Maria Leopoldina da Áustria

rainha consorte de Portugal e imperatriz consorte do Brasil (1797–1826)
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Maria Leopoldina da Áustria (nascida Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda, em alemão: Caroline Josepha Leopoldine Fernanda Francisca; Viena, 22 de janeiro de 1797Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 1826), foi uma arquiduquesa da Áustria, a primeira esposa do Imperador Pedro I e Imperatriz Consorte do Brasil de 1822 até sua morte, também brevemente sendo Rainha Consorte de Portugal e Algarves entre março e maio de 1826. Era filha do imperador Francisco I da Áustria e de sua segunda esposa, a princesa Maria Teresa de Nápoles e Sícilia. Também foi cunhada do imperador Napoleão Bonaparte, casado com sua irmã mais velha, Maria Luísa. Seu casamento com Pedro I e sequente independência do Brasil[3] fizeram com que se tornasse a primeira imperatriz consorte do país e a primeira Imperatriz do Novo Mundo.[4][5][6][7][8][9][10]

Maria Leopoldina
Maria Leopoldina da Áustria
Retrato por Joseph Kreutzinger, 1815.
Imperatriz Consorte do Brasil
Reinado 12 de outubro de 1822
a 11 de dezembro de 1826
Sucessora Amélia de Leuchtenberg
Rainha Consorte de Portugal e Algarves
Reinado 10 de março de 1826
a 2 de maio de 1826
Predecessora Carlota Joaquina da Espanha
Sucessor(a) Augusto de Beauharnais
Nascimento 22 de janeiro de 1797
  Palácio de Hofburg, Viena, Áustria, Sacro Império Romano-Germânico
Morte 11 de dezembro de 1826 (29 anos)
  Palácio de São Cristóvão, Rio de Janeiro, Brasil
Sepultado em Cripta Imperial, Monumento à Independência, São Paulo, Brasil
Nome completo  
Carolina Josefa Leopoldina Fernanda Francisca de Habsburgo-Lorena[1][2]
Marido Pedro I do Brasil & IV de Portugal
Descendência Maria II de Portugal
Miguel de Portugal
João Carlos, Príncipe da Beira
Januária do Brasil
Paula do Brasil
Francisca do Brasil
Pedro II do Brasil
Casa Habsburgo-Lorena (por nascimento)
Bragança (por casamento)
Pai Francisco I da Áustria
Mãe Maria Teresa de Nápoles e Sicília
Religião Catolicismo
Assinatura Assinatura de Maria Leopoldina
Brasão

A educação que Leopoldina recebera em infância e adolescência era eclética e ampla, de nível cultural superior e formação política mais consistente. Tal educação dos pequenos príncipes e princesas da família Habsburgo baseava-se na crença educacional iniciada por seu avô Leopoldo II, que acreditava "que as crianças deveriam ser desde cedo inspiradas a ter qualidades elevadas, como humanidade, compaixão e desejo de fazer o povo feliz".[11] Com uma profunda fé cristã e uma sólida formação científica e cultural – que incluía política internacional e noções de governo –, a arquiduquesa fora preparada desde cedo para reinar.[11][12][13]

É considerada por muitos historiadores como a principal articuladora do processo de Independência do Brasil ocorrido entre 1821 e 1822, notadamente em setembro de 1822.[14][15][16] O historiador Paulo Rezzutti, autor do livro D. Leopoldina — A história não contada: A mulher que arquitetou a Independência do Brasil, sustenta que foi em grande parte graças a ela que o Brasil se tornou uma nação. Segundo ele, a prometida de D. Pedro “abraçou o Brasil como seu país, os brasileiros como o seu povo e a Independência como a sua causa”. Foi também conselheira de Pedro em importantes decisões políticas que refletiram no futuro da nação, como o Dia do Fico e a posterior oposição e desobediência às cortes portuguesas quanto ao retorno do casal a Portugal.[17] Consequentemente, por reger o país em ocasião das viagens de Pedro pelas províncias brasileiras, é considerada a primeira mulher a se tornar chefe de estado de um país americano independente.[18][19][20]

Origem e infância

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Primeiros anos

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A família imperial austríaca em 1805, por Joseph Kreutzinger

Leopoldina nasceu em 22 de janeiro de 1797, no Palácio de Hofburg,[21] na cidade de Viena, Áustria. Ela pertencia à Casa de Habsburgo-Lorena, nobre família e uma das mais antigas e poderosas dinastias da Europa, a qual reinou sobre a Áustria de 1282 até 1918, dentre outros territórios que imperaram e era a mais antiga casa reinante na Europa quando Leopoldina nasceu. Era filha do último imperador do Sacro Império Romano-Germânico, Francisco II, (o qual, a partir de 1804, passou a ser apenas o "Imperador da Áustria" com o título de Francisco I, porque Napoleão Bonaparte exigiu que ele renunciasse ao título de imperador, no ano em que Napoleão era sagrado imperador dos franceses), e de sua segunda esposa e prima Maria Teresa, princesa de Nápoles e Sicília, de um ramo da Casa de Bourbon, pois era filha do rei Fernando I das Duas Sicílias e de sua esposa, a arquiduquesa Maria Carolina da Áustria.[3]

 
Anotação no registro de atividades do Cardeal Arcebispo, efetuada em latim, relativa ao batizado da Arquiduquesa Leopoldina, Carolina, Josepha, realizado na antecâmara do Palácio, às seis horas da tarde do mesmo 22 de janeiro de 1797. Arquivo da Cúria Metropolitana, Viena[21]

O nome completo da arquiduquesa de Áustria, que viria a ser a primeira imperatriz do Brasil, era Leopoldina Carolina Josefa de Habsburgo-Lorena, como informa a sua primeira biógrafa Olga Obry na obra "Gruner purpur brasiliens erste kaiserin erzherzogin leopoldine", de 1958 e o seu biógrafo, Carlos H. Oberacker Jr., na obra "A Imperatriz Leopoldina: Sua Vida e Sua Época" de 1972. O nome também já foi confirmado no artigo de seu pentaneto, D. Carlos Tasso publicado nos Anais do Museu Histórico Nacional, n.º 40 – 2008: "A Imperatriz Dona Leopoldina - Sua presença nos Jornais de Viena entre 1797 e 1826 e a sua renúncia à Coroa Imperial da Áustria", onde ele traz fac-símiles da documentação dos registros de Viena referentes a d. Leopoldina. Em seu artigo ele mostra pela primeira vez a anotação do registro do batismo de d. Leopoldina, com o nome correto, e um trecho publicado no jornal austríaco Wiener Zeitung, de 25 de janeiro de 1797, dando a notícia do nascimento da arquiduquesa Leopoldina Carolina Josefa, acontecido três dias antes, num domingo, dia 22 de janeiro. Também corroboram com sendo Leopoldina o seu primeiro nome os almanaques da corte imperial de Viena e os Almanaques Gotha do período. Informa Oberacker Jr. (p.301 e 302) que o nome "Maria" não se encontra entre os nomes de batismo da arquiduquesa, o que de fato é verdade. Oberacker se equivoca ao registrar que Leopoldina passou a usar Maria em sua viagem para o Brasil, ao tratar de alguns negócios particulares. Na realidade, como seu atual biógrafo Paulo Rezzutti demonstrou, d. Leopoldina acrescentou o Maria ainda na Áustria, assinando em 11 de maio de 1817, como "Maria Leopoldina", o Ato de Renúncia, um documento em que abria mão da sucessão austríaca ao se casar com o herdeiro do trono de Portugal. Também como Maria Leopoldina ela irá assinar o Juramento à Constituição do Brasil. Muito provavelmente Leopoldina teria adotado o nome "Maria" devido ao fato do nome ser de uso comum em Portugal, sendo o primeiro nome de todas as suas cunhadas e em homenagem à Virgem.[22]

Maria Leopoldina nasceu em um período turbulento da história europeia, e sua infância e primeira juventude não correram pacificamente; em 1799, Napoleão Bonaparte assume o poder da França no cargo de primeiro-cônsul e posteriormente se autointitula imperador. A partir daí, estabelece sobre a Europa uma série de conflitos e sistemas de alianças conhecidas como coligações “ou coalizões” que redefinem com frequência as fronteiras do continente. A Áustria é um dos participantes contra a França, presente em todos os cenários do conflito. Napoleão fazia estremecer as antigas instituições do velho continente. Batalhas ferozes abalavam o império e a Corte. A irmã mais velha, Maria Luísa de Áustria, casou-se com Napoleão Bonaparte em 1810, buscando fortalecer os laços entre França e Áustria. O casamento por procuração de estado foi, sem dúvida, uma das derrotas familiares mais graves. A avó materna da princesa, a rainha Maria Carolina das Duas Sicílias, resmungou com a atitude do genro: “É justamente o que me faltava, tornar-me agora ainda avó do diabo”.[23]

