Itália Fascista
Itália fascista Itália fascista | |||||
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Hino nacional Marcia Reale
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Expansão máxima do domínio italiano até 1940. | |||||
Continente | Europa | ||||
Capital | Roma | ||||
Língua oficial | Italiano | ||||
Governo | Ditadura fascista | ||||
Rei da Itália | |||||
• 1900-1946 | Vítor Emanuel III | ||||
Primeiro-ministro | |||||
• 1922-1943 | Benito Mussolini | ||||
• 1943 | Pietro Badoglio | ||||
Período histórico | Segunda Guerra Mundial | ||||
• 23 de setembro de 1922 | Marcha sobre Roma | ||||
• 8 de setembro de 1943 | Armistício de Cassibile | ||||
População | |||||
• 1936 est. | 42 943 602 | ||||
Moeda | Lira italiana | ||||
Membro de: Forças do Eixo (1940-1943) |
A Itália fascista, também denominada como regime de Mussolini, ditadura de Benito Mussolini ou ditadura fascista, é o período da história da Itália do governo do Duce Benito Mussolini e do desenvolvimento do fascismo. O fascismo foi um movimento político autoritário do século XX que surgiu no Reino de Itália após a Primeira Guerra Mundial. Nasceu em parte como reação à Revolução Russa de 1917 e às fortes lutas dos trabalhadores e seus sindicatos, culminando no biennio rosso, e em parte pela controvérsia sobre a sociedade liberal-democrática que emergiu a partir da experiência da Primeira Guerra Mundial.[1]
A palavra fascismo tem origem na palavra latina fasces, e na italiana fascio que significam "feixe". O feixe de lenha amarrado (feixe lictório) foi um símbolo muito usado na Roma Antiga. Simbolizava a força na união, segundo a metáfora de que um galho sozinho pode ser quebrado, porém unidos tornam-se bem resistentes. Benito Mussolini resgatou esse símbolo ao fundar o Partido Nacional Fascista em 1921. O símbolo desse partido era o feixe de lenha com um machado, tendo de pano de fundo as cores da bandeira italiana.
História
[editar | editar código-fonte]Origem
[editar | editar código-fonte]Mussolini fundou o movimento fascista em 23 de março de 1919, numa reunião feita na cidade de Milão. Entre os membros fundadores estavam os líderes revolucionários sindicalistas Agostino Lanzillo e Michele Bianchi. Em 1921, os fascistas passaram a desenvolver um programa que exigia a república, a separação da Igreja do Estado, um exército nacional, um imposto progressivo para heranças e o desenvolvimento de cooperativas.
O estado fascista de Mussolini foi estabelecido aproximadamente uma década antes da chegada de Hitler ao poder na Alemanha. Tanto um movimento como um fenômeno histórico, o fascismo italiano foi, em muitos aspectos, uma reação à falha aparente do laissez-faire e ao medo dos movimentos de esquerda, apesar de que as circunstâncias na história intelectual devem ser consideradas, como o abalo do positivismo e o fatalismo generalizado do pós-guerra na Europa. Apesar de na prática, o fascismo italiano tenha privatizado uma série de empresas e os proprietários das empresas serem livres para organizar a produção como quisessem, a sua atividade no mercado foi objeto de forte controle estatal, na verdade a privatização não reduziu significativamente a intervenção do Estado na economia.[2][3]
O fascismo foi de certa forma o resultado de um sentimento geral de ansiedade e medo dentro da classe média na Itália do pós-guerra, que surgiu no seguimento da convergência de pressões inter-relacionadas de ordem econômica, política e cultural. Sob o estandarte desta ideologia autoritária e nacionalista, Mussolini foi capaz de explorar os medos perante o capitalismo numa era de depressão pós-guerra, a ascensão cada vez mais rápida de uma esquerda mais revolucionária, e um sentimento de vergonha nacional e de humilhação que resultaram da "vitória mutilada" da Itália nos tratados de paz pós Primeira Guerra Mundial. Tais aspirações nacionalistas não realizadas (ou frustradas) manchavam a reputação do liberalismo e do constitucionalismo entre muitos setores da população italiana. Adicionalmente, tais instituições democráticas nunca cresceram ao ponto de se tornarem firmemente enraizadas na nova nação-estado.
