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Mandragore | l.s

Chapter 2: all the things she said

Notes:

Quem é vivo sempre aparece, não? Seja para o desgosto ou felicidade dos outros! Desejo de coração que essa espera valha a pena, pois, a partir de agora Mandragore estará sendo atualizada sempre que possível, mas principalmente agora que estou de férias da Universidade. Posto o primeiro capítulo, já escrevendo o segundo e com o terceiro em mente...

Espero que gostem tanto quanto eu amei escrever cada linha!

Tenham uma boa leitura!

Chapter Text

[…]

Os raios solares infestavam através da janela em fita que demarcava as paredes marfim daquele longínquo corredor que havia se tornado familiar para si; levando em consideração que a cada duas semanas, sempre às quintas-feiras, o seu destino após o fim do expediente consistia naquele mesmo local. Não era uma necessidade, mas sim um acordo cercado por uma definitiva seriedade, ou talvez uma promessa com um peso infantil demais para um homem adulto na casa dos trinta continuar mantendo em pé, mas se não ele, quem mais seria capaz de continuar essa prática? Elizabetta precisava dele mais do que nunca, e ele de um jeito um tanto quanto dependente e satisfeito, também carecia dela. Reviver seus hábitos em tentar o mínimo de contato com a mulher era um refúgio mais do que seguro em meio à tanta pressão e responsabilidade em manter uma empresa mastodôntica que carregava o emblema dos Tomlinson.

Seu coração bombeava de acordo com seus passos carregados, os vasos sanguíneos certamente dilatados devido à tamanha efusão, rápidos e embalados em um nervosismo eminente, ao passo em que a caixa torácica se expandia progressivamente por baixo de seu blazer azul-cobalt que, de repente, o tecido parecia acoplado demais contra sua pele. Provavelmente sua respiração já estava dando sinais da ansiedade, pois a enfermeira chefe que comandava o caminho que seguia, vez ou outra, tornava a virar a cabeça ruiva para trás, demonstrando olhadelas de preocupação como se dissesse silenciosamente que ele teria sua atenção caso necessário; não seria a primeira vez, também…

— Já estamos chegando, Senhor Tomlinson. Já peço perdão por fazê-lo andar mais que o costume, sei que deve estar cansado demais, mas essa semana tem sido complicada para todos nós. Há muitos pacientes novos chegando, então fomos obrigados a fazer um remanejamento de outros com quadros dependentes e semidependentes, agora eles estão mais próximos dos alojamentos médicos. – a mulher vomitou as palavras com rapidez, seus olhos cinzas piscando algumas vezes, e em seguida um pequeno sorriso apareceu em seus lábios tingidos por uma tonalidade acerejada, e se esse era seu truque para se mostrar cordial, havia falhado miseravelmente. Louis suspirou descontente e questionou:

— E por qual motivo plausível eu não fui informado dessa mudança?

— Não há com o que se preocupar, Senhor Tomlinson. Todos os móveis, roupas e acessórios de sua mãe também foram levados com ela com todo o cuidado possível por nossa equipe, dou-lhe minha palavra de que ela está muito bem adaptada, e até mais feliz, visando que agora ela tem uma varanda bem arejada para curtir seus momentos de pintura e artesanato. Inclusive, o novo cavalete que foi mandado já se encontra com ela. – Wendy proferiu, seu timbre tentando demonstrar toda a certeza que lhe faltava. Tomlinson estava acostumado com o quarto 202, afinal, há anos era o mesmo desde a entrada de Elizabetta e consequentemente desde a sua volta à cidade natal, mas a culpa não era da pobre enfermeira, ele sabia disso. Visando que medidas foram necessárias, e ela era apenas uma funcionária que seguia as instruções de seus superiores, faria de tudo para não deixar aquele homem arrumar confusão por conta disso.

— Da próxima vez que cogitarem qualquer mudança envolvendo minha mãe, é imprescindível que me avisem com antecedência, detesto ser surpreendido. Estamos entendidos? E não interessa se é um colchão novo ou um quadro em outra parede, qualquer diferença e, ou mudança, devo ser informado. – umedeceu os lábios que só naquele momento notara a secura emergente, seus dizeres o levando ao controle que buscava em seu corpo, dispersando a ansiedade que outrora o consumia.

Ou talvez, fossem as pequenas e bem moldadas espirais douradas, as quais seu tato perpassava com delicadeza, as digitais se embolando em cada mínimo cachinho, como se estivessem tecendo o formato do cabelo. Ele estava absolutamente encantador naquele dia; vivo, macio, e o aroma... Da madeira leitosa do sândalo mesclado ao opoponax, agrupada às notas de fundo delicadamente atalcadas similar à uma maquiagem vintage, junto a baunilha incensada exalava em suas fossas nasais concedendo aquele cheiro de boneca recém desembrulhada, tão doce e suave, mas sobretudo reconfortante, poderia passar a vida inteira embalado por ele, e apenas talvez mais da metade dela até os dias atuais havia sido.

Levantou o pequeno rosto de Marie para que fosse capaz de olhar em seus pequenos olhos conforme continuava a seguir a enfermeira, que apenas silenciou a conversa suspirando em rendição. As íris vítreas amendoadas da boneca estilo francesa eram emolduradas por um belo par de cílios longos, e conforme uma sutil brisa adentrou, foi possível notar uma delicada movimentação em seus olhos articulados, era como se ela tivesse vida e o observasse na mesma intensidade e com o mesmo carinho.