Educação

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Leopoldina por volta de 1810

Aos dez anos a princesa ficara órfã de mãe. Um ano depois seu pai se casaria novamente com aquela que Leopoldina descreveria como a pessoa mais importante de sua vida, Maria Luísa. Prima de Francisco I, como ele, neta de Maria Teresa da Áustria. Superava a defunta imperatriz em cultura e brilho intelectual, pois tivera uma educação esmerada.[24] Musa e amiga pessoal do poeta Johann Wolfgang von Goethe, ela foi responsável pela formação intelectual da enteada, desenvolvendo na jovem o gosto pela literatura, a natureza e a música de Joseph Haydn e de Ludwig van Beethoven. Não tinha filhos próprios, adotava de bom grado os da antecessora, e esses a chamavam de “querida mamãe”. Leopoldina teve uma infância marcada pela rigidez com os estudos, estímulos culturais diversos e as sucessivas guerras que ameaçavam o império de seu pai. A princesa e seus irmãos foram educados segundos os princípios de seu avô paterno Leopoldo II, que pregava a igualdade entre os homens, tratando a todos com cortesia, a necessidade de praticar a caridade, e acima de tudo, o sacrifício dos próprios desejos em nome das necessidades do Estado. Seu programa de ensino e dos arquiduques incluía disciplinas como leitura, escrita, alemão, francês, italiano, dança, desenho, pintura, história, geografia e música; em módulo avançado, matemática (aritmética e geometria), literatura, física, latim, inglês, grego, canto e trabalhos manuais.[25] Desde cedo, Leopoldina mostrou maior inclinação para as disciplinas de ciências naturais, interessando-se principalmente por botânica e mineralogia.[26] Leopoldina herdou do pai o hábito do colecionismo: montou acervos de moedas, plantas, flores, minerais e conchas.[27] Entre outubro e dezembro de 1816, teve êxito em aprender rapidamente a língua portuguesa, visto que em dezembro, a princesa já conversava com diplomatas portugueses, e vivia "rodeada de mapas do Brasil e de livros que contém a História deste Reino, ou Memórias a ele relativas".[28] Fazia parte da formação da família o aprendizado de línguas, e Leopoldina falava 6 idiomas.[3]

Eram frequentes as visitas a museus, jardins botânicos, fábricas e campos agrícolas. E, não raro, participavam de bailados, atuavam em peças teatrais e tocavam instrumentos para uma plateia com o objetivo de se adaptar aos cerimoniais e à exposição pública. Os príncipes de Habsburgo eram estimulados a frequentar o teatro especialmente para desenvolver a fala pública e expressões sem timidez, maior articulação e oratória sem medos, além de como se portar diante do povo.[3]

Casamento em Viena: estratégia política

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A jovem arquiduquesa Leopoldina em 1817

Leopoldina recebeu uma educação primorosa, foi educada como uma mulher apta a governar. Fato raro entre as casas nobres da época. Ter uma arquiduquesa da Casa de Habsburgo como esposa era ter a melhor conselheira e estadista que um governante poderia desejar. Além de um currículo de estudo primoroso, Leopoldina se interessava, como a maior parte de sua família, por ciências naturais, principalmente botânica e mineralogia. Era uma estudiosa, como grande parte das mulheres da aristocracia europeia de sua época, e além disso desenhava, pintava e tocava muito bem.[29]

Durante séculos, casamentos reais funcionaram como formas de aliança e de apoio político. Por meio do matrimônio construía-se uma teia de interesses e de solidariedade que integrava a cartografia geopolítica do continente europeu.[30] O casamento entre Maria Leopoldina e Pedro de Alcântara resultava em uma aliança estratégica entre as monarquias de Portugal e Áustria.[3]

Teve enorme papel nas negociações do casamento o Marquês de Marialva, o mesmo que negociara, aconselhado por Alexander von Humboldt, a vinda para o Brasil da Missão Artística Francesa. D. João VI tudo fez para incluir nas negociações a infanta Dona Isabel Maria, que seria regente do reino de Portugal de 1826 a 1828 e faleceria solteira. Marialva foi, por exemplo, quem garantiu que a corte estava decidida a voltar para Portugal logo que o Brasil demonstrasse que havia seguramente "escapado das chamas das guerras da independência que avançavam nas colônias espanholas", obtendo assim o consentimento austríaco ao casamento. O contrato foi assinado em Viena a 29 de novembro de 1816. O noivo era o príncipe D. Pedro, filho de João VI e de Carlota Joaquina da Espanha, herdeiro do trono do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.[3]

A cerimônia do casamento, celebrada pelo Arcebispo de Viena, foi realizada na terça-feira dia 13 de maio de 1817, data de aniversário de D. João VI. Foi realizada por procuração, na Igreja de Santo Agostinho, em Viena. D. Pedro foi representado pelo tio de Dona Leopoldina, o arquiduque Carlos da Áustria-Teschen, grande chefe militar, herói da Batalha de Aspern-Essling, ocorrida em 1809. Maria Leopoldina e Pedro receberam uma bênção nupcial em 6 de novembro de 1817, no Rio de Janeiro, quando do desembarque da princesa no Brasil.[3]

"O ponto culminante das cerimônias de casamento foi atingido no Augarten de Viena onde, a 1 de junho, Marialva, que tinha tido poucas oportunidades para revelar o esplendor, riqueza e hospitalidade de sua nação, deu uma suntuosa recepção para a qual fizera preparativos durante todo o inverno.» Pouco tempo antes do casamento, duas fragatas austríacas, a Áustria e a Augusta, partiram para o Rio, com os móveis e decorações para a embaixada da Áustria recém-instalada no Rio, o equipamento para uma expedição científica ao interior do Brasil e numerosas mostras de produtos comerciais austríacos."[31]

O príncipe de Metternich, diplomata austríaco, viu no príncipe herdeiro português dom Pedro a possibilidade de fortalecimento dos laços entre os reinos da Áustria e de Portugal, de ideais monárquicos absolutistas. Para dom João VI, foi a oportunidade de estreitar novas alianças com tradicionais dinastias como forma de se contrapor à excessiva influência da Inglaterra nos seus domínios. Já a Áustria via o novo império luso-brasileiro como um importante aliado transatlântico que se inseria perfeitamente nos ideais reacionários da Santa Aliança.[32] O casamento era um ato político e não um impulso sentimental.[3]

O casamento foi realizado por procuração em Viena, no dia 13 de maio de 1817, data de aniversário de dom João VI. O noivo, que não estava presente, foi representado em cerimônia pelo arquiduque Carlos, tio paterno de Leopoldina. No Rio de Janeiro, também foi festejada a notícia do ajustado enlace. Mas dom Pedro I e a arquiduquesa da Áustria só se viram pela primeira vez cinco meses depois – a bordo do barco que a trouxera. Dona Leopoldina desembarcou no Rio de Janeiro em 5 de novembro. No dia seguinte, as definitivas cerimônias de matrimônio se pronunciavam na Capela Real e enchiam de vida eventos por toda a cidade.[33]

Da Áustria para o Novo Mundo e a Missão Científica

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Dona Leopoldina na ilha da Madeira, única parada de sua comitiva durante a travessia do oceano Atlântico

A travessia do Atlântico

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A viagem de Leopoldina ao Brasil foi difícil e demorada. A arquiduquesa partiu de Viena em direção a Florença em 2 de junho de 1817, onde esperava definições da corte portuguesa para prosseguir com a travessia que a levaria ao marido, dom Pedro. Ainda era recente o restabelecimento da ordem monárquica, destituída em Recife por revoltosos de ideias liberais no episódio conhecido como Revolução Pernambucana.[3]

Aquela era a primeira vez que a princesa vira o mar.[34] Leopoldina embarcou em Livorno, na Itália, na esquadra portuguesa composta das naus D. João VI e São Sebastião. Com uma bagagem de princesa e numerosa comitiva, enfrentou 86 dias de travessia nas águas do Atlântico. Quarenta caixas da altura de um homem contendo o enxoval, livros, suas coleções e presentes para a futura família somavam-se a algumas damas da corte, uma camareira-mor, um mordomo-mor, seis damas, quatro pajens, seis nobres húngaros, seis guardas austríacos, seis camaristas, um esmoler-mor, um capelão, um secretário particular, um médico, um mineralogista e seu professor de pintura.[35]

Partiu definitivamente rumo ao Brasil em 15 de agosto. As diferenças de hábitos e costumes, notadas já no período em que esteve embarcada, prenunciavam as dificuldades que teria de enfrentar no Rio de Janeiro. A primeira vez que pisou em território português, contudo, não foi em terra Brasilis, mas na Ilha de Madeira, em 11 de setembro de 1817.[36][37][38]

 
Desembarque da arquiduquesa Leopoldina no Rio de Janeiro em 5 de novembro de 1817, com o Mosteiro de São Bento ao fundo. por Debret
 
