Chapter Text
“Shifu lhes ensinou bem.” Ele levantou-se, como se o forte impacto não tivesse tido efeito algum sobre o corpo dele “mas não lhes ensinou tudo.”
Medo. Fazia pouco mais de dez anos que ela não sentia a sensação nauseante, os pelos todos arrepiados e as pupilas contraídas, ela poderia ouvir o próprio coração.
A forma como ele se moveu, como ele parecia inalterado enquanto os músculos dela doíam, ela aceitou o que estava lutando há mais de vinte anos, ela não tinha chances contra ele.
Infelizmente, era tarde, macaco caiu primeiro, o ataque nervoso, ela mal teve tempo de raciocinar quando Tai Lung se direcionou a ela, as pontas das garras dele azuladas, quase hipnotizantes, ela só sentiu o impacto, leve de primeira, apenas para a dor se alastrar, de forma insuportável.
Ela não conseguia se mover, assim como os outros companheiros, a visão dela estava turva, Tigresa não sabia se era pela dor ou um dos efeitos do ataque, apenas que estava doendo, doía tanto, ela preferia que ele tivesse mordido o pescoço dela.
A sensação era de sufocamento, ela começou a se desesperar, forçando os músculos, tentou se forçar nos outros, mas a única coisa que ela viu foi a cauda de Tai Lung, varrendo o chão enquanto ele se afastava.
Não. Ele não pode ir.
Ela começou a se desesperar, o coração batendo a mil léguas, ele estava indo para o Vale, terminar a destruição que havia começado há vinte anos, imagens dos cidadãos do Vale sendo dilacerados pelo ódio latente daquele monstro invadiram a mente dela. O lugar que ela cresceu, o lugar que ela deveria proteger… seria destruído por causa da fraqueza dela.
Não. Ela não poderia deixar isso acontecer, Tigresa lutou contra a imobilização, a dor aumentando, a sensação de sufocar também, mas ela não parou, o coração acelerando.
Ele vai destruir tudo. Ele vai matar todos. Ele vai matar Shifu. Ela pensou, lágrimas começando a transbordar. Não, não mestre, eu não vou falhar… não de novo!
Com estalos dolorosos os músculos dela se moveram, uma libertação muito mais dolorosa que o ataque de Tai Lung, ela tinha certeza que tinha se ferido, mas não se importou.
Tigresa se levantou, caiu logo em seguida, o corpo muito fraco e dolorido, os pulmões implorando por ar puro, ela gritou de dor, as lágrimas começaram a cair, em pura agonia.
Não para agora. Ela ordenou para o coração, batendo no peito com o punho fechado, forçando o ar para os pulmões. Eu preciso detê-lo… preciso pará-lo!
Ela tentou se levantar de novo, mas as pernas caíram antes que ela conseguisse firmar o peso, dóia tanto, como nunca doeu antes. Só mais um pouco… ela implorou funciona… ela socou as coxas funciona os impactos aumentando a dor.
“Droga! Funciona!” Ela gritou, se levantando de uma vez e se forçando a andar de quatro, ela olhou, percebendo que Tai Lung já tinha desaparecido, ela não podia perder mais tempo.
Ela olhou para os amigos, todos a encaravam com agonia, implorando para ela ficar com os olhos, Tigresa sabia que deveria ajudá-los, ajudar Garça, quem Tai Lung havia apenas nocauteado e não paralisado, a levá-los de volta, ela chorou, impedir Tai Lung, ela precisava fazer isso.
“Eu sinto muito…” ela sussurrou olhando para todos seus queridos companheiros uma última vez “Não ousem me perdoar.”
Então ela correu, a dor se anestesiando conforme ela corria.
A ideia de vencê-lo em uma batalha não era mais viável, então Tigresa partiu para o plano B, aquele plano que ela tinha em mente desde que fugiu do palácio, a opção vergonhosa, mas a única que ela conseguia pensar para evitar tragédias.
Ela não tinha nada além do Kung Fu e ninguém para voltar além de Shifu e os cinco furiosos. Ela sabia que Shifu não derramaria lágrimas por ela, e seus companheiros, eles ficariam bem sem ela.
Está tudo bem… ela consolou a si mesma, mil coisas passando pela mente dela, através da dor e da adrenalina, ela finalmente enxergou seu destino.
