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Estou no escritório. Não lembro nada de antes disso. Tudo que eu consigo pensar é no tédio irremediável e no calor da sala sem ar-condicionado.
Eu tinha recebido o quê? Uma visita hoje, duas? Todos meus sentimentos divagam. Quando olho para a janela, para as cadeiras, paredes, chão, mesa. Tudo me dá sono e angústia. E então a campainha toca. Cliente? Percebo o cigarro grudado em minha mão e apago-o no cinzeiro.
Quando levanto, tudo começa. Tenho um físico alto e adulto, mas de repente, uma quentura anormal me ambalsa. Estou diluindo num vapor escaldante conquanto perco o folego dos meus pulmões, quase como se minha expiração tivesse causado os vapores incongruentes. Tudo em mim vai ficando difuso, sinto-me despencar ladeira abaixo sem sair do mesmo lugar. Meus órgão apertão-se de forma confortável e entro em extrema confusão. Sou um elevador humano, tudo ao derredor são andares, e andares.
Quando dou por mim, estou menor que tudo cujo me cerca.
Tento gritar e ouço a campainha bem mais alta que minha voz, novamente, ela toma toda minha atencão. Como o terno não encolheu um centímetro se quer, terei de puxar a calça que continua grande demais para o meu pequeno e estranho corpinho diminuto. Assim, também terei de ir puxando as mangas enormes depois de pular para fora dos sapatos grandes e bizarros.
O cômodo pertence aos gigantes agora, e tudo é novo. Vou arrastando o tecido mais duas, três, cinco vezes. Quando chego à porta hesito. Tenho que puxar novamente a manga, ajeitar os cabelos, limpar a boca da nicotína visível, e então a abro.
Todas as lembranças dos anos voltam para minha cabeça. Tudo que aconteceu no escritório nos anos seguintes, o que houve nos horários de almoço, nas horas extras...Tudo volta e a figura na minha frente é tão clara quanto o batimento frenético pulsante em meu peito. Estamos cara a cara, nos olhando no mesmo ângulo de altura. Ele se desapega da fresta da porta e pergunta algo para mim.
-Mob?- esclamo, ainda sem entender o que está acontecendo.
Minha garganta queima. O cabelo do meu futuro aluno está escuro, a pele é a mesma, os olhos, os gestos, a voz, o timbre tímido aconchegado soa exatamente igual.Perfeitamente tatuado nas lembranças. Mas ele não responde. A traquéia queima fazendo com que não consiga ingerir minha própria saliva.
-Mob? É Você?
E então a figura dele cresce, ele vai ficando maior que eu, mais bonito, acomodado, tomando mais espaço na porta. O medo e confusão se intalam dentro de mim e não consigo me mexer. Como se eu estivesse sendo absorvido por ele cada vez que ele cresce mais um pouco.
Para mim, ele fica cada vez mais bonito, atraente, e sou puxado para perto dele como um imã. Luto para manter-me igual. Parado.
Então, com várias lembranças do Shige passando na minha cabeça, Mob cai em cima de mim enquanto sua última pergunta emerge.
"Eu queria muito ir na sua casa"