À medida que essa mesma depressão do pós-guerra fez crescer a sedução pelo comunismo entre o proletariado urbano, ainda mais desprovido de direitos do que os seus contrapartes no continente, o receio relativamente à força crescente do sindicalismo, o comunismo e o socialismo proliferaram entre a elite e a classe média. De certa forma, Benito Mussolini preenchia um vácuo político. O fascismo emergiu como uma "terceira via" — como a última esperança da Itália para evitar o colapso iminente do "fraco" liberalismo italiano, e a revolução comunista.
Ao mesmo tempo que falhava em delinear um programa coerente, o fascismo evoluiu para um novo sistema político e econômico que combinava o corporativismo, o totalitarismo, nacionalismo, e anticomunismo num estado desenhado por forma a unir todas as classes num sistema capitalista, mas um novo sistema capitalista no qual o estado detinha o controlo da organização de indústrias vitais. Sob a bandeira do nacionalismo e poder estatal, o fascismo parecia sintetizar o glorioso passado romano com uma utopia futurista.
A sedução pelo movimento, a promessa de um capitalismo mais ordenado após uma era de depressão econômica do pós-guerra, no entanto, não se confinava à Itália ou mesmo à Europa. Por exemplo, uma década mais tarde, quando a Grande Depressão originou uma queda da economia brasileira, uma espécie de protofascismo iria emergir como reação aos problemas socioeconômicos, e consciência nacionalista do estatuto periférico da economia do Brasil. O regime de Getúlio Vargas adotou uma extensa influência fascista com a Constituição do Estado Novo, redigida por Francisco Campos, eminente jurista filiado ao Partido Fascista Brasileiro.
Partido e manifesto fascista
[editar | editar código-fonte]Fundado como uma associação nacionalista (Fasci di Combattimento) de veteranos da Primeira Guerra Mundial em Milão a 23 de março de 1919, o movimento fascista de Mussolini converteu-se num partido nacional (o Partido Nacional Fascista) após ter ganho 35 assentos nas eleições ao parlamento de maio de 1921. Inicialmente tendo elementos ideológicos da direita,[4] ele alinhava pelas forças conservadoras pela sua oposição às ocupações a fábricas italianas de setembro de 1920.
Apesar dos temas da reforma social e econômica no Manifesto Fascista inicial de junho de 1919, o movimento foi apoiado por seções da classe média, receosos do socialismo e do comunismo, enquanto industriais e donos de terra viram-no como uma defesa contra a militância trabalhista. Sob a ameaça de uma "Marcha sobre Roma fascista", Mussolini assumiu em outubro de 1922 a liderança de um governo de coligação de direita incluindo inicialmente membros do partido popular, pró-Igreja.
Em 28 de outubro de 1922, as milícias fascistas iniciam a Marcha sobre Roma, promovendo uma passeata de cerca de 50 mil fascistas em Roma. Pressionado, o rei Vítor Emanuel III convoca Mussolini para chefiar o governo em uma Itália que atravessa uma grave crise econômica e financeira, marcada por uma elevada inflação, agravada por grande agitação social, com greves e manifestações de trabalhadores urbanos e rurais.
Consolidação
[editar | editar código-fonte]O regime de Mussolini pode ser dividido em duas fases:
- Consolidação do Fascismo (1922 a 1924) — Benito Mussolini governa de forma conciliatória, não se sobrepondo ao poder do rei Vítor Emanuel III. Paralelamente, fortalece as organizações fascistas com a fundação das Milícias de Voluntários para a Segurança Nacional, também denominado "Camisas negras". Utilizando todos os métodos possíveis, inclusive da fraude eleitoral, os fascistas garantiram a vitória do Partido nas eleições parlamentares em abril de 1924;
- Ditadura Fascista (1925 a 1943) — Entre 1925 e 1926, com o apoio do rei, dos empresários e do Exército, Mussolini promove uma ampla perseguição política, impondo o Partido Nacional Fascista como partido único, e iniciando a ditadura fascista. Os sindicatos dos trabalhadores passam a ser controlados pelo Estado; é criado um tribunal especial para julgar crimes considerados ofensivos à segurança do Estado; a censura é instaurada; os partidos de oposição são dissolvidos; milhares de pessoas são presas e outras expulsas do país. A OVRA, a polícia secreta fascista, utiliza os mais terríveis tipos de violência na perseguição aos opositores.