Tai Lung parou de correr ao perceber que estava sendo perseguido, ele questionou se aquela cegonha idiota ousou segui-lo mesmo após ele demonstrar piedade o suficiente para deixá-lo com seus membros intactos, mas ao se virar, ele não pode deixar de ficar impressionado.
Ela parecia bem mais selvagem do que no primeiro encontro, a ponte em que eles estavam balançou quando ela avançou, Tai Lung ainda a encarava confuso, nunca ninguém havia escapado do ataque nervoso dele, vê-la se mover com tanto afinco apenas alguns minutos depois que ele a paralisou… ele sentiu que havia a subestimado.
Não que ele a temeu, mas uma ponta de respeito ameaçou perfurar o coração inundado de ódio e fúria, aquela mulher talvez fosse tão determinada quanto dele, mas o que esperar de um aluno de Shifu?
Ela já parecia bastante debilitada, o leopardo das neves calculou as próximas ações rapidamente, baseando-se nos ataques anteriores dela, ele iria nocautear ela, um pensamento rápido de arrastá-la consigo e deixá-la nos pés da vila para que ela pudesse ser socorrida, mas ele não teve tempo de pensar quando ela o atacou.
Ela vacilou muito mais do que na primeira luta, foi fácil desviar, mas difícil encontrar uma brecha, ela estava com a face franzida, um olhar ferino, mas seus movimentos eram cautelosos, não o deixando golpeá-la.
“Sem conversas desta vez, tigrinha?” Ele não deixou de provocá-la desviando de um arranhão muito próximo dos olhos.
Ela não demonstrou reação, os olhos seguindo os movimentos dele, quase como se ela estivesse inconsciente e aquele fosse apenas o corpo dela, o Kung Fu inato liderado por instintos, similar ao momento que ele escapou da prisão, talvez sem a sensação latente da euforia.
Ela continuou, a ponte balançando de forma nauseante, Tai Lung não percebeu, mas ele estava prolongando a luta, intrigado com a forma que ela se movia, rápida e assertiva, muito mais focada na defesa, mesmo depois dele machucá-la tanto.
“Shifu realmente lhe ensinou bem…” ele sussurrou consternado, mas em seguida voltou a provocá-la “Será que ele aprendeu algo novo enquanto estive fora?”
Finalmente ela pareceu ouvi-lo, Tigresa o chutou conseguindo alguma distância entre eles, visto que Tai Lung se aproximava com fervor a cada oportunidade que tinha.
“Ele me treinou como treinou você.” Ela rosnou, mesmo que sua voz saísse em sofrimento, seus ataques não cessaram “A diferença é que eu não sou cega pelo poder.”
Isso o deixou irritado, Tai Lung a acertou com um chute, ela rolou pela ponte e mais um pouco teria caído, Tigresa demorou mais para conseguir se levantar, um borbotão de sangue subindo pela garganta.
“Você é apenas uma pirralha afinal.” Ele se aproximou lentamente, com o olhar sombrio “Sabe, eu me compadeço, há vinte anos eu seria tão idiota quanto você é, tão cego por promessas vazias que mataria por ele, assim como você.”
Ele terminou a frase se abaixando ao lado dela, vendo a confusão do rosto dela, não havia mentiras em suas palavras, Tai aproveitou o momento para desabafar, apesar de sentir gotas de chuva começarem a cair do céu.
“Se acha diferente de mim?” Ele perguntou, a impedindo de se levantar quando ela tentou “Bem, você certamente é mais fraca, o que? Ele não fez você treinar até seus ossos racharem, até seus músculos explodirem?”
Tigresa queria zombar, queria fazê-lo pagar por humilhá-la daquela maneira, ela poderia dar a ele mil exemplos, como a fez que ela rachou as costelas durante um treinamento, quando os ossos de uma das mãos quebraram quando ela foi esmagada durante uma luta supervisionada, quando ela ia dormir e só conseguia sentir a dor dos músculos.
Ela olhou para ele, com os olhos cansados, mas um desafio implícito, que ela ainda não estava convencida das falácias dele, Tai Lung por outro lado continuou o próprio monólogo.