Louis a amava. De uma maneira singular, talvez levemente excêntrica, a afeição carregada por um peso infantil como o de uma criança para com seus brinquedos favoritos.

— Aqui – Wendy tornou a chamar sua atenção. Louis nem reparara o quão próximos estavam ao novo quarto de Elizabetta, tamanha serenidade que o tomara, apenas com o sorver acolhedor da essência da boneca. Marie sempre o acalentou, e naquele dia em especial, seus nervos estavam à flor da pele.

Fazia cerca de um mês que o principal Designer de Brinquedos da Puppets mandara sua carta de desligamento; Finley, estava com a empresa há décadas, já poderia até mesmo ser considerado um patrimônio histórico do empreendimento. Por ironia do destino ou não, hoje também completava-se seis meses que Louis assumira o cargo de Diretor Executivo. O caminho até ali havia sido uma experiência um tanto quanto enervante, a fábrica em si trajava de bons funcionários, ótimos na verdade, mas, mantê-los na linha era um infortúnio sem fim – o desligamento de Finley que o diga! –, porém, o maior problema com toda certeza era a zona que aquele ambiente transparecia, e somente aquilo era o suficiente para drenar suas energias.

Infelizmente, seu tempo de calmaria na França havia sido bruscamente interrompido com a morte de seu genitor, Benjamin Tomlinson. E que surpresa não fora ao ser informado que herdara o cargo, esse que ele tentou fugir de todas as formas possíveis, inclusive abandonando esse império caliginoso por quase dez anos, extinguindo qualquer contato com os Tomlinson mais velhos, que por castigo eram seus pais. Infelizmente partilhava do mesmo sangue que um dia ousou correr pelas veias de Benjamin.

No fim, suas fugas não adiantaram de nada, completamente infrutíferas. Se ao menos tivesse conseguido, se não fosse um homem covarde o bastante… Dizer que estava frustrado era singelo demais para a vastidão de emoções que o atormentavam. A sombra da morte de Benjamin também havia o alcançado, mas não o embalado como desejou por muitos anos, com o temido, mas solene, beijo da morte.

Estava de volta a Guildford, para a sua ruína ou qualquer que fosse o futuro de mais uma geração Tomlinson.

— Benjamin? – o timbre frágil tão conhecido enunciou. A voz ecoando pelas paredes gélidas, feito o canto de um passarinho que quebrara as asas. As orbes hortênsianas também carregadas por si próprio devido a carga genética, o observavam com uma latente expectativa que foi quebrada rapidamente.

— Esse é o Louis, Beth. – Wendy expressou, dando espaço para que o Tomlinson mais novo adentrasse o cômodo. Louis prontamente aproveitou-se dele, caminhando até que ficasse de frente para a senhora franzina de cabelos castanhos mélicos. A marca da idade já acompanhava os fios, o branco se misturava de uma maneira natural, e os dedos magros seguravam um pincel, conforme traçava desenhos contra a tela sobreposta ao cavalete.

— Como você está? – não pôde deixar de perguntar, mesmo que já houvesse decorado as possíveis respostas. Com o tempo, pessoas acometidas pelo mesmo mal que Elizabetta se tornavam previsíveis.

— Bem… Veio para o chá, querido? – a mulher mais velha sorriu, as rugas que emolduravam seu olhar tornando-se mais evidentes. Agora, olhando para o cabelo do homem, ele realmente era Louis, a franja despojada e repicada sempre acompanhada da barba rala em sua face. O homem retorceu os lábios a contragosto, mas, rendeu-se ao sorriso fraco quando vislumbrou um aparador bem organizado contra a parede do seu lado esquerdo, já com o bule e algumas xícaras.

— Claro. – acomodou Marie em seu colo, conforme se sentava na cama ao lado de sua mãe. Não se conteve, esticando o pescoço pôde vislumbrar do desenho que estava sendo delineado.

Na tela, uma garotinha de madeixas escuras repousava seu pequeno corpo contra um Sofá Luis XV, nele estampavam entalhes dourados, a tonalidade contrastando com o bege sobressalente, a figura de fundo que lembrava um papel de parede paisagista também transposto numa tonalidade apagada. A única luz parecia irradiar da criança de bochechas rouge. O vestido branco com babados chiffon contra as mangas e bainha, possuía a companhia de um pequeno laço azul bebe, as meias também claras juntamente aos sapatinhos perfaziam sua imagem de igual forma às duas bonecas francesas que a acompanhavam na pintura, uma com o traje vitoriano completo com direito a chapéu, enquanto a outra, com seu vestidinho azul, permanecia com suas madeixas loiras soltas. A atenção para o feminino e jovial era tanta, que o urso abraçado pela garotinha tornou-se desprezado, quase como se fizesse parte do fundo.

— Gostou? Estou pintando para o Ben… Ah, ele vai amar!

— Ele com certeza vai. – no inferno, talvez. Pensou em completar, mas engoliu suas palavras, assim como havia engolido muitas outras durante sua infância, depois adolescência e agora na vida adulta. Aqui estava ele, mais uma vez ingerindo verdades e soltando mentiras.

— Oh, tenho que fazer um novo para você também! Mas, depois do chá, tudo bem?