Dona Leopoldina é recebida por Dom Pedro, a família real e a corte no Rio de Janeiro em 5 de novembro de 1817, por Debret

À chegada ao Rio, em 5 de novembro, a austríaca teria causado espanto aos reis, que esperavam uma bela princesa. Consta que tinha uma bela face e era obesa. Também era extraordinariamente culta para sua época, com grande interesse pela botânica. A chegada, proporcionou a Jean-Baptiste Debret ocasião para sua primeira intervenção, onde teve 12 dias para ornamentar a cidade. O mesmo possuía um atelier no bairro do Catumbi, onde na sua qualidade de naturalista, fez mais tarde desenhos de plantas e flores para Leopoldina. Diria ele: "Fui encarregado de executar graciosamente para ela alguns desenhos que ela ousava pedir, dizia, em nome de sua irmã, antiga imperatriz dos franceses". No atelier, Debret desenhou os grandes uniformes de gala da corte, em verde e ouro, as condecorações do novo Estado, como a Coroa de Ferro criada por Napoleão em 1806 para o Reino da Itália. Debret desenhou também as insígnias da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, comparáveis à da medalha da Legião de Honra, e as da Imperial Ordem da Rosa, instituída em homenagem à neta de Josefina, primeira esposa de Napoleão, Amélia de Leuchtenberg ou de Beauharnais, princesa de Leuchtenberg.

 
Leopoldina em um vestido da corte ostentando a Imperial Ordem do Cruzeiro, c. 1817

O jovem casal foi instalado em uma casa de campo nos terrenos da Quinta da Boa Vista. O diplomata Metternich interceptaria uma carta do barão de Eschwege a seu sócio em Viena em que este dizia: "Por falar no Príncipe Herdeiro, posto que não seja destituído de inteligência natural, é falho de educação formal. Foi criado entre cavalos, e a princesa cedo ou tarde perceberá que ele não é capaz de coexistir em harmonia. Além disso, a corte do Rio é muito enfadonha e insignificante, comparada com as cortes da Europa".[3]

Na esteira de Leopoldina chegaram os primeiros imigrantes, colonos suíços que se fixaram nos arredores da corte, fundando Nova Friburgo e instalando-se na futura Petrópolis, residência de verão sobretudo do Segundo Reinado. A partir de 1824, devido à campanha brasileira na Europa organizada pelo major Georg Anton von Schäffer, os alemães chegaram mais numerosos e se instalaram outra vez em Nova Friburgo e nas regiões temperadas das províncias de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, onde a colônia de São Leopoldo foi criada em sua homenagem. Alguns da Pomerânia foram para o Espírito Santo, vivendo até os anos 1880 em tão completo isolamento que nem falavam português.[3]

Missão científica austríaca

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 Ver artigo principal: Missão Artística Austro-Alemã

O Brasil teve o privilégio de ser retratado e estudado por artistas e cientistas europeus de primeira ordem muito antes dos demais países americanos. Ainda no século XVII, no âmbito da ocupação holandesa do nordeste brasileiro, o conde João Maurício de Nassau trouxe ao Brasil um significativo grupo de colaboradores, dentre os quais podemos citar Willen Piso, médico que veio estudar doenças tropicais; Frans Post, célebre pintor, então com vinte e poucos anos; Albert Eckhout, também pintor; o cartógrafo Cornelius Golijath; o astrônomo Georg Marggraf, que, com Piso, seria o autor da Historia Naturalis Brasiliae (Amsterdã, 1648), primeira obra de caráter científico sobre a natureza brasileira. Nassau também se preocupou em perpetuar os eventos políticos de sua administração, encomendando a Gaspar Barléu uma história de seu governo no Brasil.[3]

Uma vez expulsos os holandeses, os portugueses tomaram consciência de que a recuperação do território foi fruto de uma série de felizes circunstâncias, que poderiam não mais se repetir, na eventualidade de alguma nova invasão do território da América lusitana. Diante desse quadro, Portugal tomou como política de Estado vedar o acesso das suas possessões ultramarinas a todo e qualquer estrangeiro, proibindo, inclusive, a publicação de qualquer notícia ou referência às terras americanas. Tal política de Estado foi eficazmente seguida por várias gerações, desde meados do século XVII até a vinda da família real para o Brasil e a consequente abertura do Brasil ao mundo, simbolizada com o decreto da Abertura dos Portos, primeiro ato assinado pelo príncipe regente D. João, durante sua estadia em Salvador, em 1808.[39]

A abertura dos portos e a consequente revogação da proibição de desembarque de estrangeiros em terras brasileiras, que coincidia com um momento difícil para os naturalistas europeus, pois o trânsito desses pela Europa se via significativamente dificultado pelas Guerras Napoleônicas, aliada à ausência de saber acerca dessa imensa porção do território do globo, despertou um enorme interesse científico no mundo. Paralelo a esse contexto mundial, a princesa Leopoldina, desde sua primeira juventude, ainda com cerca de 14 anos de idade, passou a demonstrar um especial interesse pelas ciências naturais, especialmente pela geologia e pela botânica. Tal fato não passou despercebido de seus professores e por seu genitor, o imperador Francisco I da Áustria, que estranharam o interesse da jovem princesa (julgavam que seria mais natural que tais inclinações surgissem em algum dos príncipes, não em uma princesa), mas nada fizeram para dificultar os estudos da jovem princesa.[3]

Assim sendo, em 1817, quando do anúncio próximo do casamento da arquiduquesa da Áustria D. Leopoldina com o príncipe real do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, D. Pedro de Alcântara, imediatamente organizou-se, sob os auspícios da Coroa Austríaca, mas integrada, também, por cientistas bávaros, aquela que viria a ser a principal expedição científica ao interior das desconhecidas (para a ciência) terras brasileiras.[3]

No ano de 1815 o rei da Baviera, Maximiliano José, já projetava uma grande expedição científica pela América do Sul, mas alguns contratempos ocorreram e a expedição não foi realizada. Assim quando em 1817 a arquiduquesa Leopoldina embarcou rumo ao Brasil, para seu casamento com D. Pedro, Maximiliano José aproveitou a oportunidade e enviou seus súditos Carl Friedrich Phillip Von Martius, médico e botânico, e Johann Baptist von Spix, zoólogo, com o séquito da arquiduquesa.[3]

Além destes, Karl von Schreibers, diretor do Museu de História Natural em Viena, por ordens do chanceler Metternich, preparou uma missão com notáveis cientistas que acompanhariam a comitiva da arquiduquesa. Entre os cientistas estavam: Johann Christof Mikan, botânico e entomólogo; Johann Emanuel Pohl, médico, mineralogista e botânico; Johann Buchberger, pintor de flora; Johann Natterer, zoólogo; Thomas Ender, pintor; Heinrich Schott, jardineiro; e o naturalista italiano Giuseppe Raddi, este grupo tinha por objetivo colecionar espécimes e fazer ilustrações de pessoas e paisagens para um museu que seria fundado em Viena.[40]

O maior interesse era rastrear o Novo Mundo pesquisando plantas, animais e índios. Todo esse fascínio era devido a publicação do primeiro volume do livro do geógrafo alemão Alexander von Humboldt (1769-1859), Voyage aux régions équinoxiales du Nouveau Continent: fait en 1799, 1800, 1801, 1803 et 1804 ("Viagem às regiões equinociais do novo continente, feita de 1799 a 1804) e Aimé Bonpland (1773–1858"). Humboldt influenciou diversos artistas, por exemplo Johann Moritz Rugendas, e a característica marcante de suas pesquisas, bem como dos artistas humboldtianos, era representar tudo o que via de maneira enciclopédica, ou seja, explicando detalhadamente tudo o que viam.[41]

Regência e Imperatriz do Brasil

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Dona Leopoldina, então Princesa Real-Regente do Reino do Brasil, preside a reunião do Conselho de Ministros em 2 de setembro de 1822
 
Decreto de 13 de agosto de 1822 que nomeia D. Leopoldina para ficar a presidir os despachos do expediente e às sessões do Conselho de Estado no Rio de Janeiro enquanto da viagem de D. Pedro de Alcântara, então Príncipe Regente, para São Paulo dias antes da independência[42]
 Ver artigo principal: Independência do Brasil

Bastidores da independência

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1821 foi o ano de mudanças decisivas na vida de Leopoldina. Pertencente a uma das famílias mais conservadoras e duradouras da Europa – a casa de Habsburgo –, vinha de uma educação esmerada fundamentada aos moldes das monarquias absolutistas da época. “O meu esposo, Deus nos valha, ama as novas ideias”, escreveu ao pai, uma assustada princesa Leopoldina em junho de 1821, desconfiada dos novos valores políticos constitucionais e liberais.[43][44] Testemunhou pessoalmente os eventos ocorridos na Europa anos antes, na qual Napoleão Bonaparte alterou sistematicamente o poder político do continente, tendo isso certa influência em sua maneira de enxergar esses novos conceitos políticos. A educação conservadora e tradicional da qual a princesa fora disciplinada também se soma a esse aspecto.[3]