“Bem, suponho que ele tenha aprendido a lição.” Ele disse pensativamente rindo um pouco “Quer dizer ele me substituiu tão rapidamente, que outros ajustes ele deve ter feito? Ele te mimou mais, te elogiou muito quando você quebrou uma tábua de madeira?”
Dessa vez ela riu para a surpresa dele, infelizmente o sangue voltou a fluir pela garganta dela.
“Você teve o amor dele.” Ela disse amargamente, voltando a encará-lo “Eu só tive sua sombra.”
O olhar de Tai Lung endureceu, um pouco confuso, mas Tigresa aproveitou a brecha para pular em cima dele, recomeçando a luta.
“Tudo o que fiz!” O leopardo gritou, com fúria renovada, a jogando para longe dele novamente “Eu fiz para que ele se orgulhasse!”
Ele andou pela ponte, ouvindo os estalos das madeiras frágeis.
“Ao invés disso ele apenas me trocou.”
Tigresa estava se levantando, mas antes de conseguir se colocar na posição de batalha, ele a segurou pelo pescoço, aproximando as faces.
“O que acha que acontece se eu te matar agora?” Ele sussurrou de forma animalesca “Lágrimas e lamentos? Não, não espere isso.”
Tigresa não estava sufocando, mas não conseguia escapar do aperto, as garras dele estavam firmemente cravadas, um pouco mais de pressão e ele poderia esmagar a garganta dela.
A felino segurou o braço dele, arranhando profundamente, sangue começando a borbulhar, uma pequena vitória, mas ela apenas encarava os olhos dourados e brilhantes, tão semelhantes como os dela.
Tai Lung respirava pesadamente, encarando aquela mulher tola, Tigresa esperou que ele terminasse o que começou dessa vez, ciente que a piedade dele estava se findando.
No entanto, antes que as garras dele a matassem, o olhar ferino suavizou. Uma misericórdia velada.
“Ele vai te trocar, como fez comigo.” um aviso amargurado.
Tai Lung a soltou, assistindo ela cair, convencido que dessa vez ela aceitaria a derrota.
Tigresa quase sentiu o peito se aquecer, ela sentiu uma dor diferente, novamente ela o observou se afastar, Tai Lung, a calamidade, novamente a deixando viver.
A luta com os cinco furiosos serviu para aumentar a adrenalina dele, mas o embate com a tigresa o deixou consternado, frustrado e um pouco confuso, por que ele não conseguia matá-la? E por que ela não conseguia entendê-lo?
Ele se preparou para deixar aqueles pensamentos tolos para trás e seguir a própria jornada, quando ouviu novos estalos, a ponte balançou suavemente.
A irritação o consumiu, Tai Lung bufou, rugindo para extravasar, ela queria tanto morrer?!
Ele se virou para trás apenas para ver ela erguendo as garras, ele definitivamente iria matá-la.
Frustrado e decidido a finalizar a luta definitivamente, Tai Lung se jogou contra ela, usando o corpo para imobilizar a guerreira, porém, assim que ele fez isso, a onda de ataques finalmente cessou, a irritação dele aumentou.
“Está tentando matar nós dois?!” Ele gritou, sua voz fez um eco bastante impressionante e dessa vez ela olhou para ele.
Por um momento, ele viu as pupilas dela dilatarem, como se ela olhasse para ele com compaixão.
Ele não percebeu como ele hesitou, como boa parte dele relaxou, a respiração dos dois ofegantes, naqueles segundos de silêncio, até que ela finalmente falou, com um olhar sereno, mas muito triste.
“Eu…” ela sussurrou, passando os braços em volta dele, o leopardo das neves ainda não reagiu, inconsciente por um momento do perigo que ela representava “Eu… eu sinto muito.”
Tigresa jogou o corpo para trás, o trazendo junto com ela, com uma força impressionante.
Tai Lung rugiu, tentando se soltar, mas foi muito rápido, um ataque sujo e imbecil, em segundos eles estavam em queda livre e não havia nada em que ele pudesse se segurar.
Ele só pode a encarar com ódio, enfurecido por ela ser tão traiçoeira e covarde, ele não conseguiu agarrar as cordas, pelo contrário, os dois estavam em queda livre.
Aquela mulher estúpida.
Ela havia condenado os dois a morte.