Freculfo
Freculfo (em latim: Freculphus Lexoviensis; m. 8 de outubro de 850 ou 852) foi um clérigo, diplomata e historiador franco, aluno da Escola palatina de Aachen durante o reinado de Carlos Magno e bispo de Lisieux entre 824 e sua morte. Atualmente é conhecido principalmente por sua crónica ou história universal, "Doze Livros de Histórias" ("Historiarum libri XII"), uma das principais fontes sobreviventes sobre a cristianização da Gália e a história dos francos. Obras como esta tinham por objetivo apresentar a história do mundo, da Criação até o presente, mas a maior parte das obras históricas dos séculos VIII e IX era de natureza consideravelmente mais local e específica.[1]
Primeiros anos
[editar | editar código-fonte]Nada se sabe sobre as origens de Freculfo, exceto que ele se foi bispo entre 823 ou 825 e sua morte em 8 de outubro de 850 e 852.[2] Foi um aluno do chanceler de Luís, o Piedoso, Elisacar (Helisachar) e se envolveu em várias discussões importantes da época, incluindo a questão da veneração das imagens. Foi descrito como um "homem ocupado e bem conectado".[2] Alguns estudiosos já observaram que Freculfo foi o primeiro escritor medieval a ver o mundo pós-romano como algo diferente. Nas palavras dele:
“ | Os romanos foram expulsos da Itália e o último grande monumento aos cultos estatais romanos se transformaram. Eram romanos, mas eclesiasticamente romanos. Gregório I delineou o caminho e mesmo os gregos reconheceram que Roma era a cabeça de todas as igrejas. Era Católica. O futuro do ocidente estava seguro nas mãoes dos francos e lombardos católicos, os visigodos rejeitaram a heresia e os ingleses estavam prestes a se converter; o que é mais importante, a própria fé foi definitivamente definida. | ” |
— Freculfo[3].
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Enviado ao papa
[editar | editar código-fonte]Freculfo foi enviado por Luís a Roma para negociar com o papa Eugênio II a veneração das imagens em 824, um dos principais pontos de atrito na Igreja na época. O imperador romano do Oriente, Miguel II, se mostrou inicialmente tolerante em relação a elas. Porém, no final de seu reinado, começou a perseguir todos os que as veneravam. Porém, os francos permitiram a veneração - e não adoração - de imagens e Miguel pediu a Luís que convencesse Eugênio II a banir o costume. Luís atendeu e um dos enviados a Roma foi Freculfo. O resultado final foi um fracasso pois Eugênio afirmou que o Segundo Concílio de Niceia (787) já havia decidido que as imagens poderiam ser veneradas (mas não adoradas).[4]
Os "Doze Livros de Histórias"
[editar | editar código-fonte]Uma das mais importantes obras de Freculfo foi "Doze Livros de Histórias", em dois volumes. Depois de escrever a segunda parte, "ele dedicou-a a imperatriz Judite como um presente para o filho dela Carlos".[2] Ele esperava que o livro "permitisse que príncipes se precavessem contra as desvantagens a si próprios e seus súditos".[5] Numa cata a imperatriz, Freculfo a elogia e afirma que Carlos, filho dela, era tão parecido com Carlos Magno que "o avô dele parece não ter morrido e sim, uma vez removida a bruma do sono, iluminado o mundo novamente; de fato sua inteligência, elegância e virtude imortais brilham em seu neto além do nome".[6] Judite encorajava a comparação entre Carlos e Carlos Magno, algo que ele seria lembrado por todo seu reinado e a influência do velho imperador ultrapassaria o reinado de Carlos, o Calvo, como ficaria conhecido.[7] Freculfo também mencionou em seu livro que desejava que Carlos fosse "nosso rei para uma nova era".[8] Como sinal de admiração, Freculfo enviou a Carlos, o Calvo, uma cópia do tratado militar "De re militari" de Vegécio.[9]