A princesa, antes carente de afeto e de aprovação, rapidamente dá lugar à mulher adulta que encara a vida sem ilusões. Com o desenrolar do atrito entre Portugal e Brasil, a princesa se envolvia cada vez mais no turbilhão dos acontecimentos políticos que precediam a Independência do Brasil. Seu envolvimento com a política brasileira a levaria a desempenhar um papel fundamental na independência, ao lado de José Bonifácio de Andrada e Silva. Nessa fase, Leopoldina distancia-se das ideias conservadoras (absolutistas) da corte de Viena e adota um discurso mais liberal (constitucional) a favor da causa brasileira.[45][46]

Em consequência da Revolução Liberal do Porto ocorrida em Portugal em 1820, no dia 25 de abril de 1821, a corte foi forçada a retornar para Portugal. Uma esquadra de 11 navios levou o rei Dom João VI, a corte, a casa real e o tesouro real, e só Pedro permaneceu no Brasil como príncipe regente do país, com amplos poderes contrabalançados por um conselho de regência. A princípio, Pedro foi incapaz de dominar o caos: a situação estava dominada pelas tropas portuguesas, em condições anárquicas. A oposição entre portugueses e brasileiros tornou-se cada vez mais evidente. Vê-se claramente, nas correspondências de Leopoldina, que ela esposou calorosamente a causa do povo brasileiro e chegou a desejar a independência do país, sendo por isso amada e venerada pelos brasileiros. Nas últimas décadas novas fontes de pesquisas tem mostrado que Leopoldina foi bem ativa no processo de independência brasileira, como evidencia a historiadora da USP, Cecilia Helena L. de Salles Oliveira, que assim refere Leopoldina:[3]

A conspiradora de São Cristóvão

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Palácio de São Cristóvão, na Quinta da Boa Vista. Onde D. Leopoldina viveu e faleceu em 1826. Gravura de Debret, cerca de 1817

Leopoldina temia revoluções populares por crescer ouvindo o exemplo deixado pela tia-avó Maria Antonieta, última rainha da França, guilhotinada durante a Revolução Francesa.[48][49] Porém, o medo das revoluções diminuírem os poderes dos monarcas pela revolta popular como ocorreu na França em 1789 e recentemente em Portugal em 1820 não se verificou no Brasil. "Assim que o movimento autonomista e depois o movimento de independência ganharam D. Pedro e D. Leopoldina como protagonistas, os brasileiros viram neles como aliados de primeira hora, e não tiranos que deveriam ser derrotados para cederem seu poder".[50]

A jovem princesa, preparada para manter fidelidade à monarquia absolutista, não imaginava que seria regente nos momentos conturbados que antecederam o rompimento com Portugal, nem que defenderia a independência do Brasil antes mesmo de dom Pedro, atitudes contrárias à educação que recebera. A princesa austríaca esteve sempre do lado da causa brasileira e, em várias cartas escritas a seus amigos na Europa, começou a fazer distinção entre portugueses e brasileiros, deixando claro o que pensava sobre a dominação portuguesa sobre a colônia. Com o retorno da corte para Portugal, Leopoldina concebeu que ficar na América era a solução para a defesa da legitimidade dinástica contra os excessos liberais que ameaçavam o poder dos Habsburgo e Bragança no Brasil. Presidindo o Conselho de Ministros durante a viagem do príncipe a São Paulo, apoiou a permanência dele no Brasil, simbolizada no Dia do Fico. Assim, aos 24 anos, tomava uma decisão política que a sentenciava à permanência indeterminada na América e a privaria pelo restante da vida do convívio com o pai, a irmã e outros familiares.[51][52] Assim como sua irmã Maria Luísa de Áustria casou-se com Napoleão Bonaparte na intenção de aproximar as relações políticas entre o Império Austríaco e o Império Francês através da união matrimonial, para Maria Leopoldina estava guardado um papel na história muito mais relevante que o da irmã. No final de 1821, uma carta da princesa direcionada a seu secretário Schäffer deixa claro que Leopoldina estava, nesse período, mais decidida pelo Brasil e pelos brasileiros do que D. Pedro, era necessária sua permanência no Brasil e ir contra às exigências das cortes portuguesas. O "Fico" dela foi anterior ao do marido.[53]

No Manifesto às Nações Amigas, assinado por D. Pedro I em 6 de agosto de 1822, denunciava-se o despotismo das cortes de Lisboa em relação aos assuntos brasileiros e convocava as nações amigas do Brasil a tratar diretamente dos assuntos com o Rio de Janeiro e não mais com o governo português, explicitando a sua causa e os acontecimentos segundo o ponto de vista dos brasileiros. Nesse mesmo documento, porém, é possível observar que, mesmo às vésperas da proclamação da independência, o príncipe regente não desejava dissolver os laços entre Portugal e Brasil, mas não prometia defender as ligações entre os dois países.[54][55] Seria essa uma medida de água morna, já que um mês mais tarde o país tornar-se-ia independente. Como uma mulher não era bem-vista no meio político, Leopoldina agia por meio de "conselhos pontuais e influenciando outros a aconselharem D. Pedro, [assim] ela ia conseguindo suas conquistas". D. Pedro, a princípio, evitou contato com a ideia de liberdade dos brasileiros, tentando manter a neutralidade, visando evitar a provável punição de perder sua herança ao trono português caso desobedecesse às cortes. Já a princesa Leopoldina percebia que Portugal, dominado pelas cortes, já estava perdido e que o Brasil jazia ainda como uma tela em branco, que poderia vir a ser uma potência futura, muito mais relevante que a velha metrópole.[48] As ordens da corte, se forçosamente cumpridas, acabariam por despedaçar o Brasil em dezenas de repúblicas, como ocorrera com as províncias espanholas na América do Sul.[56] Eram visíveis os sinais de uma nascente unidade brasileira como nação independente nas províncias do sul, mas o norte apoiava as cortes de Lisboa e pediam independência regional. Se o príncipe regente tivesse deixado o país naquele momento, o Brasil estaria perdido para Portugal pois as cortes de Lisboa repetiam o mesmo erro que levou as cortes espanholas a perderem as colônias, procurando estabelecer contatos diretos com cada província em particular.[57]

 
Leopoldina, Imperatriz consorte do Brasil. Retrato por Luís Schlappriz, no Museu do Estado de Pernambuco.

No Rio, milhares de assinaturas colhidas exigiam que os regentes permanecessem no Brasil. "A corajosa atitude de José Bonifácio de Andrada e Silva contra a arrogância dos portugueses encorajou muito as aspirações de unidade que existiam nas províncias meridionais, especialmente em São Paulo. Um grupo de homens altamente cultos liderou este movimento". Depois do dia do Fico, 9 de janeiro de 1822, organizou-se novo ministério sob a chefia de José Bonifácio, "no fundo rigoroso monarquista", e o príncipe real cedo conquistaria a confiança do povo. Em 15 de fevereiro de 1822 as tropas portuguesas deixaram o Rio de Janeiro, e sua partida representou a dissolução dos laços entre o Brasil e a metrópole. O príncipe foi triunfalmente recebido nas Minas Gerais.[3]

Regência

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Juramento da Imperatriz Maria Leopoldina à Constituição do Brasil, 1824. Documento sob guarda do Arquivo Nacional

Quando o marido, príncipe regente, viajou a São Paulo em agosto de 1822, para apaziguar a política (o que culminaria na proclamação da independência do Brasil em setembro), Leopoldina exerceu a regência. Grande foi sua influência no processo de independência. Os brasileiros já estavam cientes de que Portugal pretendia chamar Pedro de volta, rebaixando o Brasil outra vez ao estatuto de simples colônia, em vez de um Reino Unido ao de Portugal. Havia temores de que uma guerra civil separasse a Província de São Paulo do resto do Brasil. Pedro entregou o poder a Leopoldina a 13 de agosto de 1822, nomeando-a chefe do Conselho de Estado e Princesa Regente Interina do Brasil, com poderes legais para governar o país durante a sua ausência e partiu para apaziguar São Paulo.[3]

A princesa recebeu notícias que Portugal estava preparando ação contra o Brasil e, sem tempo para aguardar o retorno de Pedro, Leopoldina, aconselhada por José Bonifácio de Andrada e Silva, e usando de seus atributos de chefe interina do governo, reuniu-se na manhã de 2 de setembro de 1822, com o Conselho de Estado, redige carta a d. Pedro I. Enviada a d. Pedro I juntamente com outra carta, de José Bonifácio, além de comentários de Portugal criticando a atuação do marido e de dom João VI. Em sua carta, Leopoldina sugere a Pedro proclamar a Independência do Brasil, com a advertência: "O pomo está maduro, colhei-o já, senão apodrece".[58]