A transição para uma ditadura assumida foi mais gradual do que na Alemanha uma década mais tarde. Apesar de, em julho de 1923, uma nova lei eleitoral ter dificultado a constituição de uma maioria parlamentar fascista, o assassínio do deputado socialista Giacomo Matteotti, onze meses mais tarde, mostrou os limites da oposição política. Em 1926 os movimentos de oposição tinham sido declarados ilegais, e em 1928 a eleição ao parlamento era restrita a apenas candidatos aprovados pelos fascistas.
Entre 1926 e 1932, estudos publicados no pós-guerra mostram que os tribunais especiais para julgamento de crimes políticos decretaram sete condenações à pena de morte, 257 a penas de dez ou mais anos de prisão, 1.360 a penas de prisão mais brandas, além das condenações ao exílio, não quantificadas.[5]
O feito político mais duradouro deste regime foi talvez o Tratado de Latrão de fevereiro de 1929 entre o Estado italiano e a Santa Sé, pelo qual ao Papa foi concedida a soberania sobre a Cidade do Vaticano e recebeu a garantia do livre exercício do catolicismo como a única religião do estado em toda a Itália em retorno da sua aceitação da soberania italiana sobre os anteriores domínios do Papa. Os sindicatos e associações de trabalhadores foram reorganizados em 1934 em 22 corporações fascistas combinando trabalhadores e empregadores por setor econômico, cujos representantes em 1938 substituíram o parlamento como a "Câmara de Corporações". O poder continuava investido no Grande Conselho Fascista, o corpo governativo do movimento. Nos anos 1930, a Itália se recuperava da Grande Depressão, e obtinha o crescimento econômico em parte pela substituição de importações pela produção doméstica (Autarchia).
A drenagem dos pântanos de Pontine a sul de Roma, empestados de malária, foi um dos orgulhos badalados do regime. Mas o crescimento foi minado pelas sanções internacionais impostas à Itália no seguimento da invasão da Etiópia em outubro de 1935 (a Segunda Guerra Ítalo-Etíope), e pelo forte esforço financeiro que o governo fez para apoiar militarmente os nacionalistas de Franco na Guerra Civil Espanhola. O isolamento internacional e o seu envolvimento comum na Espanha vão fazer ressaltar uma crescente colaboração diplomática entre a Itália e a Alemanha Nazi. Isto fez-se refletir também nas políticas domésticas do regime fascista italiano, sendo as primeiras leis anti-semitas passadas em 1938.
Colapso
[editar | editar código-fonte]A intervenção da Itália (com início em 10 de junho de 1940) na Segunda Guerra Mundial como aliado da Alemanha trouxe o desastre militar e resultou na perda das colónias no norte e leste africanos bem como a invasão americano-britânica da Sicília em julho de 1943 e o sul de Itália em setembro de 1943.
Mussolini foi demitido como primeiro-ministro pelo rei Vítor Emanuel III da Itália a 25 de julho de 1943, e subsequentemente preso. Foi libertado em setembro por paraquedistas alemães e instalado como chefe de uma "República Social Italiana" fantoche em Salo, no norte da Itália, então ocupado pela Alemanha. Sua política econômica é a socialização. A sua associação com o regime de ocupação alemão erodiu muito do pouco apoio que lhe restava. A sua execução sumária em 28 de abril de 1945 por guerrilheiros, durante uma fase final da guerra particularmente violenta, foi vista por muitos observadores então como o final apropriado para o seu regime.
Após a guerra, os resquícios do fascismo italiano reagruparam-se largamente sob a égide do "Movimento Social Italiano" (MSI) neofascista. O MSI coligou-se em 1994 com a antiga "Democracia Cristã" conservadora para formar a Aliança Nacional (AN), que proclama o seu compromisso com o constitucionalismo, o governo parlamentar e pluralismo político.