Wendy, que até então permanecia em silêncio observando a interação de mãe e filho, colocou-se a trazer o aparador para mais próximo de ambos, os levando a elevar o olhar para ela devido ao barulho que as rodinhas emitiam contra o piso, e se aquela boneca disposta contra o colo de Tomlinson tivesse vida, ela com toda certeza também olharia em conjunto, conectada como parte da família.

— O chá, Senhores. – Murmurou desgostosa, era uma enfermeira formada, mas ali, para aquela família rica, ou o que restou dela, também desempenhava o papel de empregada, servindo ambas as xícaras de um jogo europeu de porcelana que provavelmente valia mais que dois meses de seu salário.

O vapor quente do líquido rosa aqueceu sua mão gelada pela intensa exposição ao ar-condicionado do local, ou fosse pelo nervosismo de acompanhar aquela figura taciturna pelos corredores, de qualquer forma, foi como um alívio momentâneo. Logo Louis já estava pegando a xícara de sua mão e sorvendo o líquido com aprazia. Sua mãe foi a próxima, seguindo a mesma ação com aquele sorriso débil ainda presente no rosto.

— Marie… – ela sussurrou saudosista, a mão livre encaminhando-se até os cachos loiros da boneca e contornando cada pequena espiral que conseguiu alcançar pelos poucos segundos de desatenção de Louis, que absorvia cada aspecto do novo quarto com cautela, verificando o ambiente, parecendo buscar algo que o desconsertasse, antes de agarrar o brinquedo com mais afinco, retirando-o do toque da mulher mais velha, quase como se o mais simples toque fosse a quebrar.

— Não toque nela! – retrucou feito uma criança mimada, mas a destreza autoritária em sua voz ou o modo como seu rosto se retorceu em uma carranca de desagrado, denunciou o quão adulto aquele homem era.

Adulto demais para brincar com bonecas. Mas não velho o suficiente para uma inundação de ressentimentos.

— Eu que lhe dei ela. Eu posso tocar sim. – Elizabetta vociferou, tentando parecer austera o bastante como uma mãe afirmando o obvio ao seu filho, mas agora, a mulher não passava de uma velha senil para ele, que tinha o desprazer de visitar vez ou outra, apenas para que sua mente não entrasse em curto circuito pela falha na rotina planejada, ou ao menos era isso que dizia a si mesmo.

— Você não me deu nada além de desgosto e vergonha, Elizabetta. – As narinas de Louis inflaram, seu olhar hortênsiano, não mais recordava uma flor, aquilo era veneno em seu mais puro estado, o próprio gás da morte, o ácido cianídrico o dominava enquanto retomava os seus dizeres. — Marie não veio de você, e você bem sabe disso, pode não se lembrar totalmente agora, mas eu aguardarei com todo prazer o dia que você recordará. E eu quero estar aqui para ver em seus olhos o seu horror e aversão, e espero que depois disso você seja assombrada tanto quanto eu sou.

Wendy se afastou, a mão no bolso de seu jaleco caso precisasse interferir com o tranquilizante, como já precisou, enquanto se recostava contra a porta, a discussão naquele momento em diante não passava de murmúrios acalorados. Ouvir a conversa de um Tomlinson em Guildford era quase como um crime capital, tamanho poderio que aquela família tinha perante a cidade, uma influência quase como um verdadeiro reinado. Os sussurros mais corajosos arriscavam a chamar de um regime arbitrário, a delegação era tanta que até mesmo cidades mais próximas se prostravam diante deles.

Eles comandavam o condado de Surrey, com seus tentáculos bem assentados, não era para menos a próspera economia….

— Eu sou sua mãe, garoto!

Louis riu, melhor, ele gargalhou amargo enquanto se levantava, ainda com Marie em seu braço, conforme inclinava seu tronco até que seu rosto estivesse próximo o bastante de Elizabetta, os narizes quase se encostando enquanto a fúria azul os encurralavam um contra o outro.

— Você não é! Você nunca nem teve essa capacidade, sempre foi nada mais que o fantasma de uma mãe. Uma mãe ruim e mesquinha, presa demais aos próprios caprichos para sequer notar a devastação imoral que estava inserida e que pagava os seus luxos. Eu te abomino, e sou grato que esse é seu fim, agora não passa de uma velha inútil, que mal consegue limpar o próprio rabo. – rugiu em fúria, seu peitoral se expandia em sua respiração acelerada, o rancor injetado em suas veias parecia latejar até sua massa cinzenta, a cabeça explodindo conforme encarava sua progenitora com ódio mesclado ao nojo.

— Mas pelo visto ela pagou e continua pagando os seus luxos também. – a mulher o mediu de cima a baixo, como se reafirmando seus dizeres em uma ironia mordaz, enquanto atentava-se às roupas de marca e ao relógio Blancpain Le Brassus em ouro rosa e pele de crocodilo em seu pulso, um modelo igual ao de seu marido quando vivo. — Você não se sente sujo por usá-la?

Ela poderia não se lembrar de tudo, mas para ter a audácia de zombar dessa forma, alguma coisa, por mínima que fosse, ainda bruxuleava em sua mente senil, o suficiente para que sua língua de víbora não vacilasse nem por um único segundo ao dirigir as palavras para Louis com tanto escarnio e perversidade.

— Sua velha, maldita! Eu nunca usarei minha fortuna da mesma forma que vocês! Eu posso ser doente, afinal, o fruto não cai muito longe do pé; mas posso afirmar, com certeza, que não sou um terço do que vocês haviam de ser.