O oficial chegou ao príncipe no dia 7 de setembro de 1822. Leopoldina enviara ainda papéis recebidos de Lisboa, e comentários de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, deputado às cortes, pelos quais o príncipe regente se inteirou das críticas que lhe faziam na metrópole. A posição de João VI e de todo o seu ministério, dominados pelas cortes, era difícil.[3]

Enquanto se aguardava o retorno de Pedro, Leopoldina, governante interina de um Brasil já independente, idealizou a bandeira do Brasil, em que misturou o verde da Casa de Bragança e o amarelo ouro da Casa de Habsburgo-Lorena. Outros autores opinam que Jean-Baptiste Debret, artista francês, foi o autor do pavilhão nacional que substituía o azul e branco da vetusta corte portuguesa, símbolo da opressão do antigo regime. Depois disso, Leopoldina se empenhou a fundo no reconhecimento da autonomia do novo país pelas cortes europeias, escrevendo cartas ao pai, imperador da Áustria, e ao sogro, rei de Portugal.[59][60]

Foi aclamada imperatriz em 1 de dezembro de 1822, na cerimônia de coroação e sagração de Pedro I. Na condição do Brasil ser à época a única monarquia das Américas, Maria Leopoldina foi a primeira imperatriz do Novo Mundo.[61]

 
Fazenda de Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Residência de veraneio da Família Imperial Brasileira. Desenho de Maria Graham, amiga íntima da Imperatriz

A participação da Bahia no processo da independência

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 Ver artigo principal: Independência da Bahia

Primeira sede do governo, centro irradiador das políticas metropolitanas e porto estratégico, a Bahia só perdeu sua situação privilegiada na América portuguesa com a descoberta de ouro na Capitania Hereditária do Espírito Santo, sendo que a região onde foram descobertas as jazidas por bandeirantes foi desmembrada da referida capitania e transformada na província das Minas Gerais (desmembramento que se repetiu à medida em que novas jazidas eram descobertas, ocasionando o estreitamento da Capitania do Espírito Santo contra o mar, tornando-a, com a proibição de que os espírito santenses afluíssem para as Minas Gerais, numa malfadada barreira de contenção contra o contrabando de ouro) e a posterior transferência da capital para o Rio de Janeiro, em 1776. Salvador não queria acolher a corte de passagem, como de fato ocorreu em 1808, mas permanentemente. No processo de separação de Portugal, a Bahia sediou correntes antagônicas: o interior pró-independência e a capital fiel às cortes de Lisboa. Após o 7 de setembro, houve luta armada que deu vitória às tropas imperiais em 2 de julho de 1823.[3]

Mulheres baianas participaram ativamente da batalha patriótica. Maria Quitéria, alistada clandestinamente como soldado fiel à causa brasileira foi descrita por Maria Graham e condecorada pela Ordem do Cruzeiro por dom Pedro I. A tradição oral de Itaparica registra também o papel da negra Maria Filipa, que teria liderado mais de 40 mulheres negras e índias na defesa da ilha. Já Joana Angélica, abadessa do Convento da Lapa, impediu com a própria vida a entrada de tropas portuguesas no claustro.[3]

A conscientização política feminina é também destacada nesta vitrine a partir do manifesto Carta das senhoras baianas à sua alteza real dona Leopoldina, que a felicita pela parte por ela tomada nas patrióticas resoluções do príncipe regente. Na representação das 186 senhoras baianas, entregue em mãos em agosto de 1822, declara-se o agradecimento à permanência de dona Leopoldina no Brasil. A princesa escreve ao marido para expressar sua visão sobre a presença das mulheres na política, dizendo-lhe que a atitude daquelas senhoras "prova que as mulheres têm mais ânimo e são mais aderentes à causa boa".[62] Apesar de não voltar a sediar o governo, a Bahia teve uma importante função no equilíbrio político regional a favor do império brasileiro. Em reconhecimento ao apoio obtido no processo de independência, os imperadores visitaram Salvador entre fevereiro e março de 1826.[63]

Declínio da saúde e morte

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Túmulo de Dona Leopoldina na Cripta Imperial, São Paulo
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Cortejo fúnebre da Imperatriz D. Leopoldina. Ao fundo o Convento D'Ajuda, onde foi sepultada a imperatriz

A ligação escandalosa do marido com Domitila (ou Titília, como ele a chamava na intimidade), o reconhecimento público da filha bastarda de D. Pedro com a amante, a nomeação de Domitila como dama de companhia da imperatriz, e a viagem do casal imperial juntamente com Domitila para a Bahia no início de 1826 foram acontecimentos que deixaram a imperatriz totalmente humilhada, abalando-a moral e psicologicamente no futuro. A filha que teve com Domitila – na mesma época em que a imperatriz dava a luz outra criança – recebeu do pai o nome de Isabel Maria de Alcântara e o título de Duquesa de Goiás. Em carta à irmã Maria Luísa que morava na Europa, Maria Leopoldina desabafa: “O monstro sedutor é a causa de todas as desgraças”. Solitária, isolada, devotada apenas a parir um herdeiro para o trono – o futuro Dom Pedro II nasceria em 1825 e Leopoldina tornava-se cada vez mais depressiva. Desde o início de novembro de 1826 a imperatriz não se encontrava bem de saúde. Cólicas, vômitos, sangramentos e delírios foram frequentes nas últimas semanas de vida da imperatriz, cuja saúde definhou rapidamente.[3]

A imperatriz Leopoldina era querida por todo o povo brasileiro, e sua popularidade era, inclusive, maior e mais expressiva do que a de Pedro. O Rio de Janeiro começou a acompanhar a gravidade da doença de D. Leopoldina. O embaixador do Reino da Prússia, Theremim, oficiava a respeito das demonstrações públicas a Berlim:[64]

“A consternação no meio do povo era indescritível; nunca [...] foi visto igual sentimento uníssono. O povo se encontrava literalmente nos joelhos rogando ao Todo Poderoso pela conservação da imperatriz, as igrejas não se esvaziavam e nas capelas domésticas todos se encontravam de joelhos, os homens formavam procissões, não de habituais que quase costuma provocar risos, mas sim de verdadeira devoção. Em uma palavra, tal inesperada afeição, manifestada sem dissimulação, deve ter sido para a alta enferma uma verdadeira satisfação”.

No dia 7 de dezembro, o Diário Fluminense noticiava que o povo do Rio de Janeiro continuava, em sua ansiedade, a procurar a todos os momentos saber do “estado aflitivo” de d. Leopoldina:[64]

“Já pelos boletins, já pessoalmente dirigindo-se à Imperial Quinta, onde se mistura grandes e pequenos, nacionais, e estrangeiros, ricos e pobres, com as lágrimas nos olhos, o rosto abatido e o coração repassado de amargura e inquietação, fazem tremendo esta pergunta – Como está a Imperatriz?”.

Na tarde do dia 6, conforme noticiava o mesmo jornal, e confirmaria futuramente o sermão de frei Sampaio. Diversas procissões acompanhando “as Sagradas Imagens das respectivas igrejas” tinham como destino a Capela Imperial. Segundo frei Sampaio:[65]

“Nunca se observou na estrada de São Cristóvão maior concurso de povo; atropelavam-se as carruagens; todos corriam em lágrimas, entretanto que no centro da cidade giravam as procissões de preces, com suas imagens, e com acompanhamento de todo o clero, assim regular ou secular. O povo não pode ver sem público sinais de piedade a imagem de Nossa Senhora da Glória, que nunca saiu de seu templo, e que pela primeira vez, debaixo de muita chuva, ia como visitar a princesa, que aparecia todos os sábados aos pés dos seus altares [...] Não houve, em uma palavra, irmandade alguma, que não levasse à Capela Imperial os Santos da maior devoção."