Doutrina política e social
[editar | editar código-fonte]Na segunda parte do texto, acerca da "Doutrina Política e Social"[6] do fascismo, Mussolini começa por traçar o itinerário do seu pensamento e ação. Ponto de partida, o Socialismo; ponto de chegada, o fascismo. Até ao inverno de 1914, Mussolini é um socialista. Em 1919, quando são lançados os fasci em Milão, não têm uma doutrina, mas têm um programa e, sobretudo, têm a "fé". Rejeitam o socialismo reformista de Eduard Bernstein, integrando a "esquerda revolucionária" que privilegia a "doutrina da acção". Depois da guerra, o Socialismo reformista estaria já morto como doutrina. Nessa altura, com as expedições punitivas da Itália decorrendo em pano de fundo, os fasci estavam confrontados com várias forças políticas — "liberais, democratas, socialistas, maçons, e com o Partito Popolare" —, e respectivas doutrinas. Isto enquanto enfrentavam vários problemas; como o da relação entre o indivíduo e do Estado; o da relação entre autoridade e liberdade; e o problema nacional italiano.
Entre a Marcha sobre Roma (outubro de 1922) e os anos 1926, 1927, e 1928, o fascismo foi sendo espelhado nas leis e instituições do regime fascista. A doutrina do fascismo é apresentada por Mussolini como um produto do seu exercício do poder na Itália dos anos 1920. Em 1932, por fim, o fascismo estaria já definido como regime e como doutrina.
Neste texto, em 1932, Mussolini começa por negar três ideias-chave:
- O pacifismo;
- O internacionalismo;
- A equação "bem-estar = felicidade".
Mas nega também três doutrinas políticas modernas que lhe são anteriores: o socialismo, o liberalismo e a democracia.
Estas doutrinas têm a sua própria história, que Mussolini enuncia com brevidade: do socialismo utópico (Charles Fourier, Robert Owen, Conde de Saint-Simon) saíra o socialismo científico de Karl Marx; do Iluminismo do século XVIII saíra o liberalismo do século XIX; do enciclopedismo saíra a doutrina democrática. Cada uma dessas doutrinas terá chegado ao século XX, superando as respectivas origens em resposta a novas necessidades.
Segundo Mussolini, o fascismo estaria agora a abrir uma nova época realizando uma síntese doutrinária que a todas superaria. Encontrara um campo de doutrinas em ruína, a partir das quais construíra um novo edifício:
"O fascismo, das ruínas das doutrinas liberal, socialista, e democrática, extrai aqueles elementos que têm ainda um valor de vida."[nota 1]
Diz-nos pouco acerca do que aproveita, mas esclarece o que rejeita. O fascismo, segundo Mussolini, do socialismo científico rejeita o materialismo histórico (determinismo económico) e o conceito de luta de classes; do liberalismo, recusa a economia e a política, e tanto por razões doutrinárias como por razões históricas (a Itália sofrera a derrocada sob o liberalismo); da democracia, recusa o sufrágio universal que "dá ao povo a ilusão de ser soberano, enquanto a verdadeira e efectiva soberania está noutras forças irresponsáveis e secretas".[nota 2] Até 1922, o fascismo fora republicano; o dilema república ou monarquia estaria porém já ultrapassado. Uma invocação histórica justifica o argumento, fazendo-nos pensar uma vez mais em Giuseppe Mazzini: "A República Romana foi morta por uma República irmã, a da França".
O fascismo de Mussolini vinha colocar uma concepção da "vida como luta" no centro da sua doutrina; afirma-se "pragmático", no seu desejo de poder, desejo de viver, na sua atitude face à violência, na afirmação da violência como valor. "Activismo, quer dizer nacionalismo, futurismo, fascismo." Para Mussolini, assim como o século XIX fora o século do indivíduo, o século XX seria o século do Estado. Foram referidas acima as ideias essenciais da sua doutrina do Estado. Mas falta citar a "iluminação pré-fascista" de Ernest Renan, que a teria motivado:
"A razão, a ciência — dizia Renan, que teve uma iluminação pré-fascista numa das suas Meditações filosóficas — são produtos da humanidade, mas querer a razão directamente pelo povo e através do povo é uma quimera. Não é necessário pela existência da razão que todo o mundo a conheça. Em todo o caso se tal iniciação se devesse fazer não seria feita através da baixa democracia, que parece conduzir à extinção da alta cultura, e da mais elevada disciplina. O princípio de que a sociedade existe somente para o bem-estar e a liberdade dos indivíduos que a compõem não parece estar em conformidade com os planos da natureza, planos nos quais a espécie só é tomada em consideração e o indivíduo parece sacrificado. É de temer fortemente que a última palavra da democracia assim entendida (…) não seja um estado social no qual uma massa degenerada não teria outra preocupação que gozar os ignóbeis prazeres do homem vulgar."