A mão que segurava a xícara levantou-se apenas para que arremessasse a porcelana até a parede adjacente à cabeça da mulher, o objeto transitando vertiginosamente, de forma a formar uma rajada de vento contra o cabelo de Elizabetta. O tilintar da cerâmica se destruindo para Louis foi como sentir seu coração se despedaçando e sua cabeça explodindo com ainda mais intensidade. Ele odiava desordem, mas abominava ainda mais saber que fora ele quem a provocara.

Olhou uma última vez para a mulher, ela parecia perdida, como se apenas o seu corpo estivesse ali e sua mente navegasse em um navio muito longe daquele local. Apressou seus passos até a porta, abaixando a cabeça em um pedido de desculpas para Wendy, não era a primeira vez que mãe e filho brigavam na Casa de Repouso. Desde que Louis começara as visitas, poucas foram as vezes em que ele e Elizabetta conversaram civilizadamente ou vivenciaram a hora do chá no enlace da calmaria.

Quando Louis pisava ali, ele parecia trazer uma bagagem esmagadora em seus ombros, e desejava fazer a mulher sentir o mesmo peso, talvez, até mais que a si próprio, como se ela precisasse pagar por algo.

Algo que não tinha valor material.

A saúde mental de seu filho quebrado.
[…]

As gotículas de suor escorriam pelo peitoral desnudo em queda livre, o contato molhado descendo tal qual uma trilha translúcida e gelada por todo o seu tórrido abdômen, ocasionando um choque de temperatura diminuto. Harry fechou os olhos, e se recostou contra o sofá de couro, buscando se acomodar com melhor decência se é que isso era possível, visando seu traseiro nu e o arrastar descuidado contra o tecido. Estava cansado, exausto para ser mais apropriado, seu dia havia sido longo, perdido em meio aos seus portfólios e na falta de resposta das empresas em que havia enviado suas produções.

Nunca havia ficado tanto tempo desempregado, tampouco contava com isso, levando em consideração o quão bem estava se saindo em seu emprego anterior, ponderaria até mesmo dizer que definitivamente estava ascendendo e elevando o seu nome a outro patamar. Havia subido de cargo rapidamente e até mesmo recebido um bônus alguns meses antes de seu desligamento, não conseguia entender onde havia errado, se é que havia cometido algum erro. A única certeza era que, aparentemente, arranjar emprego em Londres estava cada vez mais difícil, de modo que na semana anterior se viu obrigado a enviar seu material para as cidades mais próximas, mesmo que precisasse pegar um trem todos os dias para se deslocar caso obtivesse sucesso em alguma proposta.

Seu namorado ao que parece, notou sua tensão e estava empenhado em fazê-la virar tesão, o dando um prêmio de consolação no dia mais importante da sua vida, como se fosse fazê-lo sentir-se menos medíocre e inapto. Tyler tinha um evento importante daqui à uma hora para ser preciso, e durante esse tempo ele estava mais que dedicado à chupar seu neurônios para fora. A boca escancarada recheada de pau, sorvia cada centímetro da carne dura e molhada tão conhecida por si, os movimentos simultâneos da cabeça loira indo e vindo, buscando engolir completamente o falo conforme a língua se arrastava contra as veias sobressalentes, contornando-as com uma adoração ímpar. Houve uma pausa, os lábios se arrastando com destreza para se desfazer do aperto de suas paredes bucais para que o homem recuperasse o fôlego.

— Você não vai gozar não, Harry? Porra cara, faz quase vinte minutos que eu tô te chupando. Eu me pergunto como vou apresentar meu projeto assim depois… – Tyler pôs-se a reclamar como de costume, o homem era um garanhão para receber, entretanto para dar… O caminho era diferente. Os lábios finos e apessegados, agora inchados pela felação, reluziam com saliva e pré gozo estampados contra a epiderme demasiadamente sensível.

Harry massageou suas têmporas, apartando seu foco do rosto cansado do namorado e o pregando contra o teto de seu loft, que ele mal havia terminado de financiar. Por Deus! Estava definitivamente fodido! Tentando se concentrar no momento, mesmo que sua mente estivesse dispersando-se a sua própria miséria. Styles definitivamente estava se sentindo um fracasso, e ter Tyler falando sobre o projeto da empresa em que era Arquiteto Júnior, só fez essa sensação lastimável crescer em seu peito. E quem melhor para virar o alvo de sua amargura, se não ele?

— Faça direito, e talvez eu goze rápido.

A expressão que tomou a face de Tyler só podia ser denominada como uma coisa: Indignação. O vinco em suas sobrancelhas escuras e o olhar estupefato em seus olhos castanhos apenas confirmavam suas emoções. O loiro nunca foi bom em mascarar seus sentimentos, mas principalmente suas repulsas, ou mais precisamente, o gigantesco ego ferido.

— Mas eu estou fazendo como sempre faço!

— Bom, então talvez esse seja o problema… – sussurrou abafado contra o punho, a vergonha o corroendo, de modo que suas bochechas já estavam queimando. Não era culpa de Tyler que Harry não estava aproveitando o momento, era de sua própria responsabilidade, era um imbecil desqualificado.

O silêncio que se seguiu foi como se afogar em uma imensidão não terrena, o ambiente permaneceu quieto, penumbroso, mas ainda sim, sobrecarregado à sua própria maneira. Totalmente colidindo de frente às suas ações anteriores, visando que era para ele estar caloroso, impróprio, em uma discussão pavorosa como tantas outras vezes. Ao contrário, Tyler o olhava como se ele fosse um rato de laboratório, buscando entender o que estava acontecendo ali, e qual seria seu comportamento respondente condicionado para anotar em sua planilha de testagem.