Causa da morte

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Há divergências sobre a causa mortis da primeira imperatriz do Brasil. Para alguns autores, teria falecido em consequência de uma septicemia puerperal, enquanto o imperador se encontrava no Rio Grande do Sul, aonde fora inspecionar as tropas durante a Guerra da Cisplatina.[66] É muito difundida a versão de que Maria Leopoldina teria morrido em consequência das agressões desferidas contra si durante acesso de raiva de seu marido, o imperador, versão essa corroborada por historiadores como Gabriac, Carl Seidler, John Armitage e Isabel Lustosa.[67][68][69] A percepção da violência real como causa da morte sofreu certo revés - ainda que mesmo uma agressão fatal não necessariamente atingisse o esqueleto - com a recente exumação de seus restos mortais onde não se verificou nenhuma fratura óssea.[70] Isso se teria dado em 20 de novembro de 1826, quando assumiria a regência do país para que Pedro pudesse viajar ao Sul para tratar da guerra contra o Uruguai. Querendo demonstrar ser mentira o boato sobre suas relações extraconjugais e o mau clima entre o casal, Pedro I teria resolvido que o beija-mão ao regente seria feito em sua presença, junto a Domitília de Castro, marquesa de Santos e dama de companhia da imperatriz. Maria Leopoldina, arquiduquesa austríaca, teria achado uma enorme humilhação ser recebida pela corte junto à amante de seu marido, e teria afrontado Pedro recusando-se a entrar na sala do trono. O imperador, de gênio volátil, teria então tentado arrastá-la pelo palácio, agredindo-a com palavras e chutes, acabando por comparecer ao beija-mão acompanhado unicamente pela marquesa de Santos. Sublinha-se que não se conhece outra testemunha da agressão além dos três, e que as suspeitas sobre as agressões sofridas teriam sido levantadas pelas damas e médicos que ampararam Maria Leopoldina na sequência. A realidade dos fatos fora talvez outra:

"Exagerou-se, que Pedro lhe dera um pontapé, razão da doença. A cena, presenciada pelo agente austríaco [refere-se ao embaixador austríaco, Filipe Leopoldo Wenzel, Barão de Mareschal], consistiu em palavras desatinadas. O certo é que não faltaram motivos a Leopoldina para a perturbação da gravidez, a cujo malogro sucumbiu."[71]

A imperatriz, que havia meses encontrava-se em grave processo de depressão e na 12ª semana de gravidez, teve a saúde profundamente abalada. Em sua última carta à irmã Maria Luísa, ditada à marquesa de Aguiar, menciona um terrível atentado que sofrera pelas mãos de seu marido na presença da amante:[3]

"São Cristóvão, 8 de dezembro de 1826, às 4 horas da manhã"
"Minha adorada mana!"
"Reduzida ao mais deplorável estado de saúde e tendo chegado ao último ponto de minha vida em meio dos maiores sofrimentos, terei também a desgraça de não poder eu mesma explicar-te todos aqueles sentimentos que há tanto tempo existiam impressos na minha alma. Minha mana! Não tornarei a vê-la! Não poderei outra vez repetir que te amava, que te adorava! Pois, já que não posso ter esta tão inocente satisfação igual a outras muitas que não me são permitidas, ouve o grito de uma vítima que de tu reclama - não vingança - mas piedade, e socorro do fraternal afeto para meus inocentes filhos, que órfãos vão ficar, em poder de si mesmos ou das pessoas que foram autores das minhas desgraças, reduzindo-me ao estado em que me acho, de ser obrigada a servir-me de intérprete para fazer chegar até tu os últimos rogos da minha aflita alma. A Marquesa de Aguiar, de quem bem conheceis o zelo e o amor verdadeiro que por mim tem, como repetidas vezes te escrevi, essa única amiga que tenho é quem lhe escreve em meu lugar."
 
Cortejo fúnebre da Imperatriz Dona Leopoldina
Jean-Baptiste Debret
"Há quase quatro anos, minha adorada mana, como a ti tenho escrito, por amor de um monstro sedutor me vejo reduzida ao estado da maior escravidão e totalmente esquecida pelo meu adorado Pedro. Ultimamente, acabou de dar-me a última prova de seu total esquecimento a meu respeito, maltratando-me na presença daquela mesma que é a causa de todas as minhas desgraças. Muito e muito tinha a dizer-te, mas faltam-me forças para me lembrar de tão horroroso atentado que será sem dúvida a causa da minha morte. Cadolino, que por ti me foi recomendado, e que me tem dado todas as provas da maior subordinação e fidelidade, é quem fica encarregado de entregar-te a presente, e declarar-te o que por muitos motivos não posso confiar a este papel. Tendo ele todas as informações que são precisas sobre este artigo, nada mais tenho a acrescentar, confiando inteiramente na sua probidade, honra e fidelidade."
"Faltaria ao meu dever se, além de ter declarado ao Marechal e a Cadolino que tenho dívidas contratadas (ou contraídas?) para sustentar os pobres, que de mim reclamarão algum socorro, e para as minhas despesas particulares, não dissesse a ti que o Flach, de quem tenho muitas vezes escrito, é digno de toda tua consideração e de meu Augusto Pai, a quem peço-te remeter a inclusa."
'Este virtuoso amigo, além de ter se sacrificado e comprometido a si mesmo e seus negócios para me servir, não desprezou meio algum para me procurar socorros. Peço-te por quanto tens de mais sagrado de lhe prestares todo o auxílio, de modo que ele possa satisfazer aquelas dívidas que por mim tem contraído. Recomendo este exemplo da mais virtuosa amizade. Cadolino te dirá qual foi o procedimento de Marechal para comigo. A Marquesa de Aguiar fica encarregada de dar a ti os mais miúdos detalhes sobre quanto diz respeito às minhas queridas filhas. Ah, minhas queridas filhas! Que será delas depois da minha morte? É a ela que entreguei a sua educação até que o meu Pedro, o meu querido Pedro não disponha o contrário. Adeus minha adorada mana."
"Permita o Ente Supremo que eu possa escrever-te ainda outra vez, pois que será o final do meu restabelecimento."

L. S. B. Marquesa de Aguiar Escrevi.[72][nota 1]

Reações

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Durante a agonia de Leopoldina surgiram os mais diversos boatos: de que a imperatriz era prisioneira na Quinta da Boa Vista, de que estava sendo envenenada por seu médico, a mando da marquesa de Santos, entre outros. A popularidade de Domitília de Castro, que já não era das melhores, piorou, tendo sua casa em São Cristóvão sido apedrejada e seu cunhado, camareiro da imperatriz, alvejado por dois tiros.[73][74] O direito de presidir as consultas médicas à imperatriz, como sua dama de companhia, lhe foram negadas, e ministros e funcionários do paço sugeriram que ela não deveria continuar frequentando a corte.[3]

 
Carolina Josefa Leopoldina, 1ª imperatriz do Brasil: busto no Museu Imperial, em Petrópolis

O comunicado emitido em 11 de dezembro ao imperador sobre a morte de sua esposa relata convulsões, febre alta e delírios. Gozando de grande apreço pela população, que a admirava muito mais do que o marido, teve sua morte chorada por grande parte da nação.[75]

Esta versão dos acontecimentos foi propagada até a Europa, tendo a reputação de Pedro ficado de tal modo manchada que o seu segundo casamento tornou-se deveras dificultoso. É dito que o primeiro galardoado da Imperial Ordem de Pedro Primeiro, Francisco I da Áustria, teria recebido a comenda como um pedido de desculpas do imperador brasileiro.

Luiz Roberto Fontes, médico legista que acompanhou a análise forense da família imperial realizada entre março e agosto de 2012, afirmou que uma doença grave causou o aborto e o óbito de d. Leopoldina, e não uma briga entre o casal na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro. "O que temos condições de dizer, hoje, é do que a imperatriz não morreu. Se houve mesmo uma briga por causa da traição de Dom Pedro I, ela não tem a ver com a morte de dona Leopoldina", explica o legista ao público de uma palestra no MusIAL (Museu do Instituto Adolfo Lutz). "Ela teve uma infecção grave, mas não sabemos ainda qual é essa doença. Precisamos de mais análises para descobrir a causa da morte. A tomografia não mostrou fratura no fêmur ou em outro osso, descartando a lenda da queda de uma escada ou do acidente (provocado por Dom Pedro). Pelos exames, vimos que a causa pode ser uma grave infecção que ela teve por três semanas".[76]

A primeira ameaça de aborto ocorreu em 19 de novembro, quando a imperatriz teve um pequeno sangramento. Com a piora do quadro no decorrer da semana, ela passou a sofrer, também, de febre e fortes diarreias, que indicam uma hemorragia intestinal perigosa para uma gestante.[3]

Em 30 de novembro, somaram-se os delírios até que os registros médicos apontaram o aborto de um feto masculino, com cerca de três meses, em 2 de dezembro, dias antes de Leopoldina falecer. Mesmo após perder o bebê, Leopoldina não melhorou e passou a ter cada vez mais delírios, febre e hemorragias, "ou seja, ela estava em um claro quadro séptico, um quadro de morte", disse o legista.[3]

Morte e preservação da memória

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A imperatriz Maria Leopoldina morreu no Palácio de São Cristóvão, na Quinta da Boa Vista, bairro de São Cristóvão, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, em 11 de dezembro de 1826.[77]

A cerimônia fúnebre foi presidida por Francisco Mont'Alverne, pregador oficial do Império do Brasil.