O último parágrafo do texto explica a razão de ser da sua doutrina: o Estado fascista é uma vontade de potência e de império. A tradição romana é aqui uma ideia de força.[nota 3]
Benito Mussolini, num discurso proferido na Câmara dos Deputados no dia 26 de maio de 1927, disse uma frase que define concisamente a ideologia do fascismo: "Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado".[nota 4][7][8] Em 1928, na "Autobiografia" ditada a Richard Washburn Child, Mussolini disse que estudou muito o risorgimento e o desenvolvimento da vida intelectual italiana depois de 1870, que "meditou muito com os pensadores alemães", que admirava os franceses, e que um dos livros que mais o tinha interessado fora "A Psicologia das Multidões" de Gustave Le Bon. Colocando-se o problema da revolução, Mussolini rejeitava o bolchevismo, e que, a ser realizada uma revolução em Itália, esta deveria ser "tipicamente italiana", firmando-se "nas dimensões magnificentes das ideias de Giuseppe Mazzini e com o espírito de Carlo Pisacane".[9]
Mais tarde, num artigo da Enciclopedia Italiana, de 1931,[10] escrito por Giovanni Gentile e Benito Mussolini, o fascismo é, além de explicitado nas suas principais linhas filosóficas, descrito como uma doutrina cujo "fundamento é a concepção do Estado, da sua essência, das suas competências, da sua finalidade. Para o fascismo o Estado é um absoluto, perante o qual indivíduos e grupos são o relativo. Indivíduos e grupos são "pensáveis" enquanto estejam no Estado".[nota 5] Nesse texto, Mussolini identifica, "no grande rio do fascismo", as correntes que nele vão desaguar e que terão as suas fontes em Georges Sorel, Charles Péguy e Hubert Lagardelle, do Movimento Socialista, e nos sindicalistas italianos, que, entre 1904 e 1914, teriam trazido um novo tom ao ambiente do socialismo italiano — Angelo Oliviero Olivetti da Pagine Libere, Paolo Orano, de La Lupa e Enrico Leone, de Divenire sociale.
Em 1932, Mussolini diz que o fascismo terá recebido muitas influências, mas que estas não constituíram o fascismo: "um partido que governa totalitariamente uma nação, é um fato novo na história".[nota 6] E acrescenta que "não há pontos de referência ou de comparação" com os seus antecessores. No entanto, Mussolini diz também no mesmo texto que o francês Ernest Renan teve "iluminações pré-fascistas"[nota 7] e que o fascismo fez seu o duplo conselho de Mazzini: "Pensamento e Acção".[11]
Entre os antecessores, em 1932, "Renan e Mazzini são afinal os únicos autores a quem Mussolini aceita pagar algum tributo intelectual." Com estas ressalvas, Mussolini insiste no entanto em proclamar a "novidade do fascismo", apresentando, em apêndice (edição de 1935), as referências que remetem para os seus próprios discursos e textos.[12] Mussolini diz-nos também neste texto o que o fascismo não é. O fascismo não se filia no pensamento contrarrevolucionário: Mussolini não toma "Joseph de Maistre como seu profeta"; Mussolini diz que o fascismo respeita a Igreja mas recusa a sua religião, a "eclesiolatria",[nota 8] como lhe chama.
