CO sim BC 2 2% 4% ITCD
19 Goiás CO sim BC 3 2% 4% ITCD
20 Mato Grosso do Sul CO não n/a 1 3% (D) 6% (T) ITCD
21 Minas Gerais SE não n/a 1 4% 4% ITCD
22 Espírito Santo SE não n/a 1 4% 4% ITCMD
23 Rio de Janeiro SE não n/a 1 4% 8% ITD
24 São Paulo SE sim BC 2 2,5% 4% ITCMD
25 Paraná S não n/a 1 4% 4% ITCMD
26 Santa Catarina S sim BC e GP 5 1% 8% ITCMD
27 Rio Grande do Sul S sim BC 8 4% (D) 6% (T) ITCD
  • Tipo de progressividade: BC - pela base de cálculo; GP - pelo grau de parentesco.

Direito comparado

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O ITCMD brasileiro pode ser comparado com o imposto sobre herança e doação existente em diversos países.

O termo aplicável em língua inglesa é inheritance tax ou estate tax,[nota 8] na Alemanha Erbschaftssteuer, no Japão souzokuzei, entre muitos outros exemplos. Em Portugal, incide o imposto do selo.

Estados Unidos da América

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O tributo pode ser cobrado pelos Estados ou pela Federação.

Há deduções da base de cálculo (por exemplo, determinados empreendimentos e fazendas que se qualifiquem).[6]

As alíquotas impostas pela Federação são progressivas e há montantes isentos. O valor da isenção e as alíquotas máximas variaram em tempos recentes conforme a tabela a seguir:

Ano Exclusion
Amount
Max/Top
tax rate
2001 US$675.000 55%
2002 US$1 milhão 50%
2003 US$1 milhão 49%
2004 US$1,5 milhão 48%
2005 US$1,5 milhão 47%
2006 US$2 milhões 46%
2007 US$2 milhões 45%
2008 US$2 milhões 45%
2009 US$3,5 milhões 45%
2010 Revogada
2011 US$5 milhões 35%
2012 US$5,12 milhões 35%
2013 US$5,25 milhões[7] 40%
2014 US$5,34 milhões[8] 40%

A alíquota máxima já chegou a ser de 77% (setenta e sete por cento) de 1941 a 1976.[9]

O contribuinte também pode deduzir da base de cálculo doações de caridade feitas às instituições que se qualificam (o que inclui entidades educacionais).[10]

O tributo não possui uma participação importante na arrecadação fiscal,[11] mas aparentemente representa estímulo às doações para caridade e educação, conferindo-lhe então uma característica extra-fiscal.

O Congresso dos Estados Unidos da América publicou estudo sobre os efeitos desse tributo nas doações para caridade.[12]

Pesquisa no país aponta para o aumento da participação de doações privadas no financiamento de universidades públicas.[13]

William Henry Gates, pai de Bill Gates, George Soros, Warren Buffet e Steven Rockefeller já sairam em defesa do estate tax norte-americano.[14]

O inheritance tax britânico adota, em regra, a alíquota de 40%. Há isenção para bases de cálculo de até 325.000 libras. A doação para instituições de caridade qualificadas permite a dedução da base de cálculo[15] e ainda a aplicação de uma alíquota reduzida de 36% sobre o remanescente tributável (a alíquota diferenciada aplica-se quando a doação for superior a 10% dos bens sujeitos ao tributo).[16]

Diversas instituições educacionais britânicas mantêm em seus sítios páginas incentivando doações e informando sobre a possibilidade de dedução.[17][18]

Após a reforma de 2013, o Japão diminuiu a faixa de isenção de seu imposto sobre heranças e aumentou a alíquota máxima. Com a aplicação a partir de janeiro de 2015, a faixa de isenção será de trinta milhões de ienes e a alíquota máxima será de cinquenta e cinco por cento (55%). Há regras específicas para a sucessão de empreendimentos empresariais.[19]

O Chile possui "imposto sobre herança, legados e doações" com a alíquotas progressivas de 1% a 25%.[20] São isentas de imposto as doações com a única finalidade de beneficência, difusão do ensino e progresso da ciência no país.[21] Determinados bens de raiz (habitação) que se qualifiquem não são gravados pelo imposto.[22][23]

A China ainda não possui imposto sobre herança.[24]

A Suécia decidiu abolir o imposto de herança sob o principal argumento de que representava um empecilho para a manutenção de empreendimentos familiares.[25]

Em Portugal, transmissões gratuitas ficam sujeitas ao imposto do selo com alíquota de 10% (dez por cento) para transmissão causa mortis, doações e usucapião. Há ainda alíquota de 0,8% para determinadas doações[26] qualificadas pela lei (em determinados casos pode haver cumulação das alíquotas de 0,8% e 10%). Entretanto, cônjuge ou companheiro (unido de facto), descendentes e ascendentes, nas transmissões gratuitas de que forem beneficiários, são isentos em relação à verba de 10%.[27]

  • MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Malheiros, São Paulo: 2005.
  • Ernst and Young Global Limited. International Estate and Inheritance Tax Guide, UK: 2013.[28]
  • GRAETZ, Michael J. To Praise the Estate Tax, Not to Bury It, Yale Law School, Faculty Scholarship Series (Paper 1631), Connecticut: 1983.[29]

Notas

  1. Sigla que utiliza todas as iniciais da nomenclatura adotada pelo artigo 155 da Constituição Federal para a espécie, mas em alguns estados a sua nomenclatura ou sigla pode omitir um ou mais termos de acordo com a legislação local (ITD, ICD, ITCD e ITCMD).
  2. Para transmissões onerosas de bens imóveis, confira-se o imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI), de competência dos municípios e do Distrito Federal.
  3. Para saber quem tem direito de herdar, o que é legado, qual é o quinhão que cabe a cada herdeiro, o que é meação, quem pode ser excluído da sucessão, entre outros temas correlatos, consulte Direito das sucessões
  4. O Supremo Tribunal Federal decidiu que a progressividade do ITCMD está de acordo com a Constituição Federal.[5]
  5. Veja o tópico função dos tributos em Tributo
  6. A função extra-fiscal decorre da previsão de não incidência do tributo sobre doações realizadas a partidos políticos, inclusive suas fundações, a entidades sindicais dos trabalhadores, a instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei (artigo 150, inciso IV, alínea c, da Constituição Federal de 1988). Contudo, não é expressiva a arrecadação pelas instituições de educação de doações privadas, a exemplo do que ocorre nos EUA. Exemplo digno de nota ocorreu com a doação da biblioteca Brasiliana USP por José Mindlin à Universidade de São Paulo, embora o prédio que a abriga tenha sido construído com recursos da USP, já que doação impunha tal encargo.
  7. Estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Pará atrelavam suas alíquotas máximas automaticamente à Resolução do Senado Federal, mas tais previsões são tidas como inconstitucionais
  8. Embora sejam tidos como sinônimos, há diferença, pois no inheritance tax o tributo cabe a quem transmite os bens, enquanto que no estate tax cabe a quem os recebe.

Referências

  1. «ITCMD: guia completo e atualizado». Marco Jean de Oliveira Teixeira. 6 de abril de 2022. Consultado em 23 de abril de 2022. Cópia arquivada em 12 de abril de 2022 
  2. «Valor do ITCMD DF». Galvão & Silva Advocacia Escritório de Advogado Brasília DF. 22 de junho de 2018. Consultado em 18 de junho de 2020 
  3. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
  4. Resolução n. 9, de 1992, do Senado Federal - site do Senado Arquivado em 19 de outubro de 2014, no Wayback Machine. ou Resolução n. 9, de 1992, do Senado Federal - site da Imprensa Nacional
  5. «Recurso Extraordinário 562.045/RS» 
  6. «Estate Tax» 
  7. IRS - USA - Annual Inflation Adjustments for 2013
  8. IRS - USA - Various Tax Benefits Increase Due to Inflation Adjustments in 2014
  9. Darien B. Jacobson, Brian G. Raub, and Barry W. Johnson. The Estate Tax: Ninety Years and Counting, pg. 122, Figura D.
  10. IRS - USA - Frequently Asked Questions on Estate Taxes
  11. IRS - USA - SOI - Tax Stats at a Glance
  12. Congress of the United States - Congressional Budget Office - The Estate Tax and Charitable Giving
  13. The Daily Californian - Survey shows increased reliance on private donations to fund public universities
  14. BBC News - Rich Americans back inheritance tax
  15. Any gifts you make to a 'qualifying' charity - during your lifetime or in your will - will be exempt from Inheritance Tax.
  16. «Inheritance Tax» 
  17. «The Manchester University - A gift in your will is not subject to inheritance tax». Consultado em 27 de setembro de 2014. Arquivado do original em 6 de outubro de 2014 
  18. University of Oxford - Gifts to charity are exempt from inheritance tax (IHT) in the UK, and the government provides a further incentive when you leave 10 per cent or more of your net estate to charity
  19. Japan Tax newsletter - Ernest & Young Shinnihon Tax
  20. «Preguntas Frecuentes» 
  21. «Preguntas Frecuentes» 
  22. «Preguntas Frecuentes» 
  23. «Preguntas Frecuentes» 
  24. The Wall Street Journal - Talk of inheritance tax sparks debate in china
  25. Christofer Pihl, Nima Sanandaji. Confederation os Sweden Enterprises - Five years with no inheritance and gift taxes
  26. «Tabela Geral do Imposto do Selo». Consultado em 29 de setembro de 2014. Arquivado do original em 23 de outubro de 2014 
  27. «Folheto Transmissões Gratuitas» (PDF). Consultado em 29 de setembro de 2014. Arquivado do original (PDF) em 30 de maio de 2014 
  28. Ernst and Young Global Limited. International Estate and Inheritance Tax Guide
  29. GRAETZ, Michael J. To Praise the Estate Tax, Not to Bury It, Yale Law School, Faculty Scholarship Series (Paper 1631), Connecticut