Seu corpo, revestido do manto imperial, foi colocado em três urnas: a primeira de pinho português, a segunda de chumbo (com a inscrição latina própria, sobre a qual havia uma caveira com duas tíbias cruzadas, e sobre esta, o brasão imperial em prata) e a terceira de cedro.[3]

Foi sepultada no Convento da Ajuda, na atual Cinelândia. Quando o convento foi demolido, em 1911, os restos foram transladados para o Convento de Santo Antônio, também no Rio de Janeiro, onde foi construído um mausoléu para ela e alguns membros da família imperial. Em 1954, foram transferidos definitivamente para um sarcófago de granito verde ornado de ouro, na Capela Imperial, sob o Monumento do Ipiranga, na cidade de São Paulo.[78]

Legado

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Apesar de ela ser retratada como uma mulher melancólica e humilhada com os escândalos e relações extraconjugais de D. Pedro I – representando-a como o elo frágil entre o triângulo amoroso –, a historiografia mais recente têm reivindicado a Maria Leopoldina uma imagem menos passiva na história nacional.[3]

Leopoldina teve grande destaque na política brasileira, seja no momento em que a corte portuguesa retornou a Portugal, seja nos bastidores dos atritos entre Brasil e Portugal até o momento da Independência em 1822. Enquanto Pedro ainda mantinha a possibilidade da manutenção do Reino Unido com Portugal, Leopoldina já constatara que o caminho mais prudente era a emancipação total da metrópole. A formação intelectual e política de Leopoldina, aliadas a seu forte senso de dever e sacrifício em nome do Estado foram fundamentais para o Brasil, especialmente depois que Dom João VI, sob pressão portuguesa, fora obrigado a voltar a Lisboa. Tendo em vista o fato que era de origem Habsburgo e que fora educada sob um regime aristocrático e absolutista, Leopoldina não hesitou em defender ideais e formas mais representativas de governo para o Brasil, influenciados pelo liberalismo e constitucionalismo.[3]

Os brasileiros nutriam grande respeito e admiração pela princesa austríaca desde os primeiros momentos em que pôs os pés no Brasil. Muito popular – visão essa ainda mais forte entre os mais pobres e escravos –, a partir do momento de sua morte começara a ser chamada de "mãe dos brasileiros". Petições foram elaboradas para que a princesa recebesse o título de o “Anjo tutelar deste nascente Império”.[79] Durante o período em que esteve enferma em seus últimos dias de vida, cortejos foram realizados nas ruas do Rio de Janeiro; igrejas e capelas lotavam de pessoas em profunda tristeza. A notícia de sua morte espalhou comoção pela cidade. O povo saiu às ruas em prantos, existindo relatos de escravos que se lamentavam aos gritos: “Nossa mãe morreu. O que será de nós? Quem tomará partido dos negros?”.[80] Com sua morte, a popularidade de D. Pedro, aliado aos problemas do primeiro reinado, decaiu consideravelmente.[81] O escritor e biógrafo de sua vida, Carlos H. Oberacker Jr., afirma que "raras vezes uma estrangeira foi tão querida e reconhecida por um povo como ela".[82]

Durante a vida, Leopoldina procurou formas de acabar com o trabalho escravo.[83] Em uma tentativa de mudar o tipo de mão de obra no Brasil, a imperatriz incentivou a imigração europeia para o país. A vinda de Leopoldina para o Brasil fomentou o começo da imigração germânica para o país, primeiro vindo os suíços, se fixando no Rio de Janeiro e fundando a cidade de Nova Friburgo. Depois, a fim de povoar o sul brasileiro, a imperatriz incentivou a vinda dos alemães. A presença da imperatriz na América atraiu as atenções como forma de “propagandear” o Brasil entre o meio germânico.

A importância e relevância da princesa em solo brasileiro também devem-se ao fato da missão científica que a acompanhou de viagem desde a península Itálica, composta de pintores, cientistas e botânicos europeus. Como a princesa tinha interesse em botânica e geologia, com ela vieram dois cientistas alemães; o botânico Von Martius e o zoólogo Von Spix, nomes conhecidos das ciências naturais do século XIX, além do pintor viajante Thomas Ender. A pesquisa dessa missão resultou nas obras Viagem pelo Brasil e Flora Brasiliensis, um compêndio de aproximadamente 20 mil páginas com classificação e ilustração de milhares de espécies de plantas nativas. Juntos, os cientistas percorreram mais 10 mil quilômetros do Rio de Janeiro até às fronteiras com Peru e Colômbia.[3]

A postura de Leopoldina ao se recusar a retornar a Portugal ainda divide opiniões, pois enquanto para um grupo de escritores aquela foi uma atitude revolucionária, para outros a princesa foi apenas estrategista. Para Maria Celi Chaves Vasconcelos, professora da UERJ e especialista em educação de mulheres nobres, não existe o menor traço de rebeldia em qualquer escrito de ou sobre Leopoldina. "Seria revolucionária por ter influenciado D. Pedro na Proclamação da Independência? Não creio que haja aí nenhum traço revolucionário; acho que ela era, talvez, conhecedora o suficiente da história política para fazer o julgamento correto sobre o momento vivido e o quanto ele era propício à Independência", defende a pesquisadora.[84] "Independentemente dos motivos que fizeram Leopoldina permanecer no Brasil, a Imperatriz deve ser interpretada como uma mulher revolucionária por ter sido a primeira a fazer política na alta esfera de decisões brasileiras", defende Paulo Rezzutti.[84]

Um outro legado de Leopoldina que mantém-se até os dias atuais é a bandeira nacional. Embora a história difundida seja a de que a cor amarela representa o ouro e as riquezas naturais, e o verde as florestas brasileiras, as cores do maior símbolo nacional representam as duas dinastias que deram origem ao Brasil independente: o verde representando a casa real de Bragança (Portugal) de D. Pedro I, e o amarelo representa a casa imperial de Habsburgo (Áustria) de Maria Leopoldina.[85]

Representações na cultura

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A imperatriz Leopoldina já foi retratada como personagem no cinema e na televisão, interpretada por Kate Hansen no filme Independência ou Morte (1972), Maria Padilha na novela Marquesa de Santos (1984) e Érika Evantini na minissérie O Quinto dos Infernos (2002).

A vida de Leopoldina também foi tema do enredo de 1996 da escola de samba Imperatriz Leopoldinense, cujo próprio nome já deriva indiretamente do seu (porque a escola é sediada na zona da Estrada de Ferro Leopoldina, assim batizada em homenagem à imperatriz). Na ocasião, a carnavalesca Rosa Magalhães recebeu apoio do governo da Áustria para a realização do desfile.

Em 2007, a atriz Ester Elias deu vida a uma Leopoldina no musical Império, de Miguel Falabella, que conta parte da história do Império do Brasil.

Em 2017, a atriz Letícia Colin interpretou a imperatriz Leopoldina na telenovela das 18h Novo Mundo na Rede Globo.[86]

Em 2018, Leopoldina e a Imperatriz Leopoldinense foram homenageadas pela escola de samba Tom Maior, no carnaval de São Paulo.

Em 2019, um episódio da série Show da História, do Canal Futura, foi centrado na história da imperatriz.

Títulos e honras

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Estilo imperial e real de tratamento de
Maria Leopoldina do Brasil
 
Estilo imperial Sua Majestade Imperial
Estilo real Sua Majestade Fidelíssima
Estilo alternativo Sua Majestade Imperial e Fidelíssima

Títulos e estilos

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Honras

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Brasileiras:

Portuguesas:

Estrangeiras:

Descendência

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Retrato de Dona Leopoldina e seus filhos, por Domenico Failutti

A imperatriz teve 9 gestações durante sua vida, porém acabou sofrendo dois abortos, sendo o segundo, que em pouco mais de uma semana, acabou acorrentando em sua morte.[87] Seus sete filhos que sobreviveram a gestação foram:

Nome Retrato Vida Notas
Maria II de Portugal   4 de abril de 1819 –
15 de novembro de 1853
Rainha de Portugal de 1826 até sua morte. Casou-se primeiro com o príncipe Augusto de Beauharnais, Duque de Leuchtenberg, porém ele morreu poucos meses após a união. Seu segundo marido foi o príncipe Fernando de Saxe-Coburgo-Gota, que se tornou o rei D. Fernando II após o nascimento do primeiro filho do casal. Os dois acabariam tendo onze filhos. Maria foi a herdeira de seu irmão Pedro II desde a ascensão deste até sua exclusão da linha de sucessão brasileira em 30 de outubro de 1835 pela lei nº 91.[88]
Miguel de Portugal 26 de abril de 1820 Por ter morrido à nascença na situação de varão do herdeiro da Coroa Portuguesa, ainda em 1820, o título de Infante de Portugal.[89][90]
João Carlos, Príncipe da Beira 6 de março de 1821 –
4 de fevereiro de 1822
Viveu apenas 11 meses. Príncipe da Beira de seu nascimento até sua morte.[91]
Januária do Brasil   11 de março de 1822 –
13 de março de 1901
Casou-se com o príncipe Luís Carlos, Conde de Áquila e filho do rei Francisco I das Duas Sicílias. Os dois tiveram quatro filhos. Foi oficialmente reconhecida como uma infanta de Portugal em 4 de junho de 1822,[92] porém foi posteriormente excluída da linha de sucessão portuguesa após a independência do Brasil.[93]
Paula do Brasil   17 de fevereiro de 1823
– 16 de janeiro de 1833
Morreu aos nove anos de idade, provavelmente de meningite.[94] Por ter nascido depois da independência do Brasil, ela nunca fez parte da linha de sucessão portuguesa.[95]
Francisca do Brasil   2 de agosto de 1824 –
27 de março de 1898
Casou-se com o príncipe Francisco de Orleães, Príncipe de Joinville e filho do rei Luís Filipe I da França. O casal teve três filhos. Por ter nascido depois da independência do Brasil, ela nunca fez parte da linha de sucessão portuguesa.[96]
Pedro II do Brasil   2 de dezembro de 1825
– 5 de dezembro de 1891
Imperador do Brasil de 1831 até 1889. Casou-se com a princesa Teresa Cristina das Duas Sicílias, filha do rei Francisco I das Duas Sicílias. Os dois tiveram quatro filhos. Por ter nascido depois da independência do Brasil, ele nunca fez parte da linha de sucessão portuguesa.[97]