E Harry, dispõe-se de uma resposta, essa, por sua vez, pegando Tyler de surpresa, o levando a chiar quando as mãos do cacheado alçaram a base de seu crânio, o levando à posição anterior em imposição absoluta. A boca se abrindo em surpresa diante ao choque, antes que fosse preenchida de uma única vez com seu pau duro conforme Harry alavancava o quadril com uma pressa surreal para contato. Ele podia sentir que o loiro estava tendo um momento desconfortável para se ajustar, principalmente com o enlace de seus dedos em seus finos cabelos da nuca e o modo como não concedeu fuga alguma, apenas para calá-lo e saciar um lado punitivista demais de Harry.

Naquele momento, a única alternativa para Tyler seria a de receber seu falo de bom grado e tentar respirar o suficiente para não desmaiar…

O barulho de engasgo, seguido pelo aperto da garganta abusada em seu pau, tranquilizou Harry. Ele zombou de Tyler, fodendo sua cavidade molhada sem piedade alguma, enquanto o homem permanecia indefeso em suas garras, os olhos lacrimejando, absolutamente miserável, sendo judiado pelos movimentos de seu quadril indomado. Harry nem mesmo estava sentado mais, apenas empurrando e socando a boca de Tyler em um ritmo constante e duro, gemendo sem vergonha alguma como se fosse ele quem estivesse sendo fodido implacavelmente.

Tyler colocou suas mãos frias sobre as coxas de Harry, e apertou a carne, como se para buscar um apoio ou mendicar uma possível clemência, que categoricamente não seria concedida. Ao invés disso, Harry focou em seu rosto deplorável. O olhar límpido e vazio, quase vítreo, Tyler estava longe dali, dissociando, a mente provavelmente um borrão, enquanto seu cérebro era fodido ao derretimento. Sua língua ainda tecia movimentos irregulares em seu falo, a boca tentava chupar durante as estocadas impiedosas, como se fossem apenas movimentos reflexos ou até mesmo programados, mas ele…

Permanecia tão distante…
Apenas aceitando de forma irrestrita.

Harry sentiu inveja. Inveja por sua calmaria tentadoramente remota. Inveja pela possível paz diante de uma tempestade surpresa. Mas, principalmente a inveja pelo vazio que inundava sua cabeça, um oco, essa era palavra certa, poderia compará-lo até mesmo a um objeto inanimado, uma luva de masturbação, sem apreensões, livre de pensamentos. Retirando a mão direita do ato de contenção, visto que não era mais tão necessária, quanto em primeiro momento, Styles se viu de forma natural a levando até seu pescoço, num ímpeto impensado para se auto asfixiar.

Os dígitos prontamente paralisaram brevemente suas vias respiratórias, o indicador e o polegar resolutos contra suas artérias, aos poucos diminuindo o próprio fluxo sanguíneo e a entrada de oxigênio. A palma pesada e impulsionada contra sua garganta trouxe um peso consistente ao seu canal interno, como se ele também estivesse sendo sufocado por um pau corpulento o bastante para atingi-lo com furor, o impossibilitando do ato mais importante e natural para viver. Respirar. Sua boca se encheu d'água com o pensamento, Harry lambeu os próprios lábios, arfando sôfrego e desejoso, enquanto continuava suas investidas brutas com ainda mais cobiça, ouvindo de fundo gemidos perdidos do namorado e o barulho molhado e absolutamente tentador de suas investidas desorganizadas.

O repuxar em seus testículos veio como uma surpresa, e quando percebeu, estava gozando, o pau pulsando descontroladamente, inflando contra a cavidade apertada que tentava se ajustar sem sucesso algum, apenas comprimindo de maneira tortuosa. Prontamente se desfez de sua asfixia, mas não sem antes fazer Tyler aceitar cada mínima gota, para então liberá-lo. O mais novo estava mole, seus ossos derretidos em o que só poderia ser desistência no sentido mais literal da palavra. Ele se recostou contra a mesa de centro atrás de suas costas, ainda permanecendo de joelhos, o olhar perdido como se privado da visão, cego, o peito cansado enquanto clamava por ar fresco, vermelho como nunca antes. Nem mesmo quando era fodido o homem ficava daquela maneira, era como se Harry houvesse apagado qualquer resquício do que um dia foi aquele homem forte e que se gabava por não ser uma putinha entre quatro paredes.

Engoliu o gosto amargo em seu palato, o bolo resvalando face a face à ardência que consumia sua tranqueia diante à asfixia amadora, totalmente mal feita.

— Vai, levanta. Você não tem que se aprontar? Gozei já. – aludiu Harry, sem nem mesmo pensar antes de mergulhar o tronco e desferir tapinhas de encontro a bochecha corada de Tyler para acordá-lo de seja lá o que fosse aquilo. O loiro piscou lentamente, como se para verificar seu sentido visual, saliva vazando pelos cantos rachados de sua boca, emitiu uma tosse áspera logo após.

— Harry… – murmurou quebrado dado que suas cordas vocais pareciam configuradas de forma embaraçada. Styles o fitou atentamente, esperando o que poderia vir após o ressoar de seu nome, apenas para ouvir um pedido. — Você vai me acompanhar?