A obra de Freculfo, juntamente com a crônica de Ado de Vienne, são os únicos exemplos de crônicas da história do mundo indo até o final do século XII.[10] Foi apenas depois do século XIII que os cronistas se tornaram mais numerosos e esta obra se mostrou um exemplo de quão importante era a tradição para os carolíngios. A Parte Um narra a história da criação do mundo até o nascimento de Jesus Cristo.[2] A Parte Dois avança da encarnação de Jesus até por volta de 600.[2] O texto foca principalmente em temas religiosos, como a conversão dos visigodos ao catolicismo (eram arianos), a admiração a Gregório Magno como "defensor da fé", todos os mártires e todos os seis concílios ecumênicos até então.[2] "O texto, que é geralmente negligenciado pela falta de informações factuais novas de eventos contemporâneos...constrói uma narrativa histórica cujo objetivo é endereçar preocupações correntes através do 'espelho' do passado".[11]
Porém, Freculfo não utilizou dos costumeiros modelos cronológicos ou da "idade do mundo" para organizar sua obra.[3] Ao invés disso, ele organizou-a através da ascensão e queda de potestados, reinos e cultos através da antiguidade pagã, pré-romana e, então, israelita.[3] Ele só mencionou Roma por que o império permitiu a paz e a prosperidade, pavimentando o caminho para a Igreja crescer.
Referências
- ↑ Contreni, John (1995). The Carolingian Renaissance: Education and Literary Culture Volume 2: c.700- c.900. [S.l.]: Cambridge UP
- ↑ a b c d e f Noble, Thomas. Middle Ages Series : Images, Iconoclasm, and the Carolingians. [S.l.]: University of Pennsylvania Press. p. 352
- ↑ a b c Noble, Thomas. Middle Ages Series : Images, Iconoclasm, and the Carolingians. [S.l.]: University of Pennsylvania Press. p. 353
- ↑ Davis, Raymond (1995). The Lives of the Ninth-century Popes (Liber Pontificalis) 16:37. [S.l.]: Liverpool UP
- ↑ Lozovsky, Natalia. Roman Geography and Ethnography in the Carolingian Empire 81:359. [S.l.]: Medieval Academy of America
- ↑ Freculf (c. 829). Epistolæ: Letter sent by Freculf, bishop of Lisieux to Empress Judith of Bavaria. [S.l.: s.n.]
- ↑ Dutton, Paul (1994). The Politics of Dreaming in the Carolingian Empire. [S.l.]: University of Nebraska Press. p. 14
- ↑ McKitterick, Rosamund (1994). Carolingian Culture: Emulation and Innovation. [S.l.]: Cambridge UP. p. 213. Consultado em 30 de agosto de 2014. Arquivado do original em 13 de novembro de 2013
- ↑ J. L. Nelson, Charles the Bald (Longman, 1992), p. 84.
- ↑ Saurette, Marc (2005–2006). «Tracing the Twelfth-Century Chronica of Richard of Cluny (Draft)». Academia.edu. Consultado em 21 de outubro de 2013
- ↑ Allen, Michael (1994). History in the Carolingian renewal: Frechulf of Lisieux (fl. 830), his work and influence. Canada: University of Toronto Press. p. ii
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Natumewicz, C. F. "Freculphus of Lisieux, His Chronicle and a Mont Saint-Michel Manuscript." Horae Eruditae et Codices sancti Michaelis de periculo maris, 90-134. Steenbrugge: 1966. HS 90-1800 Multiple authors: Michaud-Quantin P., Cordoliani A., Mathieu M., Jeauneau E., Natunewicz Ch.-F., Preaux J. & Schneyer J.B. [1]
- Frechulfi Lexouiensis episcopi Opera omnia. Ed. Michael I. Allen. 2 vols. (1. Prolegomena – Indices; 2. Textus). Corpus Christianorum, Continuatio Mediaeualis 169–169A. Turnhout: Brepols, 2002.
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Freculfo. Migne, ed. Patrologia Latina 🔗. Opera Omnia (em latim). [S.l.: s.n.]