Ideias fundamentais
[editar | editar código-fonte]Sob o título "ideias fundamentais", os assuntos surgem distribuídos por 13 parágrafos, mas com as notas arrumadas no anexo em 11 títulos:[6]
- 1. Concepção filosófica. Apresenta o fascismo como ação (prática) e pensamento (ideia) político. Considera que toda a ação é contingente ao espaço e ao tempo, havendo no seu pensamento um "conteúdo ideal que a eleva a fórmula de verdade na história superior do pensamento".[nota 9] Diz que "para se conhecer os homens é preciso conhecer o homem; e para conhecer o homem é preciso conhecer a realidade e as suas leis";[nota 10] não há um conceito de Estado que não seja uma concepção da vida e do mundo;
- 2. Concepção espiritual. É a partir de uma "concepção espiritual" que o homem é definido pelo fascismo. Na sua concepção, o homem é um "indivíduo que é nação e pátria";[nota 11] há, na sua perspectiva, "uma lei moral que liga os indivíduos e as gerações numa tradição e numa missão";[nota 12]
- 3. Concepção positiva da vida como luta. A sua "concepção espiritual" define-se por oposição ao materialismo filosófico do século XVIII; sendo antipositivista, é porém positiva ([nota 13]); não é céptica, nem agnóstica, nem pessimista.[nota 14] Pretende o homem activo e impregnado na acção com toda a sua energia. O que se aplica ao indivíduo, aplica-se à nação;
- 4. Concepção ética. Tem uma concepção ética da vida, "séria, austera, religiosa";[nota 15] o fascismo desdenha a vida "cômoda";
- 5. Concepção religiosa. O homem é visto numa relação imanente com uma lei superior, com uma Vontade objectiva que transcende o indivíduo particular e o eleva a membro de uma sociedade espiritual;[nota 16]
- 6. Concepção histórica e realista. O homem é visto como um ser na história, num fluxo contínuo em processo de evolução; tem no entanto uma visão "realista", não partilhando o optimismo do materialismo filosófico do século XVIII que via o homem a caminho da "felicidade" na terra;
- 7. O indivíduo e a liberdade. A concepção fascista é definida como "anti-individualista", colocando o Estado antes do indivíduo;[nota 17] o liberalismo negou o Estado no interesse dos indivíduos particulares, o fascismo reafirma o Estado como a verdadeira realidade do indivíduo.[nota 18] Para o fascismo, tudo está no Estado — a sua concepção é totalitária.[nota 19] Para o fascismo, fora do Estado não há valores humanos ou espirituais;
- 8. Concepção do Estado corporativo. "Não há indivíduos fora do Estado, nem grupos (partidos políticos, associações, sindicatos, classes)";[nota 20] defende um corporativismo no qual os interesses são conciliados na unidade do Estado;[nota 21] diz-se contrário ao socialismo que reduz o movimento histórico à luta de classes e, analogamente, é também contrário ao sindicalismo;
- 9. Democracia. O fascismo opõe-se à democracia que entende a nação como a maioria, descendo o seu nível ao maior número; o fascismo considera-se no entanto como "a mais pura forma de democracia se o povo for considerado do ponto de vista da qualidade em vez da quantidade", como uma "multidão unificada por uma ideia, que é vontade de existência e de potência: consciência de si, personalidade".[nota 22] O fascismo defende "uma democracia organizada, centralizada, autoritária", exercida através do partido único;
- 10. Concepção do Estado. Para o fascismo a nação não cria o Estado; é o Estado que cria a nação. Considera o Estado como a expressão de uma "vontade ética universal", criadora do direito, e "realidade ética". Na sua concepção é o Estado "que dá ao povo unidade moral, uma vontade, e portanto uma efectiva existência";[nota 23]
- 11. Realidade dinâmica. Na concepção fascista o Estado deve ser o educador e o promotor da vida espiritual. Para alcançar o seu objetivo, quer refazer não a forma da vida humana, mas o conteúdo, o homem, o carácter, a fé.[nota 24]
A filosofia do fascismo, tal como a definiu Mussolini, é assim uma filosofia essencialmente moderna e modernista.
Definição
[editar | editar código-fonte]- Umberto Eco
Assim Umberto Eco descreve o fascismo italiano:[13]
- O culto da tradição. "Basta olhar para o programa de cada movimento fascista para encontrar os principais pensadores tradicionalistas. A gnose nazista foi nutrida por elementos tradicionalistas, sincretistas e ocultistas."
- A rejeição do modernismo. "O Iluminismo, a Era da Razão, é visto como o início da depravação moderna. Nesse sentido, Ur-Fascismo pode ser definido como irracionalismo."
- O culto da ação pela ação. "A ação, sendo bonita em si, deve ser tomada antes, ou sem, qualquer reflexão anterior. Pensar é uma forma de emasculação."
- Desacordo é traição. "O espírito crítico faz distinções, e distinguir é um sinal do modernismo. Na cultura moderna, a comunidade científica elogia o desacordo como uma forma de melhorar o conhecimento".
- Medo da diferença. "O primeiro apelo de um movimento fascista ou prematuramente fascista é um apelo contra os intrusos. Assim, Ur-Fascismo é racista por definição".