Tyler parecia nervoso, incomodado por fazer uma solicitação banal como aquela, suas orbes castanhas cravadas na parede branca atrás da cabeça de Harry buscavam fugir do contato visual. O mais velho quis dizer não, até mesmo sentiu a negação dançar na ponta de sua língua. Ver seu namorado ser paparicado no ramo que escolhera, enquanto permanecia à míngua no seu, desesperado por alguma resposta, parecia ser uma especie de tortura psicológica. O chamem de egoísta, mas não concordava com o cenário atual, porém, ainda assim se viu aceitando com um leve aceno de cabeça, seus lábios cheios permaneceram em uma linha reta desgostosa ao passo em que o fantasma de um sorriso sem dentes desenhou-se.

Em vez de agradecer, como um lado de Harry almejava, o loiro apenas levou o olhar até suas mãos que mesmo após o ato sexual, permaneciam no estofado suado, o lilás estampava suas unhas curtas com delicadeza, trazendo maior atenção para a palma magra. O cacheado havia pintado na noite anterior, querendo trazer um pouco de vivacidade para si, e buscando distrair seus pensamentos ruminantes, um ato que por hora pareceu eficaz, mas no amanhã, não passava de um enfeite em um corpo descontente.

—  Vê se limpa essas unhas, então… –  Ele não completou, mas Harry sabia o que poderia sair daquela boca e do íntimo do outro. Com a garganta seca, Tyler se levantou, encaminhando-se até a cozinha. Ao fundo Harry ouviu o barulho do armário sendo aberto e depois da geladeira, em seguida Tyler pareceu buscar algo no pequeno porta trecos emoldurado perto da porta, e logo os passos voltaram até a sala.

— A princípio, chegou isso para você hoje de manhã. Saí para comprar nosso café e verifiquei a caixa de correspondências e tinha essa carta lá endereçada à você…

Era do feitio de Tyler isso acontecer, o jovem era esquecido, principalmente quando se tratava de coisas relacionadas a outros que não ele próprio. Harry, já de pé, tomou o papel das mãos do namorado com rapidez, sua cabeça formigando enquanto observava o selo que guardava o conteúdo da carta.

O rosto de uma marionete de aparência andrógina trajada com o que parecia a gola de uma roupa de bobo da corte, visando a forma, a coloração e geometria espalhafatosa que se estendia pela vestimenta. Em sua face, mais precisamente em sua estrutura bucal, uma bola de chiclete no tom mais vívido do rosa, o fuchsia, marcava sua presença de forma chamativa conforme os escritos ‘’Puppets & Bubblegum Toys’’ eram predispostos.

Harry sentiu a sombra de um sorriso verdadeiro em semanas irradiar em seus lábios, não resistindo a mordiscá-los em um ato nervoso, à medida que se apercebia daquela sensação tão conhecida em seu estômago, tal qual uma cobra sorrateira se enrolando em suas entranhas após um bote de sucesso. Mas ainda sim em alerta, pronta para o próximo, enquanto ele abria o envelope para ser recepcionado com a concretude de uma nova jornada o aguardando:

‘’ Guildford. Surrey. Inglaterra ‘’
28/05/2010

CARTA PROPOSTA

Prezado, Harry Edward Styles,

Temos o prazer de lhe oferecer o cargo de Designer de Brinquedos na Puppets & Bubblegum Toys. Após analisar cuidadosamente seu currículo e portfólio artístico, acreditamos que você possui as habilidades, a experiência e as qualificações necessárias para ter sucesso nessa função!
Estamos entusiasmados para inaugurarmos um relacionamento longo e mutuamente rentável, contribuindo para nosso crescimento conjunto com muito aprendizado e parceria.

Sua data de início, na experiência, será 07/06/2010 e você se reportará a Louis William Tomlinson, CEO, para um teste livre de proficiência para a criação de nosso mais novo projeto.
Os detalhes da descrição do cargo e do seu pacote de remuneração e benefícios, são os seguintes:
O futuro profissional conceberá projetos de design de produto, pesquisando temáticas, elaborando e avaliando ideias ou conceitos a serem propostos e adotados.
Salário base: £ 10.836
Potencial de bônus (ou comissões): Efetivo após 90 dias de experiência e baseado nas metas e objetivos que serão acordados no plano de desempenho desenvolvidos. Se você for elegível, o plano para bônus deste ano e do próximo será baseado na fórmula determinada pela empresa.
Benefícios: Plano de Saúde, Plano Odontológico, Despesas com Alimentação.
Indenização: Se o empregado sair da Empresa por razões que não a justa causa (violência, roubo, fraude, assédio, etc) a Empresa pagará seis meses de salário e convênio médico. O pagamento será feito de uma única vez, ou parcelado (determine em condições do pacote de demissão)
Acordo de Não Concorrência: É imprescindível que nosso acordo de Não-Concorrência seja assinado antes da efetivação.

Como funcionário, espera-se que você cumpra nossas políticas e procedimentos, incluindo nosso código de conduta, além de quaisquer leis e regulamentos aplicáveis. Você também deverá assinar um acordo de confidencialidade. Indique sua aceitação desta oferta assinando e devolvendo uma cópia desta carta até 03/06/2010. Se você tiver alguma dúvida ou preocupação sobre a oferta (ou cargo), não hesite em nos contatar.
Temos o prazer de recebê-lo em nossa equipe e esperamos suas contribuições para o sucesso da Puppets & Bubblegum Toys.
Sinceramente,
Bleta Rexha
Gerente de Recursos Humanos.