Ancestrais

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Nome Retrato Vida Notas
Maria Teresa das Duas Sicílias

(Mãe de Leopoldina)

  6 de junho de 1772

- 13 de abril de 1807

Imperatriz Consorte da Áustria de 1804 até 1807 e Imperatriz Consorte do Sacro Império Romano-Germânico de 1792 até 1806. Casou-se com Francisco I da Áustria e II

do Sacro Império Romano-Germânico, com quem teve 12 filhos, sendo que 5 deles morreram ainda na infância.

Francisco I da Áustria e II do Sacro

Império Romano-Germânico

(Pai de Leopoldina)

  12 de fevereiro de 1768

- 2 de março de 1835

Imperador da Áustria de 1804 até 1835, Imperador Romano-Germânico de 1792 até 1806, Rei da Hungria, Croácia e Boêmia de 1792 até 1835 e Rei de Lombardo-Vêneto de 1815 até 1835. Francisco se casou 4 vezes ao longo de sua vida, sua 1ª esposa foi Isabel de Württemberg, com quem teve 1 filha, sua 2ª esposa foi Maria Teresa, com que teve 12 filhos, sua 3ª esposa foi Maria Luísa de Áustria-Este, com quem não teve filhos e sua 4ª esposa foi Carolina Augusta da Baviera, com quem também não teve filhos.


Maria Antonieta

(Tia Avó de Leopoldina)

  2 de novembro de 1755

- 16 de outubro de 1793

Rainha Consorte da França e Navarra de 1774 até 1792. Famosa pela frase "Se não tem pão, que comam brioches", que nunca foi dita por ela. 9 meses após a execução do marido, Luís XVI, Antonieta foi julgada, condenada e guilhotinada no dia 16 de outubro de 1793. Após sua morte, Maria Antonieta tornou-se parte da cultura popular e uma figura histórica importante, sendo o assunto de vários livros, filmes e outras mídias. Alguns acadêmicos e estudiosos acreditam que ela tenha tido um comportamento frívolo e superficial, atribuindo-lhe o início da Revolução Francesa, no entanto outros historiadores alegam que ela foi retratada injustamente e que as opiniões a seu respeito deveriam ser mais simpáticas.
Maria Teresa da Áustria

(Bisavó de Leopoldina)

  13 de maio de 1717

- 29 de novembro de 1780

Imperatriz do Sacro Império Romano-Germânico de 1745 até 1765, Arquiduquesa da Áustria Rainha da Hungria e Croácia de 1740 até 1780 e Rainha da Boêmia de 1740 até 1741. Foi a primeira e única mulher a governar sobre os domínios habsbúrgicos e a última chefe da Casa de Habsburgo (a partir de seu casamento a Casa Real passou a denominar-se Casa de Habsburgo-Lorena). Era casada com Francisco I, com quem teve 16 filhos.
Francisco I do Sacro Império Romano-Germânico

(Bisavô de Leopoldina)

  8 de dezembro de 1708 - 18 de agosto de 1765
Imperador Romano-Germânico de 1745 até 1765, Arquiduque da Áustria 1740 até 1765, Grão-Duque da Toscana de 1737 até 1765 e Duque da Lorena 1729 até 1737. Foi casado com a Imperatriz Maria Teresa da Áustria e teve 16 filhos. Juntamente com a sua esposa, fundou a dinastia Habsburgo-Lorena. Embora, nominalmente, ocupasse uma posição superior à sua esposa, Francisco que, apesar de competente, era mais calmo, foi sempre ofuscado pela personalidade forte da sua esposa.
Maria Luísa da Espanha

(Avó de Leopoldina)

  24 de novembro de 1745 - 15 de maio de 1792 Imperatriz Consorte do Sacro Império Romano-Germânico de 1790 até 1792 e Grã-Duquesa Consorte da Toscana de 1965 até 1790. Foi casada com Leopoldo II, com quem teve 16 filhos. Maria Luisa morreu em menos de três meses após o marido, não vivendo o suficiente para ver seu filho mais velho, Francisco, subir ao trono.
Leopoldo II do Sacro Império Romano-Germânico

(Avô de Leopoldina)

  5 de maio de 1747 - 1 de março de 1792 Foi Imperador Romano-Germânico, Arquiduque da Áustria e Rei da Hungria, Croácia e Boêmia de 1790 até 1792 e Grão-Duque da Toscana de 1765 até 1790. Durante seu breve reinado, conseguiu sufocar rebeliões nos territórios húngaros e belgas, firmou a Paz de Sistova em 1791 acordado com os turcos e fez um acordo com Frederico Guilherme II da Prússia, numa aliança contra os franceses revolucionários, dado que a rainha Maria Antonieta era sua irmã. Casou-se com Maria Luísa da Espanha, filha de Carlos III de Espanha.
Maria Carolina da Áustria

(Avó de Leopoldina)

  13 de agosto de 1752 - 8 de setembro de 1814 Foi uma arquiduquesa da Áustria e rainha consorte do Reino das Duas Sicílias.

Décima terceira filha de Francisco I do Sacro Império Romano-Germânico, e da imperatriz Maria Teresa da Áustria, casou-se em abril de 1768, aos dezesseis anos de idade com o rei Fernando IV de Nápoles e III da Sicília, como parte de uma aliança com a Espanha onde o pai de Fernando, Carlos III era rei.

Fernando I das Duas Sicílias

(Avô de Leopoldina)

  12 de janeiro de 1751 - 4 de janeiro de 1825 Foi o Rei das Duas Sicílias desde sua unificação em 1816 até sua morte. Anteriormente ele foi Rei da Sicília como Fernando III de 1759 até 1816 e Rei de Nápoles como Fernando IV em três períodos diferentes, de 1759 até ser deposto em janeiro de 1799 pela República Partenopeia, de junho de 1799 até ser deposto novamente em 1806 por Napoleão Bonaparte, e por fim entre 1815 e 1816.

Ver também

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Notas

  1. Estudos recentes demonstram que essa última carta de Leopoldina pode ser uma fraude. A original, em francês, nunca foi encontrada em qualquer arquivo, no Brasil ou no exterior. A cópia existente no Arquivo Histórico do Museu Imperial, em Petrópolis, está escrita em português, com uma única frase em francês dizendo que a transcrição foi feita de acordo com uma original expedida em 12 de dezembro de 1826. Essa cópia, utilizada por todos os estudiosos até então, só surgiu no Rio de Janeiro em 5 de agosto de 1834 — quase oito anos após a morte de Leopoldina — para ser registrada junto ao tabelião Joaquim José de Castro. Serviram como testemunhas para atestar a origem da carta: César Cadolino, J. M. Flach, J. Buvelot e Carlos Heindricks. Desses, comprovadamente com dois, Cadolino e Flach, Leopoldina fizera grandes dívidas e nada melhor, para os credores, do que ter uma confissão delas feita pela própria imperatriz. (REZZUTTI, Paulo. Titília e o Demonão. Cartas Inéditas de Pedro I à Marquesa de Santos. Geração Editorial, 2011.)

Referências

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Bibliografia

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Maria Leopoldina de Áustria
Casa de Habsburgo-Lorena
Ramo da Casa de Habsburgo
22 de janeiro de 1797 – 11 de dezembro de 1826
Precedida por
Carlota Joaquina da Espanha
 
Imperatriz Consorte do Brasil
12 de outubro de 1822 – 11 de dezembro de 1826
Sucedida por
Amélia de Leuchtenberg
 
Rainha Consorte de Portugal e Algarves
10 de março de 1826 – 2 de maio de 1826
Sucedida por
Augusto de Beauharnais
 
Princesa do Brasil
13 de maio de 1817 – 12 de outubro de 1822
Título abolido
Independência do Brasil