- Apelo à frustração social. "Uma das características mais típicas do fascismo histórico foi o apelo a uma classe média frustrada, uma classe que sofre de uma crise econômica ou sentimentos de humilhação política e assustada pela pressão dos grupos sociais mais baixos".
- A obsessão com um enredo. "Os seguidores devem se sentir sitiados. A maneira mais fácil de resolver o enredo é o apelo à xenofobia."
- O inimigo é forte e fraco. "Por uma mudança contínua do foco retórico, os inimigos são ao mesmo tempo demasiado fortes e demasiado fracos."
- O pacifismo está trabalhando com o inimigo. "Para um Ur-Fascista não há luta pela vida, mas a vida é vivida pela luta".
- Desprezo pelos fracos. "O elitismo é um aspecto típico de qualquer ideologia reacionária".
- Todo mundo é educado para se tornar um herói. "Na ideologia Ur-Fascista, o heroísmo é a norma. Esse culto ao heroísmo está estritamente ligado ao culto da morte".
- Machismo e armamento. "O machismo implica desdém para as mulheres e intolerância e condenação de hábitos sexuais não padronizados, da castidade à homossexualidade".
- Populismo seletivo. "Há no nosso futuro um populismo de TV ou Internet, no qual a resposta emocional de um grupo selecionado de cidadãos pode ser apresentada e aceita como a Voz do Povo".
- Ur-Fascismo é simplista e proselitista. "Todos os livros didáticos nazistas ou fascistas usavam um vocabulário empobrecido e uma sintaxe elementar, a fim de limitar os instrumentos para o raciocínio complexo e crítico".
- Naomi Wolf
A Naomi Wolf descreve o fascismo em sociedades ocidentais inicialmente democráticas:[14]
- Invocar um terrível inimigo interno e externo
- Crie um gulag
- Desenvolver uma casta de bandidos
- Criar um sistema de vigilância interna
- Acossar grupos de cidadãos
- Envolver-se em detenção e liberação arbitrárias
- Criar bodes expiatórios
- Controlar a imprensa
- Fazer equivalência entre dissidência e traição
- Colocar as garantias legais em suspenso
- Paxton
São estes os 15 aspectos do fascismo segundo ele:[15]
- Ataque aberto à democracia
- Apelo a um homem forte
- Desprezo pela fraqueza humana
- Obsessão com a hiper-masculinidade
- Militarismo agressivo
- Apelo à grandeza nacional
- Desdém pelo feminino
- Investimento na linguagem da cultura declinante
- Desprezo dos direitos humanos
- Supressão da dissensão
- Propensão à violência
- Desprezo pelos intelectuais
- Ódio à razão
- Fantasias de superioridade racial
- Políticas eliminacionistas voltadas para a "limpeza social"
- Laurence W. Britt
São estes 14 aspectos que gestaram uma influência mais ampla do fascismo italiano no mundo:[16]
- Uso amplo do discurso nacionalista
- Desprezo pelos direitos humanos
- Uso de bodes expiatórios como causas únicas de problemas
- Supremacia do militarismo
- Sexismo exacerbado
- Mídia de massa controlada
- Obsessão com a segurança nacional
- Ligação entre Estado e religião
- Propriedades privadas das grandes empresas protegidas
- Associação de trabalhadores suprimida
- Supressão da intelectualidade e das artes
- Obsessão por crime e castigo
- Corrupção exacerbada
- Eleições fraudulentas
Ver também
[editar | editar código-fonte]Notas e referências
Notas
- ↑ Il fascismo dalle macerie delle dottrine liberali, socialistiche, democratiche, trae quegli elementi che hanno ancora un valore di vita
- ↑ dà al popolo l'illusione di essere sovrano, mentre la vera effettiva sovranità sta in altre forze talora irresponsabili e segrete
- ↑ Lo Stato fascista è una volontà di potenza e d'imperio. La tradizione romana è qui un'idea di forza
- ↑ Tutto nello Stato, niente al di fuori dello Stato, nulla contro lo Stato
- ↑ Caposaldo della dottrina fascista è la concezione dello Stato, della sua essenza, dei suoi compiti, delle sue finalità. Per il fascismo lo Stato è un assoluto, davanti al quale individui e gruppi sono il relativo. Individui e gruppi sono «pensabili» in quanto siano nello Stato