Tyler o encarava em expectativa, o rosto agora em sua tonalidade pálida natural, destoando-se do peitoral carmesim e molhado em uma mistura lasciva de saliva e gozo. Harry piscou algumas vezes, o movimento frenético de suas pálpebras buscando ler o conteúdo mais uma vez para confirmar que não era uma pegadinha de mau gosto. Revirou o envelope rasgado, buscando o endereço da empresa, o telefone de contato, caixa postal e e-mail, mas tudo parecia crível demais, nem mesmo uma única linha se destoava da seriedade da proposta trabalhista em suas mãos.

A empresa em questão, além de levar o sobrenome de uma das famílias mais influentes no Reino Unido, exteriorizava um verdadeiro império, que não estava definido apenas nos lucros de margem bilionária, mas na imagem que carregava. A fantasia de uma realeza hodierna. Uma indústria construída como um verdadeiro Castelo Medieval, mastodôntica e imodesta, que virou tema de debates intermináveis em sua época de universitário, desde o conceito de vender não apenas uma ideia, mas uma concepção de fina grandeza, ao ‘’até que ponto o capricho de um marketing pode vir a ser um devaneio absurdo?’’. Finley, um de seus professores, trabalhava para o império, e era braço direito de Benjamin Tomlinson há décadas. Trazendo o seu dia a dia para as aulas, deslumbrava os alunos e os tornavam focados e inspirados como verdadeiros viciados.

Nem mesmo em seus delírios mais loucos, e ele delirava excessivamente, pensou um dia em receber uma Carta Proposta da Puppets. Sim, ele havia enviado seus dados, mas era meramente um tiro no escuro mediado perante uma expectativa provavelmente fadada ao fracasso, pensou que dependendo da sorte ficaria registrado no banco de dados e somente isso já seria um feito e tanto para alguém com a trajetória em prelúdio, mesmo que trajado de talento.

Mas ter a carta em suas mãos, e principalmente o pacote de remuneração, seis vezes mais que o salário-mínimo e três vezes mais que seu emprego anterior, tornava tudo surreal e tentador na mesma medida, sobretudo, ter plena convicção que aquela vaga estava à apenas uma carta resposta de sua efetivação, fez sua cabeça girar em êxtase como se cheirasse uma carreira de cocaína, Deus, poderia até mesmo sentir a sensação fantasma em suas narinas.

Ele seria o mais novo Designer de Brinquedos da Puppets & Bubblegum Toys com orgulho.

Não. Melhor que isso.

Com adoração…

[…]

O crepitar advindo da lareira em pleno funcionamento traçava moldes disformes defronte ao rosto concentrado de Tomlinson, a chama alaranjada o instigava à um mergulho perigoso em seus próprios pensamentos instáveis, a tortura em sua mente e o incômodo habitual após a visita na Casa de Repouso zombavam de sua modesta melhora, como se o convidasse de forma categórica até a estaca zero mais uma vez. Estava estritamente imerso, de modo que mal notara quando Margot entrou em seu campo de visão, limpando as mãos rechonchudas em seu avental sujo após mais um preparo na cozinha. Ela pigarreou, acostumada com o modo de funcionamento de seu novo patrão, afinal, haviam se passado meses de convívio, e Benjamin não costumava ser diferente quando perdido em seus próprios pensamentos.

— Senhor Tomlinson, o jantar está pronto. O cardápio de hoje consiste em Linguine allo Scoglio, espero que esteja ao seu gosto… – Margot declarou receosa, por melhor Chef de Cozinha que fosse, o nervosismo ainda perambulava em seu consciente, sempre levantou da cama buscando o seu melhor, e esperava ansiosamente que o seu melhor fosse do agrado de Louis, ela devia tanto à ele… Em apenas um semestre o homem havia se mostrado um coração bondoso como jamais Benjamin e Elizabetta o fizeram, mesmo que trabalhasse naquela casa há vinte anos.

— Obrigado, Margot. – murmurou simples, o agradecimento saindo como um sopro diante à atmosfera do ambiente, direcionando sua mão direita até o copo meio vazio de Whisky que descansava sobre a pequena mesa ao lado da poltrona, onde permanecera desde sua chegada na residência, prontamente bebericando o líquido que se encaminhou trajado de uma ardência em sua garganta.

— Senhor, antes de ir…

— Diga. – respondeu, o copo ainda predisposto a seus lábios molhados, conforme as orbes azuis permaneciam cravadas ao rosto de Margot.

— Amanhã é a última sessão de quimioterapia de Glenda. Vou precisar me ausentar mais cedo que o horário de costume, logo após o almoço, não se preocupe com a janta, deixarei pronta para que possa aquecê-la no horário de costume... – o sorriso que iluminou o rosto cansado da mulher levou o homem a sorrir singelo em conjunto. Margot era uma boa mãe, atenta e cuidadosa à sua filha. — Sabe, nada disso seria possível sem você, Senhor Tomlinson, mesmo quando meu plano de saúde negou auxílio à minha filha, você não pensou duas vezes antes de pagar o particular por fora. Eu sou extremamente grata a você, e sei que nem mesmo cem anos nesta casa, de forma alguma seria o suficiente para presenteá-lo da forma que o Senhor me presenteou.

Louis ouviu atentamente a mulher a sua frente, as chamas atrás de sua silhueta ainda se moviam de modo hipnotizante, contudo, não eram mais o foco do seu olhar, tampouco sua mente o agonizava como a minutos atrás. Ele era um bom homem, apesar de suas rachaduras, imperfeições e desvarios. E o mais importante, sua fortuna tinha um bom destino, independente de onde nascera e ramificou-se, seus braços se estenderiam aos menos abastados, sempre que possível.

— Você não precisa me agradecer todas as vezes que precisar dar atenção à sua filha em recuperação, Margot. Pensei que houvesse sido claro da última vez. Todavia, fico feliz em saber que vocês estão vencendo esse desafio na companhia uma da outra.

Margot acenou em concordância muda, não se envergonhando em fazer uma reverência ao homem à sua frente, para então buscar o papel amassado no bolso de sua calça antes que o esquecesse. Um desenho de Glenda para Louis. Um singelo agradecimento que apenas uma garotinha meiga em seus oito anos poderia conceber ao homem em resposta à toda atenção e doação de sua parte.

No pequeno pedaço de papel havia uma figura masculina levantando uma menininha ao ar, o que parecia ser uma figuração de Louis e sua, ambos pareciam radiantes e um sol intensamente pintado em amarelo reluzia ao horizonte, como uma espécie de holofote contra ambos. Existia carinho ali, uma sensibilidade infantil e agradecida, mesmo que nunca houvesse visto pessoalmente o patrão de sua mãe, Glenda o amava. Margot estendeu a folha até Louis, e ele prontamente a aceitou, analisando o desenho com todo cuidado possível, como se fosse frágil e pudesse escapulir para se esconder de seu tato.

— Ela quer o conhecer… Eu tentei dizer a ela que o Senhor é um homem muito ocupado, mas ela insiste todos os dias…

— Margot, eu não permito que ela pise nessa casa. – Louis sentiu um calafrio em sua espinha, como se suas vértebras fossem feitas de estalactites, o convidando à encarar um intenso inverno congelante e sem remorso, que o envolveria até sufocá-lo. O copo tremelicou em suas mãos, o líquido mélico formando pequenas ondas diante do movimento. Volveu suas orbes hortensianas com pavor estampado sobre elas de um lado para o outro, antes de pegar uma das mãos de Margot, com seu punho livre, em absoluta consternação, para então completar sua fala, o desespero presente em cada mínimo entoar:

— Nunca! Prometa para mim que você nunca irá trazê-la até aqui, nem mesmo tentando montar uma surpresa inocente para mim. Prometa agora!

Louis não era um homem que clamava, mas ali se viu suplicando, gritando em um pedido desesperado. Margot, por mais que carregava a mágoa em seu peito, se viu acenando brevemente antes de mostrar sua aceitação de maneira vocal, mesmo que não compreendesse o motivo.

— Eu prometo.

Eventualmente, o homem foi envolvido por sua própria solidão mais uma vez. Buscando o celular em seu bolso, pôde visualizar Margot deixando a mansão a partir de uma das muitas câmeras instaladas no local. Nos primeiros meses de sua volta, a empregada costumava dormir nas acomodações ao fundo, porém, quando Louis soube o que estava acontecendo na vida da mulher, imediatamente mudou sua dinâmica trabalhista. Agora, era só ele e os fantasmas do passado, sozinhos, cedendo à companhia amarga que somente traumas incuráveis poderiam conceber.

Como de praxe após a sua rotina de quinta-feira, puxou a pequena caixa de madeira que jazia debaixo da poltrona, escondida por um lenço verde musgo de seda quase da mesma tonalidade da poltrona, com exceção de seu material. Rapidamente seus dedos tatearam ao fundo, fisgando a primeira fita VHS predisposta. O T de seu sobrenome, escrito perante sua parte frontal, seguida de um número, foi rapidamente cortado em dois quando quebrou o material de armazenamento analógico, envolto à aversão e agilidade. Seus dedos tremiam e mesmo que demonstrassem essa fraqueza, seu punho tornava a mostrar sua força puxando os fios e arrebentando ainda mais o material, antes de jogá-lo a lareira. O processo se repetiu uma segunda vez com ainda mais determinação, uma terceira, totalmente objetivo e cortante, uma quarta sendo embalado por sua visão turva, e por fim, uma quinta, finalizando sua compulsão pela destruição merecida.

Ele permaneceu impassível, firme como uma rocha, embora as suas conexões cerebrais trouxessem o pior e o melhor de si a cada segundo de atenção, observando o fogo consumir qualquer resquício daqueles registros, que não ousaria ver nem em seus piores pesadelos. Não se importava de virar a noite ali, apenas observando o fogo corroer as fitas até que elas virassem pó, na verdade.

Ele preferia permanecer acordado ao ponto de seus olhos lacrimejarem diante da luminescência e cansaço à perder aquela consumação em seu trajeto completo, se perdesse a fogueira dos registros, algo não estaria certo, seria inadequado e condenável.

Não estaria completo e sim impreciso, fracassado, morto?

Ou talvez, caso se permitisse fechar os olhos, tudo não passaria de uma mentira, e terminaria com o mesmo destino de sua progenitora? Esquecido em um lar de idosos de grande poder aquisitivo, com um quebra cabeças que não saberia encaixar as peças.

Precisava continuar acordado até o último estalar fulminante, ou traçaria seu destino com condenação alicerçada em seus pulsos.

Apenas.

[…]