- ↑ Un partito che governa totalitariamente una nazione, è un fatto nuovo nella storia
- ↑ Renan, che ebbe delle illuminazioni prefasciste"
- ↑ ecclesiolatria
- ↑ un contenuto ideale che la eleva a formula di verità nella storia superiore del pensiero
- ↑ Per conoscere gli uomini bisogna conoscere l'uomo; e per conoscere l'uomo bisogna conoscere la realtà e le sue leggi
- ↑ L'uomo del fascismo è indivíduo che è nazione e patria
- ↑ legge morale che stringe insieme individui e generazioni in una tradizione e in una missione
- ↑ antipositivistica, ma positiva
- ↑ non scettica, né agnostica, né pessimistica
- ↑ tutta librata in un mondo sorretto dalle forze morali e responsabili dello spirito
- ↑ l'uomo è veduto nel suo immanente rapporto con una legge superiore, con una Volontà obiettiva che trascende l'indivíduo particolare e lo eleva a membro consapevole di una società spirituale
- ↑ Antiindividualistica, la concezione fascista è per lo Stato
- ↑ Il liberalismo negava lo Stato nell'interesse dell'indivíduo particolare; il fascismo riafferma lo Stato come la realtà vera dell'indivíduo
- ↑ per il fascista, tutto è nello Stato, e nulla di umano o spirituale esiste, e tanto meno ha valore, fuori dello Stato. In tal senso il fascismo è totalitario, e lo Stato fascista, sintesi e unità di ogni valore, interpreta, sviluppa e potenzia tutta la vita del popolo
- ↑ Né individui fuori dello Stato, né gruppi (partiti politici, associazioni, sindacati, classi)
- ↑ nel sistema corporativo degli interessi conciliati nell'unità dello Stato
- ↑ moltitudine unificata da un'idea, che è volontà di esistenza e di potenza: coscienza di sé, personalità
- ↑ che dà al popolo, consapevole della propria unità morale, una volontà, e quindi un'effettiva esistenza
- ↑ Vuol rifare non le forme della vita umana, ma il contenuto, l'uomo, il carattere, la fede
Referências
- ↑ «Recruited by MI5: the name's Mussolini. Benito Mussolini». the Guardian (em inglês). 13 de outubro de 2009. Consultado em 23 de novembro de 2022
- ↑ «FROM PUBLIC TO PRIVATE:PRIVATIZATION IN 1920'S FASCIST ITALY» (PDF). European University Institute. Consultado em 4 de janeiro de 2014
- ↑ «THE FIRST PRIVATIZATION: SELLING SOEs AND PRIVATIZING PUBLIC MONOPOLIES IN FASCIST ITALY (1922-1925)» (PDF). Universitat de Barcelona (GiM-IREA) & Barcelona Graduate School of Economics. Consultado em 4 de janeiro de 2014
- ↑ States, John Bellamy FosterTopics: Fascism Movements Philosophy Political Economy State Repression Places: Americas United (1 de abril de 2017). «Monthly Review | Neofascism in the White House». Monthly Review (em inglês). Consultado em 23 de novembro de 2022
- ↑ Kohn-Bramstedt, E. (1945). Dictatorship and political police. the technique of control by fear (em inglês). Londres: [s.n.] p. 51 ss Os números citados e a referência à obra mencionada foram obtidos em Arendt, Hannah (2012). «Uma sociedade sem classes». Origens do totalitarismo. antissemitismo, imperialismo, totalitarismo. São Paulo: Companhia de Bolso. p. 717
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- ↑ «La Dottrina del fascismo». Arquivado do original em 10 de maio de 2006
- ↑ Nas notas à edição de 1935, Mussolini cita a Carta de Mazzini para Michele Bianchi, escrito em 27 de Agosto de 1921, para a abertura da Escola de Cultura e Propaganda Fascista em Milão, in Messaggi e Proclami, Milão, Libreria d'Italia, 1929, p. 39)
- ↑ «(edição com o apêndice, en)»
- ↑ Umberto Eco Makes a List of the 14 Common Features of Fascism
- ↑ «Naomi Wolf: Fascist America, in 10 easy steps». the Guardian (em inglês). 24 de abril de 2007. Consultado em 23 de novembro de 2022
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